Foram mais ou menos 60 minutos de conversa por telefone, mas a sensação era de estar trocando horas de ideias com uma antiga conhecida. Afinal, já se vão quase 30 anos acompanhando as transformações de Taís Araujo na dramaturgia e na vida.
Da modelo adolescente que virou protagonista de novela à ativista pelos direitos das mulheres negras, a carioca transparece a importância de cada passo em sua evolução pessoal, carinhosamente costurada às artes. Seria mesmo impossível tentar separar suas tantas versões.
Nascida Taís Bianca Gama de Araujo, além de filha, irmã, mãe, esposa e amiga, é atriz, produtora, empresária e também jornalista, cujo exercício assume apenas quando surge vontade e uma boa oportunidade. Há 18 anos, também assina Ramos, sobrenome do marido, Lázaro, 43, ator, diretor, produtor e criador de conteúdo, com quem tem os filhos João, 12, e Maria, sete.
Sua tática para desempenhar estes múltiplos papéis, incluindo duas personagens simultâneas na novela Cara e Coragem, no ar na TV Globo, é cuidar do corpo e da mente, garantindo que haja momentos só dela – mesmo onde parece não haver um minuto sequer para encaixá-los. Assim como, entre um túnel e outro, no trânsito, enquanto ia para o trabalho, Taís dedicou um tempo a nos atender, pontualmente, às 11h de uma sexta-feira, com a disposição de quem estivesse na mais confortável das salas.
Matutina, àquela altura, já havia riscado boa parte dos itens na lista de tarefas do dia. Fazer tudo ao mesmo tempo, aliás, é uma de suas formas de “manter o frescor” aos 43 anos, com a sensação de “não ter mais do que 27”. A fonte da renovação, em sua percepção, passa por conviver com os jovens.
— Entender a juventude é importante para sair da zona de conforto. Precisa ir acompanhando as mudanças e o que acontece no seu tempo — reflete.
De riso fácil e opiniões sinceronas, arrasta uma multidão de mais de 12,5 milhões de seguidores no Instagram (@taisdeverdade), onde compartilha seu ponto de vista sobre temas complexos e também coisas triviais do dia a dia. Sagitariana (praticante, como diz), não tem medo de se posicionar e mostrar que a vida real é o que realmente aproxima as pessoas. Veja mais a seguir.
Tu interpretas duas personagens com personalidades opostas na mesma trama. O que há de mais marcante nesse trabalho?
É um desafio, porque eu nunca tinha feito duas personagens durante numa novela inteira. E, no início, achei que seria mais trabalhoso, mas como a Clarice “morreu” no segundo capítulo, não foi. Agora que ela voltou é que acho que tenho a real sensação. Mas é um exercício muito legal também de fazer duas pessoas tão diferentes.
O que mais gosto é quando posso ver as duas vestidas iguais, sabendo que não são a mesma. Porque as diferenças são mais fáceis de encontrar, né? E são duas mulheres à frente das suas vidas, do seu trabalho. A gente começa a olhar e vai achando as semelhanças. São mulheres fortes, contemporâneas, donas das suas vidas. Nenhuma depende de ninguém, de um homem.
A gente te conhece desde muito jovem, acompanhamos teu crescimento. Como tu sentes essa passagem de tempo?
Comecei a trabalhar com 13 anos, como modelo, e com 16 já fazia novela. E estou com 43, gente! Nesse tempo todo, muita coisa aconteceu. Meu filho mais velho já vai fazer 13 anos. Mas estou muito melhor hoje do que lá no começo, sem dúvida. E acho que consegui manter um frescor, sabe. Gosto muito de viver e do meu trabalho. Tenho muito orgulho da família que construí e da minha história. Estou menos ansiosa, mais experiente.
Menos, mas ainda ansiosa?
Hoje em dia, me acho menos. Mas a necessidade de fazer muita coisa ao mesmo tempo talvez seja característica de uma pessoa ansiosa. E sagitariana (risos). Mas vejo algumas pessoas e fico pensando… Esse ano, por exemplo, o Caetano fazendo 80, falo “cara, o que aconteceu na vida desses caras?”. Eles não estão estagnados, em cima de um império artístico. Eles estão compondo, experimentando ainda. Temos que olhar para essa galera. Olha a Elza Soares! Ela foi até os 90 cantando hip hop, gente. Elza não morreu, ela desligou. Porque foi tanta coisa vivida e tanta vitalidade.
Tu te sentes assim?
Hoje, me sinto com 27, jamais com 43 anos. Adoro andar com gente jovem, acompanhar a evolução da sociedade, dos pensamentos, das coisas que estão mudando. Isso ajuda a manter esse frescor.
E compartilhar esses pensamentos é parte disso? Te consideras gente como a gente?
É claro que tenho total noção dos meus privilégios, em todos os sentidos. Mas a minha vida é um corre louco, como a de muita gente. Hoje, por exemplo, levantei às 7h, fui para a análise, levei as crianças à escola, já tive duas reuniões e estou dando essa entrevista para você. E nem bati meu ponto ainda.
O corre começa cedo sempre?
Acordo sempre pelas 6h, 6h30min. Adoro acordar cedo. Acho que vou ser daquelas senhorinhas que acordam muito cedo, sabe? Porque gosto de ver o sol nascer, do silêncio da casa. Talvez este seja o único momento em que estou sozinha, sem ninguém me demandando.
Esse tempo sozinha é uma necessidade?
É sim, mas procuro, faço acontecer. Viajo só com minhas amigas, também, tenho meus momentos. Não é sempre que consigo, mas busco. E medito, faço meu exercício todo dia e isso é muito importante para minha saúde mental. Tem algumas práticas de que não abro mão: faço funcional e um treino de alongamento com bastante força. É uma coisa de que preciso, que faço por mim.
Cabe alguma vaidade?
Sou muito vaidosa.
Mas te permites postar fotos sem maquiagem no Instagram.
Sou vaidosa, mas não sou doente, né (risos). Acho importante postar, porque quando estou toda produzida, diva, maravilhosa, me maquiei muito para estar daquele jeito. Então, quero mostrar para as pessoas como eu sou. Acho muito antigo isso de deixar o artista no “Olimpo”, fazer a imagem de intocável. É contraproducente. E um perigo.
Por quê?
Porque isso adoece. É mentira. Ele é humano, vai passar mal, não vai conseguir fazer as coisas. Tem toda uma construção de deixar o artista num lugar distante, o perfeitão. É ruim para o público que acredita e para ele, que não passa o que é.
Acho muito antigo isso de deixar o artista no “Olimpo”, fazer a imagem de intocável.
TAÍS ARAUJO
Atriz
Então, a relação com a aparência não chega a ser uma questão?
Estou feliz, mas me cuido muito. Vivo em dermatologista, isso e aquilo, mas não quero mudar os meus traços. Só busco coisas para melhorar, me sentir bem.
E como fazes para desacelerar?
Não abro mão de que os momentos com meus filhos sejam muito especiais. E nem de cuidar de mim, do meu lado pessoal, mesmo. Porque trabalho muito e gosto, mas preciso também cuidar de mim, sabe. E isso inclui cuidar dos meus afetos, das pessoas à minha volta, fazer exercícios, me alimentar bem.
Tu sentes algum tipo de pressão sobre a maternidade?
Tem fases em que penso que essa é a mãe que posso ser. Sou ativa. Logo que fui mãe, pensei “Se parar de trabalhar e largar tudo para cuidar deles, meus filhos vão ter a pior mãe do mundo”. Porque gosto muito do que faço, do meu trabalho. Então, tenho que equilibrar as coisas. Nem sempre consigo, mas vou tentando, sendo a melhor mãe que posso ser para os meus filhos.
Trabalhar com o marido ajuda? Como tem sido?
Hoje é bom, mas já foi muito ruim. Até a época de Cobras e Lagartos (novela em que o casal contracenava, na Globo, em 2016, durante a qual chegou a se separar), não era bom. Mas a gente descobriu um jeito bom de trabalhar junto. Agora, é só na peça (“O Topo da Montanha”, em cartaz desde 2015, com apresentações adiadas pela pandemia), mas ela só deve voltar no ano que vem.
Bate a saudade?
Precisamos voltar urgentemente. Quero viver isso, ter essa sensação de voltar ao teatro, que só tive como espectadora. Essa peça faz tanta falta, o público gosta tanto, a gente é tão feliz fazendo. Já apresentamos em Porto Alegre e foi um sucesso. Temos que voltar, vamos voltar.
Tu és modelo e atriz desde a adolescência. Por que ter um diploma de Jornalismo?
Quando comecei como modelo, já fazia teatro. E quando entrei na TV e fiz Xica da Silva (novela que protagonizou em 1996, na Manchete), meu pai falou: “Oh querida! Vai ter que fazer um vestibular aí, mas não quero que seja relacionado com o que você já faz”. Porque ele tinha muito medo da instabilidade dessa área. Então, fui fazer duas faculdades. De manhã, Teatro e, de noite, Jornalismo. Me formei só em Jornalismo, mas não queria nem pegar o diploma. Minha mãe que me obrigou a ir. Ela disse: “Você tem que ir lá pegar, sim!”. E foi comigo. Eu fui, né. Obrigada.
Nem pensavas nessa carreira?
Eu fiz algumas coisas. Na posse do Obama (Barack, ex-presidente norte-americano), estava nos Estados Unidos e fui até lá. Fiz um texto, que a Folha publicou. Há muitos anos, fiz também um perfil da Camila Pitanga para uma revista, um da Cleo. Vira e mexe, escrevo algumas coisas. Adoro escrever. Crônicas, não dramaturgia.
E os próximos planos?
O plano é terminar essa novela até dezembro (risos). Tem muita coisa para acontecer até lá. Mas, normalmente, faço tudo ao mesmo tempo. Isso é muito sagitariana.
E ainda tens que passar o crachá na hora certa, né?
Sim! Agora bato o ponto no trabalho, mas esqueço muito. Teve um dia que bati na entrada e esqueci por vários dias. Devem ter achado que fiquei dormindo lá (risos).