As casas geminadas do Quilombo do Areal, entre os bairros Cidade Baixa e Menino Deus, em Porto Alegre, estão ficando coloridas. Idealizado pelo artista urbano Jotape Pax e pela produtora cultural Kami Rosito, o projeto Paredes com Propósito propõe levar arte e cor às comunidades atingidas pela enchente de maio.
— Aqui a cor também é arte — reflete Pax, que não esconde a alegria por fazer a diferença em um momento tão delicado para a comunidade deste reduto negro tão significativo para a história da cidade.
Segundo o artista, a inspiração é a cor, e o Caminito, beco situado no bairro La Boca, em Buenos Aires, na Argentina. O ponto turístico da capital do país vizinho é conhecido por ser multicolorido.
— O mais legal de tudo isso, além de fazer o mapeamento de regiões carentes que precisam de apoio depois da enchente, é ver que cada lugar tem a sua história. É bonito de ver o engajamento dos voluntários. Então, é uma construção coletiva — acrescenta Pax.
Neste sábado (13), era possível ver, na Avenida Luiz Guaranha e na esquina com a Baronesa do Gravataí, os 29 voluntários com as mãos nos pincéis, sprays e latas de tinta. Alguns estavam no alto de escadas pintando desenhos e tornando as paredes mais vivas. Os moradores auxiliavam e tinham a felicidade estampada no rosto. O objetivo era transformar a fachada de 32 casas.
Morador há 45 anos do Quilombo do Areal, Joel Osvaldo da Rosa conta que a inundação chegou até o telhado de sua casa. Ele precisou deixar a moradia e se abrigar na vizinha. Mas a água da cheia também chegou lá. Então, refugiou-se na sede de uma escola de samba na Avenida Ipiranga e depois ainda ficou um período na Vila Planetário.
— Esta é uma comunidade que todos ajudam o outro. Doaram o telhado novo para mim — aponta o morador, mencionando ainda que "fome não vou passar".
O casal de namorados Ernesto Lima e Thaynara Lima participava da ação. Os dois trabalhavam na fachada de uma casa, onde pintavam um rosto e a letra "M".
— A gente é grafiteiro há 12 anos. Vimos nas redes sociais que ia acontecer essa iniciativa e nos inscrevemos — relata Ernesto, explicando que a letra "M" representa a primeira sílaba do seu apelido (Moskito, com K mesmo).
A namorada produzia um rosto na pintura da parede.
Esta é uma comunidade que todos ajudam o outro
JOEL OSVALDO DA ROSA
Morador do Quilombo do Areal
— A água chegou até o teto da casa da minha mãe em São Leopoldo. A gente sofreu muito e queria fazer alguma coisa. Se todo mundo ajudar um pouquinho vai fazer a diferença — diz ela.
Perto dali, estavam empilhados instrumentos musicais de cor roxa do Bloco de Carnaval Areal do Futuro. As cores das tintas podiam ser vistas em diversos cantos da estreita via. O colorido já assumia forma antes mesmo de estar definitivamente pronto pelos artistas.
— A proposta do projeto é revitalizar as fachadas. Tirar essa marca d'água e retomar a autoestima dessas pessoas — explica a produtora cultural Kami Rosito.
Na primeira etapa do projeto, a meta é pintar 250 casas em diferentes locais de Porto Alegre. Na sequência, será revitalizada a fachada de uma escola do bairro Humaitá. Em seguida, ações serão realizadas no entorno do Centro Cultural Vila Flores, no Quarto Distrito; na Vila dos Papeleiros, e em Esteio e em Canoas, na Região Metropolitana.
Enquanto a reportagem de GZH acompanhava a ação deste sábado, um caminhão dos Correios carregado de doações, como colchões, acessou à Avenida Luiz Guaranha. Os itens foram distribuídos para a comunidade.
O Quilombo Areal Luiz Guaranha foi certificado no passado como remanescente de quilombo pela Fundação Cultural Palmares.
Como ajudar
Para quem quiser doar materiais de pintura, basta enviar um e-mail para paredescomproposito@gmail.com. Também é possível contribuir acessando aqui.
O projeto já conta com o apoio de parceiros como Tintas Renner, Pincéis Atlas, Vakinha, ONG Moradia e Cidadania RS, We Live Global e Lojas Pompéia.