Muitas séries se arrastam por anos e duram mais do que deveriam. Saber a hora de parar é uma virtude. Ainda mais encerrar satisfatoriamente. É comum ver atrações aclamadas entregarem desfechos decepcionantes, às vezes com tramas relaxadamente resolvidas (ou nem isso). Não faltam exemplos: Game of Thrones, Lost, Dexter, How I Met Your Mother, entre outros. Não é o caso de Dark, a qual os oito episódios da terceira temporada chegam a Netflix neste sábado (27). A série alemã encerra seu ciclo no tempo certo e com os seus nós devidamente desenrolados.
Em Dark, as jornadas entre passado e futuro acabam gerando linhas temporais distintas, que se convergem e criam versões diferentes dos mesmos personagens. Ou até pior: na segunda temporada, descobrimos que uma personagem é mãe da própria mãe (!). Algo digno de Kubanacan (2003-2004), novela de autoria de Carlos Lombardi.
A narrativa de Dark tem início em 2019, acompanhando os eventos de uma pequena cidade alemã chamada Winden após o desaparecimento de crianças locais. Esses sumiços acabam expondo antigas intrigas entres moradores e se relacionam como eventos ocorridos na cidade em outras décadas. A primeira temporada de Dark gira em torno de três épocas: 1953, 1986 e 2019. Na segunda temporada, vemos atividades em 1920 e 2052. São ciclos de 33 anos que estão entrelaçados.
Criada por Baran bo Odar e Jantje Friese, Dark se notabilizou por ser uma atração que exige mais da audiência para ser acompanhada. É comum ver nas redes sociais alguém comentar que está perdido ou não entendendo o que se passa na história. Não deve ser diferente com a terceira temporada: além das linhas temporais, a trama acrescenta ainda mais complexidade ao introduzir um universo alternativo – o que foi antecipado no final da segunda temporada. Aqui a pergunta deixa de ser “que ano é este?” para que “que mundo é este?”. Ou seja, Dark seguirá queimando os fusíveis da cabeça de seu público.
Talvez por isso tenha ocorrido e decisão curiosa de se entregar ao didatismo e promover uma verdadeira teleaula no começo de um dos episódios derradeiros. A quarta parede é quebrada para explicar o conceito do Gato de Schrödinger – experiência mental desenvolvida pelo físico austríaco Erwin Schrödinger, em 1935, para abordar mecânica quântica (de acordo com as leis do mundo subatômico, o animal estaria vivo e morto simultaneamente). Após a aulinha, o que se segue é um dos episódios mais interessantes da série, apresentando acontecimentos fora do ciclo de 33 anos.
Assim como a segunda temporada, Jonas Kahnwald (Louis Hofmann) segue procurando dar um jeito para que tudo volte ao normal. Desta vez, o protagonismo é dividido com Martha Nielsen (Lisa Vicari) – a jovem assume mais tempo de tela nesta reta final. Embora os dois estejam apaixonados, vale lembrar que nas temporadas anteriores descobrimos que ela é tia de Jonas.
Aliás, mais parentescos são revelados nesta terceira parte de Dark, dando mais vazão à brincadeira de que a série é a Kubanacan germânica. Contudo, embora o enredo possa ser um nó emaranhado de linhas temporais e mundos paralelos, o seu desenrolar se torna contundente aos poucos.
Nesta temporada, o uso de adereços e figurinos para mostrar conexão e diferenças entre os personagens é efetivo. Um pequeno objeto pode colidir com quase todas as narrativas, realçando a ideia recorrente da trama de como tudo está conectado.
Embora possa parecer confusa com sua estrutura pouco usual, a última temporada de Dark consolida a atração entre as melhores séries de ficção científica. Dark consegue apresentar uma conclusão satisfatória e agridoce após muitas viagens no tempo e para mundos paralelos. Talvez haja até mais respostas do que perguntas no final, o que pode ser um tipo de façanha para um programa com um enredo tão complexo.