Antipatizo com trocadilhos, mas não pude evitar a pérola que dá título a esta crônica. Conheci a expressão “literacura” através do professor Silvio Volpato, de Parobé, e agora o comentário de um leitor me fez colocá-la em uso. Disse o rapaz que não entende a razão de nos mobilizarmos pelo setor livreiro do Rio Grande do Sul quando há categorias mais importantes a socorrer, como hospitais.
É o mesmo assunto, caro leitor. Se na sua mesa de cabeceira, ao lado da cama, há remédios para colesterol, pressão alta e ansiolíticos que ajudam a pegar no sono, coloque também um livro, pois uma hora você terá que acordar.
Não há saúde mental, espiritual e mesmo física que prescinda da literatura.
Livro combate a arrogância, um dos males do século. O leitor tem acesso aos sofrimentos dos personagens, se identifica com suas dores e percebe que é tão miserável quanto. Menos um nariz em pé no mundo.
Livro é perfeito contra o narcisismo, outra praga moderna. O leitor é capturado pela história de uma escravizada ou pela biografia de um atleta, e claro que cairá no delírio de julgar sua própria história mais interessante, mas, pelo menos por meia hora, se manterá focado na leitura em vez de tagarelar sobre si mesmo.
Aliás, livro protege contra calos nas cordas vocais. Bendito hábito silencioso.
Vivemos uma pandemia de depressão, que tem atacado jovens sem perspectiva, com a moral em baixa, já que a tecnologia os instiga a se comparar com um monte de boçais comunicativos. A vacina se chama literatura, que os reconecta com seus valores, preenche a alma em vez dos lábios e resgata a autoconfiança, salvando-os de sucumbirem a amostragens superficiais de popularidade.
Dor de cotovelo não se cura em balcão de bar, mas ler poesia empodera, você passa a ser uma pessoa que vale a pena – azar de quem te deixou. Enxugue as lágrimas e, se voltar para o balcão do bar, repare no milagre: sua aura intelectual fará mais por você do que o hálito da cachaça.
Livro minimiza a solidão. Enquanto lemos, um povaréu nos habita.
Livro reduz o estresse. Você desliga dos problemas mundanos.
Livro evita fraturas: excetuando uma amiga que prefere ler em pé, costuma-se ler sentado ou deitado. Se acaso adormecer com o livro em mãos, aleluia. Pior seria a insônia, que provoca ansiedade.
Livro salva até da morte, sem exagero. Deu no Jornal Nacional, anos atrás. Um cidadão escapou de um tiro no peito por carregar um exemplar de capa dura por debaixo do terno.
Portanto, doem livros para bibliotecas arrasadas pela enchente do sul, comprem livros das editoras gaúchas que ficaram com o estoque submerso e ajudem a manter a cabeça dos gaúchos à tona.