O tempo passa, as coisas mudam, mas em algum ponto continuam sempre iguais. Isso é o que mostra a série Filhos da Pátria (Globo), que volta para sua segunda temporada em outubro. Para a atriz Fernanda Torres, que está no elenco, há motivo de desesperança tanto na telinha quando na vida real:
— Quem era escravo vira empregado doméstico, quem era corrupto continua corrupto, quem era o dono do dinheiro continua sendo. O esqueleto da sociedade continua sempre igual — diz Fernanda sobre a série de Bruno Mazzeo, antes ambientada em 1922, no pós-independência do Brasil, e agora, nos anos 1930, no início da Era Vargas.
A atriz interpretará Maria Teresa nesta nova temporada. Uma mulher que fica encantada com os militares e quer que seu marido, Geraldo Bulhosa (Alexandre Nero), se torne um.
— Ela fica sonhando com essa coisa do Geraldo ser militar e entra para uma liga de donas de casa perfeitas, que são as mulheres dos militares.
A atriz revela que sua personagem também terá dificuldades, nesta nova temporada, para entender as mudanças em relação aos direitos trabalhistas, que começavam a surgir, e diz que Maria Teresa não consegue entender como a empregada tem que ter folga, horário.
— Ela acha um absurdo isso. Como tudo no Brasil, essas relações se dão pelo afeto e ela fica magoada pela (ex-escrava) Lucélia (Jéssica Ellen) ter uma folga (...) Ela é uma loucura, diz coisas racistas, mas você acaba tendo algum carinho, um sentimento afetuoso, porque não é possível uma pessoa ser tão imbecil assim (risos).
Para Fernanda, o personagem de Alexandre Nero também tem aquilo que ela considera uma mistura bem brasileira:
— Não é totalmente corrupto, mas também não deixa de ser. É um pai bem intencionado, mas também é um canalha.
Fazendo um paralelo entre a série e a situação atual do Brasil, a atriz se diz cética em relação ao futuro do país e afirma que vivemos um misto de mínimas conquistas e de retrocessos.
— A gente está vivendo um momento meio apocalíptico no mundo, sem muito futuro — desabafa. — Eu nasci na ditadura, vivi a redemocratização, esse sonho de que a sociedade seria diferente e em muitos sentidos foi. Vivo numa sociedade mais aberta do que na época em que eu era criança. A crise econômica do Sarney, o fechamento do Brasil para o mundo... Isso tudo melhorou. Por outro lado, a democracia também nos provou que não há santos, que o problema do Brasil é estrutural.
Fernanda ressalta que o jogo político-econômico do poder está organizado na raiz da formação do Brasil e cita a desigualdade social como um dos problemas que nunca foram resolvidos.
— A gente não tem saneamento básico em mais da metade do Brasil... Vivi 50 anos para olhar e falar: "Caramba, é o mesmo assunto da minha infância".