Trabalhos difíceis: são muitos. Alguns extremamente desvalorizados, com salários vergonhosos. Outros com cargas horárias pesadas demais, sem garantias, sem proteção. E tem esse trabalho que a gente faz aqui no jornal, de escrever as notícias e colunas, que é difícil por uma razão muito triste: é quase impossível tratar de coisas boas.
A gente tenta, mas todo texto leve acaba parecendo bobão diante do que acontece no mundo. Nem bem aquele espanto com a guerra da Ucrânia, já vem outra muito pior – desculpe por fazer ranking de guerra –, e isso porque os massacres que acontecem agora mesmo em Etiópia, Iêmen, Mianmar e Síria já não merecem as manchetes. Guerras em lugares distantes demais, e entre povos distantes demais da compaixão ocidental, não rendem cliques.
Ainda assim, remexendo aqui e ali, dá para encontrar algumas coisas que fazem o olho brilhar. Os aviões com repatriados brasileiros entram nessa categoria. Que orgulho saber que o Brasil foi o primeiro país a buscar seus cidadãos, e sem mesquinharia sobre os custos da operação. Sabia que os norte-americanos terão que assinar um termo se comprometendo a pagar pelas despesas de seu resgate? E que a Inglaterra já botou preço, R$ 1.800 por pessoa, para buscar seus compatriotas em Israel? Agora é torcer para os brasileiros de Gaza conseguirem sair de lá o quanto antes.
Nessas todas, não falta quem vá às redes sociais reclamar dos gastos do governo com o vai e vem dos aviões da FAB. Inacreditável. Coraçãozinho já virou pedra há tempos. E também não faltam aqueles que desembarcam agradecendo para o pastor da igreja, o prefeito de Sorocaba e o deputado fulano por terem sido resgatados. O falecido Zorra Total não faria melhor.
Outro alento é que começou a temporada das Feiras do Livro. Caxias do Sul e Canoas já coloriram suas praças. A Feira de Porto Alegre, que não foi habilitada para captar apoios e correu o risco de murchar, chega firme e forte com o aporte dos governos estadual e municipal, depois da grita da sociedade e da imprensa. E com Tabajara Ruas ocupando não a cadeira, mas as calçadas e os corredores do Patrono.
Olhando a lista de autores convidados para a 69ª Feira do Livro de Porto Alegre, nem dá para imaginar os perrengues que a organização passou com a ameaça da falta de recursos. Algumas e alguns: Natalia Timerman, Sidarta Ribeiro, Miguel Nicolelis, a cubana Teresa Cárdenas e tantos mais que eu precisaria pedir a página da Martha Medeiros emprestada para dar a nominata toda. Ah, a Martha vai estar lá. A área infantil também não deixa por menos e entre as suas quase incontáveis atrações vai ter a Paula Taitelbaum com o artista Xadalu lançando Cadê Cadê, o novo e lindo livro deles.
Até que, para uma coluna que começou para lá de pessimista, falando de guerra, deu para recuperar um pouco da esperança. Coisa que os livros fazem com a gente. Então aproveito para encerrar esse texto com as três garotas-símbolo da Feira do Livro de Porto Alegre, as que nunca se entregam e que mais uma vez estarão, de 27 de outubro a 15 de novembro, em cada canto da Praça da Alfândega: Sônia Zanchetta, a dama da programação infantil, Sandra La Porta, a eminência da programação adulta, e Noia Kern, a voz e os olhos da Feira. Enquanto elas estiverem lá, é sinal de que está tudo bem.
E agora com licença, que vem chegando mais um avião de repatriados e eu quero chorar um pouquinho na frente de TV. Mas de alegria.