Nem todo o contribuinte que deve tributos ao município o faz por dolo ou má-fé. Não são poucos os casos em que dúvidas quanto à interpretação e à aplicação da legislação tributária acabam gerando certas inconformidades nas declarações realizadas pelos contribuintes e, como consequência, o recolhimento a menor do imposto devido.
Por isso, a Receita Municipal de Porto Alegre promove, no âmbito do Imposto Sobre Serviços (ISS), um processo que possibilita aos contribuintes a autorregularização de débitos tributários. Trata-se de um mecanismo em que contribuintes são convidados a prestar esclarecimentos referentes a possíveis inconsistências identificadas pela fiscalização.
Nessa entrevista, o vice-presidente da Associação dos Auditores-Fiscais da Receita Municipal de Porto Alegre (AIAMU), Giulio Braga, explica o que é o processo de autorregularização tributária e quais são as suas vantagens para os contribuintes.
Qual o objetivo por trás desse processo?
A principal finalidade é proporcionar um ambiente favorável à conformidade fiscal e à regularização de passivos fiscais dentro de um contexto transparente e legal, através de uma fiscalização mais orientadora e menos punitiva. Em outras palavras, é a busca por uma maneira menos litigiosa de regularizar situações em que o contribuinte tenha cometido equívocos na apuração, na declaração ou no pagamento de tributos.
Qual a importância para os contribuintes?
Enquanto os contribuintes regularizam débitos sem a imposição de multas, preservam sua reputação e evitam litígios, também veem o incremento da arrecadação tributária ocorrer com uma menor necessidade de ações coercitivas, além do fortalecimento da credibilidade do sistema tributário e do direcionamento do foco para casos de maior relevância.
Quem não poderá ser beneficiado?
É importante salientar que a autorregularização não é aplicável em casos de fraude, sonegação fiscal ou outras condutas ilícitas intencionais. Nessas situações, a administração tributária poderá adotar medidas mais severas, como a instauração de uma fiscalização aprofundada, chamada de revisão fiscal, da qual decorre a imposição de penalidades. Portanto, a autorregularização é instrumento adequado para aquelas situações em que os erros são de boa-fé e não envolvem a intenção de sonegar tributo. Também não poderão realizar a autorregularização aqueles contribuintes que já estiverem passando pelo processo de revisão fiscal, que normalmente ocorre após uma oportunidade de regularização espontânea já ter sido oferecida.
Como funciona o trabalho dos auditores-fiscais nesses casos?
O papel do auditor-fiscal responsável pelo atendimento é fundamental, já que a comunicação com o contribuinte precisa ocorrer de forma clara, transparente e muito bem explicada. Além disso, o conhecimento do profissional permitirá, através de uma correta avaliação sobre o caso concreto, a concessão de prazos adequados a cada situação verificada. Isso porque um dos princípios basilares desse tipo de atendimento é facilitar ao máximo o trabalho daquele contribuinte que estiver disposto a resolver eventuais inconsistências junto à fiscalização. Outro trabalho importantíssimo do auditor-fiscal é aquele que ocorre bem antes do atendimento, quando diversas informações são cruzadas e as inconsistências que dão origem à seleção de contribuintes são identificadas.
Quais os benefícios de uma fiscalização tributária orientadora?
Ela desempenha um papel fundamental no aumento da arrecadação espontânea, ou seja, naquela proveniente de contribuintes que voluntariamente cumprem suas obrigações fiscais. Envolvendo atividades de monitoramento, auditoria e inspeção de informações, busca garantir a conformidade com as leis fiscais, identificar possíveis irregularidades e servir como instrumento de desincentivo à sonegação.
Como esse processo de autorregularização fortalece a justiça fiscal?
A autorregularização contribui para a redução da evasão fiscal, fortalecendo a justiça fiscal ao assegurar que todos os contribuintes estejam seguindo as mesmas regras, o que diminui a pressão sobre os contribuintes que cumprem corretamente suas obrigações tributárias. Dessa forma, temos um aumento da confiabilidade do sistema tributário, já que uma fiscalização eficaz cria um ambiente onde os contribuintes têm segurança de que aqueles que não cumprem suas obrigações serão identificados e responsabilizados, o que por sua vez incentiva o cumprimento voluntário das obrigações fiscais.
Quais as etapas do processo de autorregularização?
Primeiramente, uma equipe especializada trabalha no cruzamento e na análise das bases de dados, identificando possíveis inconsistências. Após, um conjunto de contribuintes é selecionado para prestar esclarecimentos.
A seguir, é realizado o atendimento personalizado de cada contribuinte, recebendo e prestando todos os devidos esclarecimentos, inclusive orientações relacionadas a dúvidas que possam ter induzido o contribuinte ao erro.
Então, o contribuinte, ao revisar suas informações fiscais e contábeis, poderá identificar a existência de erros ou omissões que resultaram em cálculos incorretos de tributos a serem pagos ou em declarações inadequadas, e apresentar uma declaração retificadora ou realizar uma comunicação formal às autoridades fiscais, demonstrando que foram corrigidas as inconsistências identificadas e que há interesse pela conformidade fiscal.
Por fim, é realizado o pagamento ou parcelamento do tributo devido, e o auditor responsável analisará os documentos apresentados pelo contribuinte, verificando se os ajustes realizados estão corretos e se a regularização foi feita de acordo com a legislação vigente. Caso tudo esteja em conformidade, a regularização é confirmada e o atendimento é concluído.
Qual o principal ganho para a cidade com esse processo?
Quando os contribuintes cumprem suas obrigações fiscais, a arrecadação espontânea evita a necessidade de aumentar alíquotas ou criar novos impostos, reduzindo assim a carga tributária sobre aqueles que estão cumprindo corretamente seus compromissos. Assim como um condomínio com baixa inadimplência proporcionará melhores entregas aos seus moradores, uma arrecadação tributária com mais contribuintes pagando em dia os seus tributos permitirá que o governo invista em serviços públicos de melhor qualidade, como saúde, educação, transporte e infraestrutura.