O episódio que deflagra o surgimento da Califórnia da Canção Nativa é largamente conhecido, pelo menos entre aqueles que estiveram ou ainda estão imersos no ambiente dos festivais. No livro Califórnia da Canção Nativa – Marco de mudanças na cultura gaúcha, organizado por Colmar Duarte e José Édil de Lima Alves, há um artigo assinado por Cícero Galeno Lopes que, em sua introdução, situa:
"Na cidade de Uruguaiana, uma emissora de rádio AM resolveu promover festival de música popular. Vários grupos participaram dele, entre os quais o Grupo de Arte Nativa Marupiaras. Por não ter se classificado, o grupo quis saber o motivo da desclassificação. Soube, então, que a peça que defendera era regionalista, gauchesca, como se costuma dizer inadvertidamente, como se também se falasse em arte brasileiresca. Esse foi o ovo."
Desta forma sucinta, pode ser descrito o nascimento do original festival que acabou por gerar um movimento que está incrustado na cultura sul-rio-grandense nas últimas quase cinco décadas.
A Califórnia surge da inconformidade de alguns jovens artistas diante de uma desclassificação gerada não por apreciações estéticas e sim por uma postura de não reconhecimento de uma pretensa identidade. O que provocou a indignação dos alijados daquele 1o Festival da Música Popular da Fronteira promovido pela rádio São Miguel não foi algo ligado à qualidade da canção apresentada – a milonga Abichornado, de autoria de Colmar Duarte e de Júlio Machado da Silva – mas sim a justificativa de que a desclassificação fora motivada por se tratar de uma canção regional gaúcha.
Os organizadores do evento por certo jamais poderiam suspeitar o tamanho do vespeiro que estavam cutucando. A madrugada que sucedeu ao festival foi embalada por serenatas, dedicadas pelos descontentes, a cada um dos integrantes da comissão julgadora que havia perpetrado o "tendencioso" veredicto. A Califórnia e suas origens. Nos próximos textos voltarei ao tema, relembrando as canções vencedoras.