Game of thrones parece Caverna do dragão perto do que foi o episódio de terça-feira do Masterchef Brasil. Uma tensão danada, estratégias de combate, mocinhos que afligem o espectador ao cometerem erros estúpidos, vilões que encantam pela prosódia (cabe o papel a Jacquin e sua memorável indagação com sotaque francês: "Você já viu cu de galinha quadrado?"), coadjuvantes dispostos a roubar a cena (Lee, com seus "What?!?" e seu sofrimento com a testa na parede), um clímax eletrizante e a certeza de que um personagem importante vai dizer adeus – só não se sabe quem e como.
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Mas, antes dessa hora na cozinha de Westeros, precisamos aguentar a prova dos sabores do Brasil, especialmente na edição: veloz e sincopada demais. Não deu para entender muito o que acontecia (minhas filhas cantando e dançando na sala também não colaboraram), só sei que o suspiro de limão do Pedro deixou saudade nos 27 chefs convidados.
Ainda bem que com meia dúzia de ovos se faz um bom programa. A prova de eliminação resumiu o que há de melhor no MasterChef Brasil: a surpresa, o nervosismo, a urgência da técnica, a capacidade de improviso, a mistura de palavras duras e senso de humor dos jurados. A prova do ovo, com quatro etapas de 10 minutos cada, e sem margem para erros (não havia um ovo reserva), foi antecedida pelo momento que poderia ser de magnanimidade ou de "primeiro eu": Aluísio, cujo time perdeu de lavada na prova de equipe, podia escolher dois concorrentes para serem salvos, por desempenho ou por amizade, e ele tinha o direito de se imunizar. Fiquei feliz em ver que o cabeludo optou pelo critério do desempenho, indicando Pedro e Fábio. Mas havia um twist: Luriana, a líder vencedora, definiria quem, de fato, subiria ao mezanino – Pedro, sem o perdão do trocadilho, suspirou de novo.
Na primeira parte, os concorrentes tinham de fritar um ovo. Foi um show de técnica: Fernando fez imersão, Aluísio preparou um ovo quadrado, e o Leo separou a gema para cozinhar em tempo diferente do da clara. Mas quem ganhou e escapou foi Fábio, que tenta dissimular sua arrogância minimizando seus pratos ("Ontem eu fiz cinco ovos na panela e todos ficaram perfeitos, mas aqui, com a pressão, é difícil acertar"). E a Gleice? Bem, mostrou que nem ovo sabe fritar – estourou sua gema.
Veio a prova do ovo pochê. Fernando, outra vez, exibiu técnica. Chegou a surpreender os jurados ao furar seu ovo, emulando – e citando – Julia Child, célebre autora de livros de culinária e apresentadora de TV americana, retratada no filme Julie & Julia (2004). E a Gleice? Assim como Aluísio, não seguiu o modo de preparo que se espera de um chef – envolveu o ovo em papel-filme.
À essa altura do campeonato, eu já estava achando que Gleice se consolidaria como uma espécie de Highlander, a guerreira imortal do MasterChef: quando a gente pensa que "hoje ela sai", alguém erra mais do que a estudante paulista (seja um competidor, seja um jurado) e sua cabeça é mantida.
Sobraram ela, Aluísio e Leo para a etapa do omelete – que, agora reconheço, nunca comi na vida; aquilo que vi na TV é muito mais delicado do que minha mãe ou minha mulher já prepararam (porque eu, vocês sabem, mal sei fritar um ovo – ficaria bem assustado se tivesse que disputar uma vaga contra a Gleice). Nenhum dos três acertou a mão, mas o do Aluísio foi o mais próximo de uma omelete.
O duelo final bem poderia ter sido realizado em algum dos cenários de Game of thrones. Como se estivéssemos na solidão gelada da Muralha, dava para ouvir batendo o coração de todos – Gleice e Leo, mas também dos jurados, de Ana Paula Padrão e da turma do mezanino (apesar dos "What?" do Lee ficarem ressoando). Se fosse uma competição de cirurgia, coitados dos pacientes, porque as mãos da Gleice e do Leo tremiam como um brasão dos Lannister ao vento. Eles suavam como se o sol de Dorne pairasse sobre suas cabeças. O prato: o tal de ovo mollet, um ovo cozido com a gema mole. Uma prova apresentada praticamente em tempo real – não cronometrei, mas acho que durou, de fato, 10 minutos, sem muita edição. Os dois candidatos cometeram erros – será que o de Leo teria sido maior do que o de Gleice? Corta para o intervalo – no maior clima dos nonos episódios de Game of thrones, aqueles que terminam deixando um nó na nossa garganta. Quem sai? Quem sai?? Quem sai???
No final, Gleice escorregou nas casquinhas de ovo. Madrugada adentro, muita gente deve ter festejado sua eliminação – e a permanência de Leo, que tem a simpatia de boa parte do público.
Restam 11 na guerra pelo trono.