
De todos os adjetivos possíveis de serem usados para caracterizar Aracy de Carvalho (1908-2011), corajosa talvez seja o mais acertado. Brasileira vivendo na Alemanha durante a II Guerra Mundial, arriscou a vida para ajudar dezenas de judeus a escapar do regime nazista. A contribuição da humanista – destacada pelo Yad Vashem, o Museu do Holocausto de Israel, e que merece ser mais conhecida entre os brasileiros – será contada na minissérie Passaporte para Liberdade, que estreia nesta segunda-feira (20) na RBS TV, após o The Voice Brasil.
Interpretada na produção pela atriz Sophie Charlotte, Aracy nasceu em Rio Negro, no Paraná, filha de um brasileiro e uma alemã. Quando seu primeiro casamento chegou ao fim, mudou-se com o filho de cinco anos para Hamburgo, na Alemanha, onde vivia uma tia. Foi lá onde começou a "contravenção" que, tempos depois, lhe renderia a alcunha de "Anjo de Hamburgo". Evidenciam documentos históricos que, empregada no setor de passaportes do consulado brasileiro, ela burlava a Circular Secreta 1.127, normativa que restringia o ingresso de judeus no Brasil durante o período do Estado Novo de Getúlio Vargas, possibilitando que famílias judias viajassem ao país para fugir do Holocausto.
Motivação
A saga da mulher que desafiou o regime nazista é narrada em Passaporte para Liberdade a partir do olhar dos autores Mario Teixeira e Rachel Anthony, sob a direção artística de Jayme Monjardim e a direção de Seani Soares. Eles, junto ao elenco, assumem a missão de torná-la protagonista de sua trajetória: segunda esposa do escritor Guimarães Rosa, interpretado por Rodrigo Lombardi, Aracy, por vezes, teve a amplitude de seu legado ofuscada pelo título de companheira do escritor, autor de Grande Sertão: Veredas.
A relação dos dois será abordada pela trama, mas o objetivo da produção é fazer jus a quem foi Aracy de Carvalho para além do campo conjugal.
— A Aracy olha para o outro com humanidade. Ela tem o impulso de ajudar o outro, arriscando-se, passando por cima do medo. Que ela seja um veículo para a gente reconhecer as mulheres que estão ao nosso lado, e que esse encontro com suas potências possa ser reverenciado depois — comenta a protagonista Sophie Charlotte.
Rodrigo Lombardi destaca o cuidado da produção com a grandeza da personagem:
— Criei um João Guimarães Rosa que amparasse Aracy. Essa sim era sua função na trama. Passaporte para Liberdade é sobre uma mulher forte, que se doou, privando-se dos prazeres pessoais em prol da humanidade.
Sophie teve uma motivação especial para dar vida à personagem nas telas: a atriz, alemã naturalizada brasileira, nasceu na mesma Hamburgo onde Aracy de Carvalho fez história décadas antes. Quando soube que a Globo estava produzindo uma série sobre ela, conta, perdeu o sono e decidiu bater na porta do diretor artístico Jayme Monjardim, clamando para que o papel fosse seu.
— Me senti muito ligada à história, não consegui dormir. Eu tinha que ir falar com o Jayme. Cheguei nos Estúdios Globo e perguntei por ele, fiquei esperando ele sair de uma reunião. Ele veio com os olhos arregalados e eu já saí falando coisas em alemão, falando que eu precisava fazer o papel da Aracy, que eu esperei a vida toda para contar a história de uma mulher assim — relembra.
O resultado da investida bem-sucedida da atriz será visto nos oito capítulos da minissérie, exibidos pela Globo a partir deste dia 20, de segunda a quinta-feira – em versão dublada, pois a série foi gravada em inglês por se tratar da primeira produção internacional da emissora em parceria com a Sony Pictures Television.
Sophie, impactada pelo contato com a história de Aracy de Carvalho – que fez com que a coragem virasse o grande lema de sua vida desde então, como revelou a GZH –, espera que, agora, mais pessoas também sejam inspiradas por ela:
— Essa série é um convite à ação. A gente pode ter um discurso lindo e não fazer nada, ou ser absolutamente reservado e transformar a vida das pessoas, que foi o caso da Aracy. Espero que desperte muito as pessoas para esse olhar de empatia, de estender a mão e abrir o coração para escutar e receber o outro.
* Produzido por Camila Bengo