Nova York – Ai Weiwei vive sua vida em público: ele posta sua revolta contra o governo chinês em um blog, transforma sua detenção em dioramas angustiantes e agora coloca no Instagram uma enxurrada de coisas sobre seu exílio em Berlim. Nos últimos dois anos, o artista-ativista mais famoso do mundo tem viajado para campos de refugiados da Grécia ao Iraque, e da Faixa de Gaza ao Mianmar, documentando o deslocamento de milhões e as fronteiras que essas pessoas estão desesperadas para cruzar. Outros podiam ter ficado atrás da câmera. Ai, agora ele próprio um refugiado, coloca-se na linha de frente.
A crise de refugiados no mundo é o tema de "Human Flow" (Fluxo Humano), novo filme de Ai Weiwei. Ele mostra a gigantesca incorporação de novas obras públicas na cidade de Nova York, indo do Harlem ao Flushing, e unidas sob o título de "Boas cercas fazem bons vizinhos". Deixe de lado o título plagiado de Robert Frost e admire o novo empreendimento, que consiste em esculturas novas em forma de barreiras de aço, centenas de banners presos a postes de luz com imagens de refugiados do passado e do presente e intervenções nos pontos de ônibus de cinco distritos.
Lembra se da década de 1990, quando vendiam que a globalização derrubaria todas as fronteiras neste século? Na realidade, a construção de cercas e muros internacionais cresce em todo o mundo para impedir a migração não autorizada. A Zona de Schengen, sem fronteiras da Europa, está ameaçada; a saída da Grã-Bretanha da União Europeia, através do Brexit, promete dividir a Irlanda mais uma vez e, se alguém conseguir fazer as coisas a seu modo, um "grande e lindo muro" pode ser levantado na fronteira entre o México e os Estados Unidos em breve. Ai Weiwei viu essas barreiras em primeira mão durante as filmagens de "Human Flow". Agora ele as trouxe para Nova York, onde se encaixaram com alarmante naturalidade.
Recentemente, vi uma grande parte das centenas de pequenos e grandes acréscimos que Ai fez em parques e ruas de Nova York. No Queens, ele rodeou a Unisphere – o símbolo de aço inoxidável da feira mundial de 1964 – com uma trama reticulada que se eleva até a altura do joelho. A "Cerca Circular" não pode ser atravessada, é uma fronteira intransponível. As redes macias e flexíveis, que podemos livremente tocar ou sentar em cima, podem trazer à mente pescadores ou artistas de trapézio, mais do que guardas e vigilantes.
Há uma tensão similar entre ameaça e proteção em uma série de cercas e barreiras erguidas no East Village e no Harlem. A fachada do edifício original da Cooper Union – onde Lincoln fez o discurso que o levou à Presidência em 1860 – foi adaptada com a instalação de cinco telas de alambrado que transformam o pórtico norte em um pátio de prisão. A boate burlesca Box, na Chrystie St., agora tem uma grelha de metal dupla no topo do prédio, como se para prevenir uma revolta. E quem passa pela 125ª Ave. vê barricadas de metal atrás de dois pontos de ônibus, curvando-se suavemente atrás dos painéis de vidro. Barreiras semelhantes foram erguidas em outro lugar no Harlem e atrás de pontos de ônibus no Brooklyn e no Bronx.
A mais forte das novas esculturas de Ai é "Gilded Cage" (Gaiola Dourada) com 7,3 metros de altura colocada na entrada sudeste do Central Park. Este elegante pavilhão silencioso e sinistro consiste em um anel interno, inacessível aos espectadores, cercado por centenas de suportes de aço arqueados que vão gradualmente aumentando. Uma pequena parte do anel interno foi cortada, assim você pode caminhar até o coração da pérgula ameaçadora. Olhe para cima de dentro da obra e a escultura de Ai se conclui em uma beleza abstrata; observe o anel central e você verá sua simetria interrompida pelas conhecidas catracas do metrô de Nova York, ou das passagens da fronteira entre o México e os Estados Unidos.
Em muitas das melhores esculturas de Ai, as formas repetidas são carregadas com conotações históricas ou políticas, no entanto, permanecem insensíveis – seja em "Template" (2007), na reunião de 1.001 portas de dinastia Ming e Qing, ou em "Straight" (2008-12), com o angustiante arranjo de barras de aço recuperado de edifícios destruídos pelo terremoto de Sichuan. "Gilded Cage" continua essa expressão, mesmo dependendo de metais pré-fabricados ao invés de materiais reutilizados. Como na escultura de Mona Hatoum ou Rachel Whiteread, este excelente trabalho novo usa o minimalismo para sacudir de maneira nada minimalista. Isso se estende para a pintura monocromática – um dourado lustroso que lembra o memorial de Augustus Saint-Gaudens, de William Tecumseh Sherman, assim como o metal meticulosamente polido no átrio da Trump Tower nas proximidades.
A contraparte da "Gilded Cage" é um arco ainda mais alto: 'Arch' ocupa quase todo o espaço por baixo do arco de mármore em Washington Square Park. Esta gaiola de aço mais simples, sem pintura, é perfurada por uma abertura espelhada; sua forma sugere duas figuras humanas grudadas. Elas podem parecer viajantes cansados para os transeuntes, já para os fãs de Marcel Duchamp, a referência é clara: as figuras remetem ao desenho de 1937 do artista franco-americano para a entrada da Galeria de Arte de Paris de André Breton. A invocação do mestre neste local tem um forte significado político, caso você conheça a história dos bastidores. Durante a Primeira Guerra Mundial, Duchamp e seus companheiros tomaram o arco da Washington Square e proclamaram uma República "independente" de Greenwich Village, que não era sujeita à legislação e às fronteiras do mundo exterior.
Comparada à "Gilded Cage", "Arch" usa suas convicções mais publicamente. Esta é uma grande ode pública à liberdade de movimento, unindo o primeiro presidente dos Estados Unidos (um dissidente) e um dos mais influentes dadaístas (um imigrante). O teste de sucesso de uma obra, contudo, não é o quanto a comunicação de uma única mensagem é fluente; o teste é o vigor que ela reflete, a desestabilização e a transformação do mundo em que se insere. Pelo padrão, "Gilded Cage" se destaca como a maior realização, envolvendo o dentro e o fora, o que guarda e o que fica cativo em uma única e sintética forma pública. "Arch," por outro lado, tem o risco de ser lembrada apenas como pano de fundo para selfies de narcisistas.
Fazendo a ponte de todas estas obras, há 200 banners em postes de luz retratando imigrantes e refugiados – alguns dos quais Ai fotografou no acampamento de refugiados de Shariya, no Iraque. Outros, ele gravou com o celular durante suas viagens para fazer "Human Flow" e usou ainda mais outras tantas imagens emprestadas de fontes históricas. (Entre a última categoria: Emma Goldman, pairando sobre a 7ª Ave.) Em vez de imprimir as imagens com tinta, a artista usou um cortador a laser para remover o espaço em branco de cada fotografia; cada banner, portanto, é um recorte negativo de um refugiado e o céu e a cidade são visíveis através de seus rostos.
Uma das grandes surpresas deste clamor na cidade artística são as obstruções de Ai – "quase-arte, mas talvez, talvez não seja", ele disse ao New York Times – não perturbe a cidade demais, mas conecte o tecido urbano com uma facilidade que perturba.
Passageiros que esperam o ônibus na 125ª Ave. atrás das barricadas de Ai Weiwei continuaram suas viagens. Turistas no Corona Park tiraram selfies com enquadramento no cercado. No Cooper Union e na Washington Square, barreiras metálicas do departamento de polícia de Nova York ecoaram as obras do próprio artista. Ao sul da "Gilded Cage", compradores na 5a Ave. passavam por obstáculos de concreto reais ao redor da torre do presidente. As obras de Ai espalhadas pela cidade são como uma centena de sinos silenciados que soam um alarme ensurdecedor: aceitamos tantos limites físicos e políticos que os novos limites passam despercebidos e talvez não protestemos contra o encolhimento de nossas liberdades até que seja tarde demais.
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"Boas cercas fazem bons vizinhos" fica pela cidade até o dia 11 de fevereiro em mais de 300 locais em toda Nova York. Os locais das instalações estão listados em publicartfund.org.
Por Jason Farago