Paulo C. Amaral
Diretor-geral do Margs e diretor artístico da Secretaria de Estado da Cultura, Turismo, Esporte e Lazer
A propósito do texto de Jorge Barcellos sobre a Noite dos Museus publicado em ZH, não podemos deixar de fazer algumas considerações. O autor está certo ao observar a má conservação de equipamentos culturais, em particular os museus mencionados em seu texto. Vamos encontrar as causas de seu deterioro no longo processo de descaso de sucessivos governos relativamente à falta de uma política de manutenção continuada, de tal sorte que deveria tornar-se tal incúria uma chaga de Estado. A questão que devemos colocar agora é outra: o que podemos fazer para reverter este quadro?
É certo que um evento como a Noite dos Museus não traz o remédio. Mas é também certo que pode fazer despertar curiosidade por essas entidades, valorizando-as em alguma extensão e apontando indiretamente para a ideia da necessidade de sua volta a condições dignas. A propósito dos museus Júlio de Castilhos e Hipólito José da Costa, mencionados pelo autor como pacientes moribundos (e isso seria uma quase verdade se nenhuma ação restauradora estivesse em curso), já estão contemplados no PAC das Cidades Históricas, programa que promoverá sua ampla recuperação. Agora, de sua inclusão no PAC à efetiva execução das obras de restauro, decorrerá longo tempo, e este sim é o grande problema que sói acontecer com as coisas de governo, legalmente atreladas a regras fiscalizadoras extremamente rígidas no decorrer do processo licitatório e, depois, ao longo da execução da obra até sua efetiva conclusão. E este último argumento – o da demora nas ações de governo – não deixa de suscitar outro, criticado pelo autor, que diz respeito ao que se poderia imaginar como uma intromissão do capital privado na vida dos equipamentos culturais públicos. É bom lembrar, apenas a título ilustrativo, que foi o capital privado que possibilitou a ampla reforma do antigo prédio dos Correios (atual Memorial do RS). E foi aquela uma obra rápida que, tivesse estado sob a responsabilidade única do governo de então, sabe-se lá quando – e se – teria sido concluída.
Museus no mundo inteiro apoiam-se no capital privado direta ou indiretamente. Chegam a manter totens internos com indicações de seus mecenas, que se envaidecem em ler seus nomes naqueles murais nas cores ouro, prata ou bronze, segundo o valor de suas contribuições. Qual o problema, desde que façam as suas doações e não se intrometam nas gestões? Associações de Amigos (fórmula de sucesso internacionalmente adotada) igualmente apoiam os museus por meio de pessoas físicas ou jurídicas, o que as insere no mesmo balaio do capital privado. Museus importantes não funcionam sem o capital privado, nem mesmo os públicos. Tampouco seria correto afirmar que durante a Noite dos Museus os locais e suas obras expostas serviram apenas como acessórios, sendo os shows musicais os verdadeiros espetáculos. Estes foram, isso sim, atração do projeto e, com efeito, trouxeram grande público aos espaços. Vimos centenas de pessoas percorrendo as salas do Margs, detendo-se em observação à frente de um ou outro quadro, às vezes em grupos, e queremos crer que muitas delas jamais tinham tido acesso ao museu. Outras simplesmente preferiram assistir aos shows. Não era hora propícia para se fruir arte? Não, claro que não era. Persiste certa liturgia ao se visitar museus. Mas as pessoas aprenderam muito com a experiência. Algumas, até ingenuamente, nos perguntam: "Por que não fazem uma Noite dos Museus a cada mês?".
Quanto à face "moderna" do monitoramento em museus, smartphones aparecem como inescapável ferramenta tecnológica e em pleno uso, e as gravações de áudio, disponíveis em fones de ouvido, já eram comuns na Europa dos anos 1980. Hoje, já obsoletas, caminham para o desaparecimento desde a criação do código QR. Claro que nada disso dispensa o monitoramento direto a estudantes e visitantes, sempre que necessário, pois nem todos têm acesso a smartphones. Monitoramentos agendados têm sido forte tradição em nossos museus e funcionam muito bem.
Sobre a Noite dos Museus, pode-se dizer que quase todos gostaram dela.