Imagine um mundo sem jornais. Sem um espaço confiável para procurar uma informação. Um mundo onde as pessoas repassassem as coisas no boca a boca — e quem conta um conto, aumenta um ponto, diz a sempre sábia sabedoria popular. Existe uma Janete Clair dentro de cada um de nós, uma novelista enrustida acrescentando complicações imaginativas ao que parece prosaico demais. Nota para as novas gerações: Janete Clair foi a primeira-dama da telenovela no Brasil, até hoje inspiração para autores do ramo.
Maria e João casaram ontem. O vestido dela, credo, era de um mau gosto atroz, todo transparente, não era figurino para se entrar na igreja. E ele, que deixou uma namorada grávida para trás? A madrasta da noiva ficou no altar ao lado do marido, toda carinhosa, mas só para disfarçar. Faz anos que ela tem um caso com a Alzira, a madrinha da Maria, que nem convidada para o casamento foi.
De alguma forma, desde que uns e outros se dedicaram a demonizar a imprensa, a gente tem visto histórias assim, tão maldosas quanto ridículas, espalhadas pelo meio preferido de (des)informação dos que compraram a ideia de que a imprensa nunca diz a verdade. Por que ler um jornal se o grupo de WhatsApp traz tudo bem mastigadinho, e com detalhes que ninguém mais conhece?
A cantora fez uma tatuagem naquele lugar porque é satanista, a favor do aborto, drogada, pró-pedofilia e dança Macarena pelada. Passe adiante sem dó, nem piedade.
Saudade do tempo em que o grupo da família era apenas o órgão oficial do tradicional bom dia com a imagem de um sol nascendo ou de uma flor se abrindo. Hoje, mamadeira de piroca é pinto, sem trocadilhos, perto do que se lê ali.
Já se aventou que os responsáveis pela desinformação que corre solta no WhatsApp são os próprios jornais, que começaram a cobrar pelo conteúdo da internet e deixaram os não-assinantes à mercê dos mentirosos profissionais. Pode até ser, mas bom-senso não é exclusividade de assinante. Cada vez que um absurdo é repassado, fica a dúvida: quem encaminhou é ingênuo ou mal-intencionado? Pessoalmente, voto na segunda hipótese.
A vida sempre vem em versões pouco verossímeis no WhatsApp. Nem vamos falar no que aconteceu no início da pandemia, ou nos esculachos que comprometeram — e comprometem — carreiras e reputações. Nas versões covardes para o assassinato de Gevanildo, em Sergipe, e para as operações policiais que matam também quem não tem nada a ver com o peixe. Conselho de amiga: ao receber uma suposta notícia pelo WhatsApp, perca alguns minutos checando nos jornais. Evita disseminação de lorotas e poupa a gente de passar vergonha.
Tudo isso porque 1º de junho foi o Dia da Imprensa, que é uma das grandes ferramentas da democracia. Repetindo o óbvio: sem imprensa não existe democracia. Quem está distante da rotina de redações, plantões e apurações talvez não imagine o quanto os jornalistas trabalham pela notícia. Quem se apaixonar por uma ou um, já vá sabendo que dias santos e feriados serão dias trabalhados. E o salário, ó, como dizia o professor Raimundo.
Aproveitando o Dia da Imprensa, mando aqui minha mais sincera admiração por todos os jornalistas e um beijo (atrasado, para variar) para as minhas editoras, Renata, Mary e Adriana, que seguram as pontas das minhas tardanças na entrega da página. Na semana que vem, a coluna vai chegar no prazo — juro que não é fake news. E para a família, os amigos e os leitores do David Coimbra, um abraço com a certeza de que ele continua em cada linha que deixou.