Rivalidade, desavença, querela, rixa, treta. Essas são apenas algumas das muitas traduções possíveis para o termo "feud" (pronuncia-se "fiud"), título da mais nova empreitada de Ryan Murphy – produtor de sucessos em série da televisão americana como Glee, American Horror Story e o recente The People v. O. J. Simpson: American Crime Story.
Feud: Bette and Joan estreou no dia 5 de março nos Estados Unidos e no último domingo no Brasil (os oito episódios serão exibidos sempre aos domingos, às 22h, pelo canal Fox Premium), e a treta escolhida para inaugurar a série, além de revisitar os anos dourados de Hollywood, possibilitou a reunião de quatro divas do cinema: Joan Crawford (1904 – 1977) e Bette Davis (1908 – 1989) e as estrelas convidadas para interpretá-las na meia-idade, Jessica Lange, 67, e Susan Sarandon, 70, respectivamente. As quatro, juntas, somam nada menos do que cinco Oscar (Davis ganhou dois).
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Além de competirem pelos holofotes e se inticarem publicamente sempre que possível (Joan era a estrela mais famosa, mas Bette a mais reconhecida pelo talento dramático), as duas atrizes levaram para a frente das câmeras, em 1962, uma história em que os duelos de atuação e provocações mútuas fizeram a delícia do público e a glória do cinema. A série começa no início dos anos 1960, quando Joan Crawford (Jessica Lange), entediada e meio falida, sai em busca de um projeto em que uma atriz cinquentona como ela pudesse ter um papel de destaque. A escolha recai sobre o livro O que Terá Acontecido a Baby Jane?, de Henry Farrell, que conta a história de uma artista que ficou famosa quando criança e que vive, na meia-idade, encerrada com a irmã paralítica em uma mansão.
Empolgada com o potencial da história, Crawford envia o livro para o diretor Robert Aldrich (Alfred Molina), que embarca no projeto e aceita a sugestão da própria Crawford de convidar Davis para completar o elenco – assumindo o risco de aproximar o fósforo e o pavio no set de filmagem. O filme estrearia em 1962, recebendo cinco indicações ao Oscar, inclusive melhor atriz, para Bette Davis, que perderia a estatueta para a bela e jovem Anne Bancroft – graças, em grande parte, ao esforço direto e incansável de Crawford para melar o possível terceiro Oscar da rival.
Feud retrata os bastidores das tempestuosas filmagens de O que Terá Acontecido a Baby Jane?, ao mesmo tempo em que usa a linguagem de um falso documentário rodado nos anos 1970 para recolher depoimentos de personagens reais que conviveram com as estrelas, como a atriz Olivia de Havilland (vivida por Catherine Zeta-Jones) – a veterana atriz de ...E o Vento Levou, que completou cem anos em 2016, foi ela própria centro de outra rixa histórica de Hollywood, com a irmã Joan Fontaine. Outra personagem real que ganha destaque na série é a jornalista de fofoca, e rematada dedo-duro durante a época do macarthismo, Hedda Hopper (vivida com brilho por Judy Davis).
Interpretadas por duas grandes atrizes, Bette e Joan voltam à vida com a intensidade que as duas divas mereciam. Susan Sarandon parece mais à vontade encarnando Bette Davis, tanto pela semelhança física quanto pelo temperamento exuberante. Já a Joan Crawford de Jessica Lange deixa vir à superfície uma certa fragilidade que não estamos acostumados a associar à atriz de sobrancelhas grossas e olhar gelado. "Uma rixa não nasce do ódio, mas da dor", diz Olivia de Havilland a certa altura do primeiro episódio, provocando o espectador a ir além do aspecto folclórico da rivalidade de duas atrizes muito famosas. Feud é tanto sobre Bette e Joan, duas mulheres fortes que encarnaram personagens igualmente poderosas na tela, fugindo ao estereótipo das mocinhas bem-comportadas da época, quanto sobre a situação das atrizes "de uma certa idade" em Hollywood.
Se é certo que muita coisa mudou e Meryl Streep, aos 67 anos, recebeu este ano sua vigésima indicação ao Oscar e outras atrizes talentosas têm tido, cada vez mais, a chance de produzir seus próprios projetos especiais, a indústria do cinema permanece seduzida pela juventude e pela beleza – o que costuma ser especialmente cruel para mulheres com mais de 40 anos em busca de bons papéis.
Se a primeira temporada de Feud, escrita e dirigida por um time majoritariamente feminino de artistas, reflete sobre o espaço das mulheres no showbiz, a segunda deve se debruçar sobre as batalhas íntimas de um casamento. A segunda temporada de Feud, na qual Ryan Murphy já está trabalhando, vai mergulhar nos barracos reais de Charles e Diana. Como alertava Margo Channing em A Malvada, apertem os cintos que será uma noite agitada.
Feud: Bette and Joan
Domingos, às 22h
Fox Premium