Assim que começa mais um capítulo de Amor de Mãe, Taís Araújo abre o Twitter. São raras as vezes em que a intérprete da advogada Vitória não comenta ao vivo, com seus mais de 2 milhões de seguidores, o andamento da novela e os rumos da personagem.
A atriz também encontrou na internet uma forma segura de falar sobre si mesma e no que acredita. Discreta em relação à família – não posta fotos com os filhos pequenos, por exemplo –, é por meio de ferramentas digitais que consome informação e compartilha opiniões e particularidades com os fãs.
Foi em uma de suas postagens que citou pela primeira vez a sensação de exibir um visual completamente natural em um trabalho. Aos 41 anos e com mais de 20 de carreira na televisão, a carioca já passou por diversas mudanças nos cabelos até, enfim, ficar à vontade com seu cachos.
"Está mais forte, com mais volume, quando eu desembaraço não cai um fio. A liberdade é mesmo uma potência, até para os cabelos", escreveu.
Taís tem buscado cada vez mais viver e mostrar essa naturalidade. Em meio ao papo por telefone com Donna, enquanto se preparava para gravar, ela interrompeu a entrevista – não sem antes se desculpar – para pedir à maquiadora:
– Não precisa cobrir nada! (das imperfeições da pele)
Essa é Taís, quase sem filtros, nas redes e fora delas. Além de autoestima e exposição, a atriz falou sobre maternidade, família e casamento. Lázaro Ramos, seu parceiro há 15 anos, é pai de seus dois filhos: João, oito anos, e Maria Antônia, cinco. Parceria estendida de tempos em tempos para arte: ambos estão no projeto da segunda temporada de Aruanas. Abaixo, leia os principais trechos da entrevista:
A novela Amor de Mãe completou três meses no ar e está no auge, com um andamento acelerado a cada capítulo. Como está sendo a experiência de viver a Vitória?
É maravilhoso porque tem muita complexidade na trama, e isso é desafiador. Se você faz um personagem assim em uma série, é uma coisa. Mas em uma novela, que tem todo esse tempo no ar, o desafio aumenta. É difícil manter a coerência por tanto tempo assim. Por mais que os seres humanos sejam complexos, quando vai para uma ficção, muita coisa a gente não consegue entender. Essa personagem tem essa humanidade, uma característica da Manuela (Dias, criadora e roteirista da série) de escrever personagens que não são maniqueístas.
E como você está vendo a repercussão da novela?
As pessoas admiram muito a trama. Mas o que eu tenho notado é que muitos que tinham deixado de ver novela, voltaram à assistir. Houve um resgate.
Um dos dramas que a Vitória trouxe para a trama é a questão de conciliar maternidade e carreira. Como você lida com isso?
Isso é sempre uma questão, né? Para todas as mães que optaram por trabalhar. Porque a gente passa mais tempo das nossas vidas nos nossos trabalhos do que com os nossos filhos. Então, a gente fica nesse equilíbrio, de culpa e tentar recuperar esse tempo. É um trabalho que a gente tem e não é fácil, não. É permanente.
A culpa é um tema bem comum entre várias personagens da novela. Você sente isso também?
Total! Mas a verdade é que vejo uma coisa bonita na história da Vitória. A maternidade revelou quem ela era de verdade. Mexeu em todos os conceitos, valores que ela tinha. Não é à toa que se fala que ela prioriza os filhos. Está neste momento priorizando os filhos porque a vida inteira foi o trabalho. E chegou o momento em que ela viu que essa escolha não fazia dela uma mulher plena. Agora está se reestruturando, e aí é o momento em que vai aprender onde encaixar o trabalho dentro da maternidade.
O meu caso foi o contrário, porque tive que ver onde encaixar a maternidade dentro do meu trabalho (risos). Porque eu já era uma atriz e já trabalhava antes de ter filhos. E entender que filho é a nossa prioridade. Um dia, posso deixar de ser atriz, mas jamais vou deixar de ser mãe dessas duas crianças. Tenho a minha mãe, que me ajuda demais, e é algo muito importante nisso tudo. Minha mãe, meu pai, meu sogro… todo mundo. Só posso trabalhar o quanto trabalho porque tenho também um marido maravilhoso. E a gente ter mãe e pai perto e disposto, com saúde e a fim de ajudar, é um privilégio.
Chama a atenção que, durante a novela, você costume comentar as cenas em tempo real, no Twitter. Como é essa troca ao vivo com os fãs?
Eu descobri que assistir novela pelo Twitter é muito bom (risos). Parece que você está sentado em uma sala com “mó” galera vendo junto. Todo mundo tem o mesmo interesse que você ali, as pessoas sabem do que você está falando. Então tem sido ótimo dividir isso com eles.
Você tem mais de 9 milhões de seguidores no Instagram e usa a rede social para divulgar seu trabalho e para se posicionar sobre causas em que acredita, embora seja discreta sobre sua vida pessoal. Como é sua relação com essas ferramentas digitais?
Eu adoro rede social. Acho que para as atrizes e os atores de televisão é maravilhoso, um ganho. Trabalho desde muito cedo e durante todo esse tempo eu lia o que as pessoas achavam sobre mim. E era uma maluquice, porque muitas vezes eu lia e falava: "Nossa, mas isso aqui não sou eu, é a impressão que essa pessoa teve durante uma conversa de uma hora comigo". E acho que o ganho da rede social é o contato direto com o público, algo que a gente só tinha no teatro, e agora temos essa nova possibilidade de interação. Você mostrar quem você é, ou não também, é uma escolha, mas acho que a proximidade para um artista é fundamental.
Antes, a gente não sabia como agir e talvez fosse mais doloroso. Mas depois você entende que nem tudo é verdade. Às vezes, as pessoas só querem atenção. E se a pessoa não gosta de você também, tudo bem, é direito dela não gostar".
TAÍS ARAÚJO
sobre redes sociais
E tem outra coisa também: o tanto de coisa que se descobre na internet que antes não teríamos acesso se não fosse por ela. Tem tanta gente que faz um trabalho legal pelo Brasil, tantos artistas incríveis. Você pega aquela menina Alcione Alves que faz dublagens hilárias. A primeira vez que eu vi aquilo mandei uma mensagem no direct pra ela perguntando: “Quem é você?”. E ela me disse que era uma estudante de Engenharia do Recife, e que não era atriz. E eu falei: “Mentira” (risos). E assim você tem oportunidade de conhecer muitas pessoas. E adoro gente, sou supercuriosa, amo mesmo. Eu fiz muita amizade na internet. A Carmem Virginia (chef de cozinha) que participou do Cozinheiros em Ação, no GNT, virou minha amiga. São pessoas com quem você descobre afinidade.
E os haters? É difícil não encontrar alguém que não tenha sido alvo de ataques na internet.
Sempre tem. Tem coisa boa e coisa ruim, né? Tem hater, tem robô, tem um monte de coisa por aí. Mas chega uma hora em que esse tipo de agressão acontece tanto que eu acho que perde o valor. Você escolhe: quer lidar com gente boa ou gente chata? Eu quero com gente boa. Não sei se é questão da maturidade também. Antes, a gente não sabia como agir e talvez fosse mais doloroso. Mas depois você entende que nem tudo é verdade. Às vezes, as pessoas só querem atenção. E se a pessoa não gosta de você também, tudo bem, é direito dela não gostar.
Você se formou em Jornalismo, embora nunca tenha exercido a profissão. Como você vê e consome o noticiário de hoje e a atuação da mídia?
O bom é que agora você escolhe onde quer se informar. Decide o que quer consumir. Mas também não podemos mais acreditar em tudo e é preciso cada vez mais ir atrás do que se confia. Se você simpatiza mais com um lado ou com o outro… pode escolher. Eu acho melhor que seja assim.
Você foi a primeira protagonista negra da televisão brasileira (em Xica da Silva, 1996) e a primeira protagonista negra da Rede Globo (em Da Cor do Pecado, 2004). Você sente que, de lá pra cá, as coisas estão mudando em relação a representatividade e diversidade, seja na TV, no cinema ou na publicidade?
Eu sinto uma mudança, sim. Vejo bem mais a presença de pessoas negras na publicidade. E não só pessoas negras, mas mulheres gordas, pessoas com deficiência. O que falta nesse caminho é a publicidade respeitar essas pessoas enquanto consumidoras. Não é benevolência, é mercado. A pessoa tem que se sentir representada para consumir aquilo. É uma demanda. Sentir-se representado é se sentir respeitado enquanto consumidor. A gente está em um mundo capitalista mesmo, é o poder do dinheiro. Então, se você não me respeita, vai respeitar o meu poder de consumo.
Você nasceu no Méier e foi criada na Barra da Tijuca, um bairro predominantemente branco. Na sua descrição nas redes sociais diz “a pessoa sai do Méier, mas o Méier não sai da pessoa”. Que lembranças você tem da sua infância nesses lugares e como isso reflete na pessoa que você se tornou?
Quando falo isso, falo sobre origens. O quanto é importante lembrar de onde eu vim. Por mais que eu tenha morado na (Barra da) Tijuca, em condomínio, estudado em colégio particular, vim do Méier. Por mais que meus pais tenham ascendido socialmente, a minha origem é suburbana, com muito orgulho. É isso. Eu não esqueço de onde eu vim. Eu lembro que quando eu era criança sofria muito, porque quando morava na zona norte, era tudo na rua, festa junina na calçada. Depois que eu fui pra Barra, era todo mundo trancado no condomínio, ficava arrasada. Obviamente, me acostumei, mas sofri muito no início. Ao mesmo tempo em que me divertia, tinha piscina e tantas outras facilidades de um condomínio na Barra da Tijuca. Mas havia uma coisa da essência, da raiz, da zona norte que não tinha, e era um sofrimento pra mim. Não tinha, mesmo a Barra sendo formada por pessoas da zona norte e da Baixada Fluminense naquela época. Hoje, não, mas há 30 anos a Barra era assim: uma mata e seus moradores eram pessoas vindas de outros lugares. Era um bairro novo, e o pessoal que estava emergindo, ascendendo socialmente, vinha pra cá.
No último Oscar, um curta-metragem que fala sobre uma menina negra aprendendo a amar seu cabelo ganhou o prêmio da categoria. Como foi esse processo pra você?
O mais bonito é saber como a gente é originalmente. Na minha geração, as mães mexiam muito nos nossos cabelos, então muita gente nem lembrava como eram seus fios, porque desde pequena tinha química. É se dar a chance de ver como você é. Se achar que gosta mais do seu cabelo, bom, é isso, a liberdade é sempre o melhor caminho. Mas, se você nem se conhecer, aí acho um pecado, sabe? Comigo foi assim. Quando tive coragem de deixar meu cabelo natural, eu gostei de olhar pra mim e amar meu cabelo como ele era. E, então, deixei ele assim.
Você e o Lázaro completaram 15 anos de casados. Você já disse em várias ocasiões que não têm uma vida perfeita. Mas o que faz o casamento dar certo?
São 15 anos e nesses 15 anos nós, com quatro anos de casados, ficamos oito meses separados. Dois anos depois, tivemos um filho. É um caminho construído. A gente trabalha junto, e isso é uma coisa curiosa. Acho que a gente dá sorte de trabalhar muito bem junto. O trabalho juntou a gente, e a maternidade também. No nosso caso, as crianças nos deram ainda mais cumplicidade. O projeto de criar nossos filhos da maneira que a gente quer, no que acreditamos como importante e fundamental na criação das crianças. A verdade é que acho que a gente se potencializa.
Pois é, vocês são pais do João Vicente e da Maria Antônia. Em um momento em que se fala de questões como feminismo e machismo, como é educar os dois gêneros na mesma casa? É mais difícil com menino ou menina?
Nós prestamos muita atenção na gente, no exemplo que vamos dar a eles. E lá em casa é todo mundo igual. Tem uma diferença entre eles que é a de idade. Maria tem cinco anos, está deixando de ser bebê. O João tem oito anos, quase nove, está passando a ser um meninão. Então, a diferença entre eles é de idade, em que um pode fazer coisas que o outro não. “Ah, por que ele pode fazer isso e eu não?” “Porque seu irmão tem oito anos e você só tem cinco”. Ou “Ah, por que ela pode fazer isso e eu não?” “Porque ela só tem cinco e você já tem oito”. É essa a conversa lá em casa (risos). É o que é mais adequado e apropriado para a idade do que para o gênero.