Com caderno de campo e caneta em mãos, o produtor Blásio Auri Etges anota cada detalhe da produção de hortaliças em 10 estufas, no interior de Santa Cruz do Sul, no Vale do Rio Pardo. Há pouco mais de um ano, o agricultor passou a registrar os procedimentos do cultivo, com cuidados específicos do preparo da terra até a colheita. Em um mês, a propriedade deverá concluir o processo para fornecer folhosas com rastreabilidade a uma grande rede de supermercados.
– Dá trabalho, cada cultura tem o seu caderno de campo, tudo é numerado. Mas estamos apostando que esse será o futuro do mercado – diz Etges, que trabalha na propriedade ao lado da mulher Rojani Maria, e dos filhos Anderson, Vivian e Marcos.
Em 2015, o agricultor participou de treinamento do Sebrae voltada a boas práticas agrícolas, quando foi incentivado a investir na rastreabilidade. Na época, técnicos da rede Walmart passaram a fazer o acompanhamento técnico da produção. A propriedade fornece produtos diariamente a restaurantes e supermercados da região, além de participar de chamadas públicas para compras de merenda escolar. Agora, com a rastreabilidade a caminho, Etges terá como garantir a qualidade das folhosas e dos tomates produzidos pela família:
– Controlamos a quantidade de agroquímicos e os resíduos nos produtos. E queremos que essa informação chegue ao consumidor, a generalização não é justa.
Conhecer a origem dos produtos é uma exigência crescente entre os consumidores, confirma Antônio Cesa Longo, presidente da Associação Gaúcha de Supermercados (Agas). Em pouco mais de um ano, a entidade planeja ter boa parte de frutas, verduras e legumes rastreados nos grandes e médios supermercados do Estado.
– Estamos fazendo um trabalho grande para isso. Os hortigranjeiros certificados serão segregados do restante da produção – adianta o presidente da Agas.
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Embora o processo envolva custos, o dirigente afirma que a intenção é de que não represente aumento de preço. A iniciativa integra o programa de Rastreabilidade e Monitoramento de Alimentos (Rama), uma parceria entre o Ministério da Agricultura e a Associação Brasileira de Supermercados (Abras). O projeto-
piloto envolveu mais de 30 redes de supermercados em Santa Catarina e agora será implantado no Rio Grande do Sul e no Paraná.
– A ideia é reunir as informações em um site, e a médio prazo QR Code com imagens da propriedade – detalha Longo.
Treinamentos no campo
Em dois anos, 270 produtores gaúchos de frutas, legumes e verduras serão treinados em programa voltado a fornecedores de redes de supermercados. O treinamento envolve boas práticas, monitoramento, gestão e segurança alimentar. Iniciado no começo do ano, o projeto será desenvolvido nas principais regiões produtoras de hortigranjeiros: Metropolitana, Litoral, Serra e vales do Caí, Sinos, Rio Pardo e Taquari.
– A adesão é voluntária e a ideia é preparar a propriedade para implantar a rastreabilidade, ganhando tempo nesse processo – explica André Bordignon, coordenador estadual de Horticultura do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas no Rio Grande do Sul (Sebrae), que desenvolve o projeto em parceria com a Federação da Agricultura do Estado (Farsul) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar-RS), dentro do Juntos Para Competir.
A implantação do programa nos hortigranjeiros no Estado, ainda incipiente, vai exigir organização maior das propriedades.
– Esse processo requer mudança de comportamento. Muitos produtores não estão acostumados a anotar todos os procedimentos feitos na lavoura – diz Derli Paulo Bonine, assistente técnico regional da Emater.
O rastreamento da produção é também uma forma de os supermercados dividirem a responsabilidade da segurança alimentar com os agricultores. Hoje, há alguns produtos com selos de procedência, onde é possível verificar apenas a origem dos alimentos - mas não necessariamente os procedimentos adotados na produção.
– Cuidados com solo, água e uso de agroquímicos serão peneiras para acessar mercados – projeta Bonine, prevendo também melhor remuneração a produtos que atendam a essas normas.
Rastreabilidade nas gôndolas
– O processo permitirá que os consumidores consultem informações de frutas, verduras e legumes antes da compra.
– Por meio de um código de barras, site ou QR Code, será possível conhecer a origem e os procedimentos da produção, desde a quantidade de químicos colocados nos produtos até a data da colheita.
– A longo prazo, os supermercados projetam um QR Code com imagens da propriedade onde os alimentos foram produzidos, aproximando o consumidor da produção.
– Para certificar as propriedades, técnicos de redes de supermercados ou de empresas contratadas fazem o controle e monitoramento da produção.