O enriquecimento dos supermercados em contraste com condições de trabalho precárias de parte dos trabalhadores da produção de alimentos é uma das conclusões do relatório A Hora de Mudar. Desenvolvida pela Oxfam, organização dedicada à ajuda humanitária presente em 84 países, , a pesquisa foi apresentada no dia 16 de outubro, data mundial da alimentação, por Gustavo Ferroni, assessor sênior de políticas e incidência da Oxfam. Confira entrevista:
Onde há organização coletiva, venda direta dos agricultores e mecanismos para a garantia de preço e salário mínimo, os agricultores e pequenos produtores ficam com fatia maior do preço final.
Quanto do que o consumidor paga chega ao produtor?
Nos últimos 20 anos, os grandes supermercados europeus e americanos aumentaram muito a fatia do preço final que fica com eles. Nos 12 produtos que estudamos (laranja, café, banana, vagem, uva etc.), eles ficam com a maior parcela, cerca de 34%. Analisamos empresas de alimentos e bebidas, traders, processadores, pequenos produtores e fabricantes de insumos. Enquanto o lucro do setor de sementes e insumos está estável, entre os produtores e pequenos produtores, a fatia diminuiu.
O que causou essa situação?
Há concentração de poder na ponta, onde poucos varejistas ditam as condições de fornecimento, desde questões de qualidade, tempo, forma de contratação e preço, é claro. Os supermercados tendem a priorizar grandes produtores, que passam a dominar o fornecimento e excluem agricultores familiares, pequenos e médios. Isso gerou um grande impacto de exclusão.
Por que há produtores de alimentos passando fome?
Pobreza extrema e fome sempre estiveram ligadas à produção de alimentos. Isso porque agricultores estão em posições vulneráveis, desde intempéries climáticas até condição de fornecimento e relações comerciais desiguais com distribuidores. A falta de organização também coloca os pequenos em condição mais vulnerável economicamente. Onde há organização coletiva, venda direta e mecanismos para a garantia de preço e salário mínimo, os agricultores e pequenos produtores ficam com fatia maior do preço final e têm melhores condições de vida. No Brasil, passamos por um processo de redução da pobreza rural e da insegurança alimentar. Mas, com o congelamento de recursos para políticas de desenvolvimento, deve voltar à vulnerabilidade.
Como equilibrar forças?
Uma das recomendações é que esses grandes supermercados publiquem estudos sobre suas cadeias de fornecimento e sobre a situação dos trabalhadores, pequenos agricultores e principalmente das mulheres. Essas empresas também devem se comprometer com as condições de fornecimento e com a ampliação de garantias de preço e remuneração mínimos para esses agricultores, além da compra diretamente deles.
Produção: Letícia Paludo