A Polícia Federal deflagrou nesta terça-feira (28) a Operação Boca Livre, que desarticulou um esquema de desvios da Lei Rouanet. Um grupo criminoso que atuava desde 2001 conseguiu aprovação de R$ 180 milhões em projetos fraudulentos.
Além de projetos que deixaram de ser executados, a PF descobriu que os suspeitos usaram o dinheiro para fazer shows com artistas famosos em festas privadas para empresas e até uma festa de casamento, que teve a presença de um cantor sertanejo.
Lei Rouanet
A Lei Rouanet, assim nomeada em menção ao então secretário nacional de Cultura, Sérgio Rouanet, instituiu políticas públicas de incentivo da produção cultural e ao acesso à cultura. A norma foi sancionada em 23 dezembro de 1991 pelo ex-presidente Fernando Collor.
No artigo 2º da Lei Rouanet, já fica flagrante o desrespeito à legislação por parte do grupo desmantelado hoje pela PF. O texto deixa bem claro que os incentivos somente serão concedidos a projetos que sejam abertos a qualquer pessoa se forem gratuitos, e ao público pagante, se for cobrado ingresso. Portanto, festas privadas como um casamento, por exemplo, não são contempladas pela Lei Rouanet.
Como funciona o incentivo?
A Lei Rouanet funciona da seguinte maneira: interessados em receber apoio financeiro para projetos culturais devem inscrevê-los no Ministério da Cultura (MinC).
As propostas são analisadas pela Comissão Nacional de Incentivo à Cultura (CNIC), composta por 21 integrantes, sendo representantes de artistas, empresários e sociedade civil de todas as regiões do Brasil.
A CNIC tem 11 reuniões ordinárias marcadas para 2016. Seis delas ocorrem em Brasília e cinco são itinerantes, pelo país. A próxima será no início de julho e a cidade onde irá ocorrer ainda não foi definida. Os encontros são transmitidos pela internet, e a agenda pode ser conferida no site do MinC.
Após a aprovação, os titulares dos projetos podem captar doações ou patrocínios tanto de pessoas físicas, quanto de jurídicas. Essas poderão abater os valores incentivados do Imposto de Renda.
Os recursos não saem dos cofres públicos diretamente. O que acontece é que o governo renuncia aos valores que receberia em impostos.
Quais os critérios para aprovar um projeto?
O Ministério da Cultura alega que a análise dos projetos culturais é técnica e os custos devem ser detalhados, apresentados item a item.
Na análise da proposta, os valores são verificados e devem atender à realidade do mercado para serem aprovados. Caso a soma dos custos não for considerada adequada, pode ser corrigida pelo Ministério da Cultura.
Quanto é possível deduzir?
Os projetos culturais aprovados podem ser enquadrados no artigo 18 ou artigo 26 da Lei Rouanet. Quando é enquadrado no artigo 18, o incentivador poderá deduzir 100% do valor aplicado, até o limite de 4% do imposto devido para pessoa jurídica e 6% para pessoa física.
Quando é enquadrado no artigo 26, a pessoa física pode deduzir no imposto de renda o percentual equivalente a 60% (no caso de patrocínio) ou 80% (no caso de doação). Já as pessoas jurídicas podem deduzir 30% no caso de patrocínio ou 40% no caso de doação.
A dedução acontece no Imposto de Renda do ano seguinte.
A Lei Rouanet define o enquadramento com base em segmentos culturais. São enquadrados no Artigo 18 os setores abaixo listados:
a) artes cênicas;
b) livros de valor artístico, literário ou humanístico;
c) música erudita ou instrumental;
d) exposições de artes visuais;
e) doações de acervos para bibliotecas públicas, museus, arquivos públicos e cinematecas, bem como treinamento de pessoal e aquisição de equipamentos para a manutenção desses acervos;
f) produção de obras cinematográficas e videofonográficas de curta e média metragem e preservação e difusão do acervo audiovisual;
g) preservação do patrimônio cultural material e imaterial;
h) construção e manutenção de salas de cinema e teatro, que poderão funcionar também como centros culturais comunitários, em municípios com menos de cem mil habitantes.
Tudo que não estiver previsto na lista se enquadra no Artigo 26.
Quem pode ser beneficiado?
Podem receber incentivos por meio da Lei Rouanet projetos de pessoas físicas que atuam na área cultural, como artistas e produtores culturais, pessoas jurídicas públicas de natureza cultural da administração indireta, como autarquias e fundações culturais, e pessoas jurídicas privadas de natureza cultural, com ou sem fins lucrativos, como empresas e ONGs, por exemplo.
A aprovação do Ministério da Cultura não significa que o projeto receberá apoio financeiro. A lei estabelece prazo de um ano para captação, que pode ser renovado por seis meses.
Consulta a projetos
Os projetos culturais inscritos para receber incentivo por meio da Lei Rouanet podem ser consultados na internet. A lista mostra aqueles que já tiveram parecer favorável e os rejeitados. É possível ler a síntese do projeto, com os seus objetivos, conhecer o proponente, a origem, o segmento cultural, o período de execução, o valor solicitado e o valor aprovado.
Maiores incentivadores
No Brasil, os maiores incentivadores da cultura por meio da Lei Rouanet em 2015 foram, na ordem, o BNDES, Banco do Brasil, Bradesco Vida e Previdência, Itaú e Cielo.
No Rio Grande do Sul, são as Lojas Renner, Companhia Zaffari, Banrisul, BRDE e Klabin.