Nunca entendi o suicídio. Nunca me pareceu o melhor a fazer. Torquato Neto deixou um bilhete: "Cansei". Ana Cristina César voou pela janela. Sylvia Plath pôs a cabeça no forno. De jeitos diferentes, Florbela Espanca, Sarah Kane e tantos outros desistiram de encarar, perseverantemente, a insondável vida que nos cabe.
Essas pessoas extraordinárias me vieram à memória, todas de uma vez, lendo a reedição de Breves entrevistas com homens hediondos, de David Foster Wallace, outro que escolheu o mesmo caminho. Wallace é obrigatório. Seu Graça infinita tem a mesma importância de Ulisses, do Joyce, e Grande sertão: veredas, do Rosa.
Alguns amigos próximos também se suicidaram. Não eram famosos como os acima citados. Mas fiquei muito mal, perdi o chão e me enchi de uma culpa meio absurda. Chorei sem aceitar. Furioso e impotente, exigi deles uma última conversa, a chance de fazê-los mudar de ideia, qualquer explicação que acalmasse meu coração disparado. Em vão.
Camus escreveu que o suicídio era o nosso único problema real. Nunca acreditei nisso. Mas a radicalidade de um gesto assim encerra todas as negociações e diálogos possíveis. Resta, intacto, o amor por quem decidiu partir desse jeito. E uma dor que, adormecida como a Bela Adormecida, vai se apaziguando com o tempo – bem guardada e permanentemente viva.
Se você nunca leu Wallace, acredite: deveria. Comece por essas breves entrevistas. É um grande livro, cruel e corajoso, por vezes machista, debruçado sobre os pequenos e insolúveis transtornos de todos nós, seres humanos, ante nossas baixezas e grandezas cotidianas. Por que são sempre os melhores que não aguentam o tranco? Por isso mesmo?
Elis cantou que "a barra da morte é que ela não tem meio termo"; Gal gritava que "é preciso estar atento e forte, não temos tempo de temer a morte". Cida Moreira, que semana que vem abrirá o 23º Porto Alegre Em Cena, canta a rascante urgência da vida em todas suas contradições viscerais.
Estou com Cida e não abro.