“Não é vergonha esquecer: é da nossa natureza, assim como é da nossa natureza envelhecer e morrer. Olhada de longe, a vida começa a perder sua particularidade. Todos os naufrágios se tornam o mesmo naufrágio", diz J.M. Coetzee em Foe, novela de 1986 agora relançada, na qual o autor reinventa, com sua maestria usual, a história de Robinson Crusoé.
Exatos 30 anos depois, Vladimir Safatle afirma que "o Brasil é um país no qual o passado nunca passa". As reflexões de Coetzee e Safatle, por complementaridade, expandem-se em várias direções. A história de nosso país é assombrada pelo peso de suas eternas repetições. Conservamos nossas contradições sem verdadeiramente resolvê-las. Tudo muda para permanecer exatamente igual. A estapafúrdia reunião da Cultura com a Educação em ministério único é retrocesso lamentável. O eterno retorno de Prometeu.
O Brasil dói. Mas lembro e acredito em Caetano: "Vejo uma trilha clara para o meu Brasil, apesar da dor". Coragem grande é poder dizer sim. O Brasil precisa de um sim urgente, do sim de todos nós. Vertigem visionária?
Como Torquato Neto, minha assumida inspiração, gosto de repartir o que tem mérito, inquietação e valor. Arte na vida. A arte desequilibra certezas e instiga indivíduos, gerações, países. Roberto Carlos e John Cage, James Joyce e Túlio Millmann, Cláudia Tajes e Beckett: tudo tanto. O sal da terra.
Não se assuste com o tamanho. Oitocentas páginas de prazer absoluto. Uma Vida Pequena, de Hanya Yanagihara, merece cada um dos hiperbólicos elogios com que a crítica americana o recebeu. Finalista do Man Booker Prize, sua leitura é bem-vinda como um copo d'água bebido em dia de verão.
A Entrega, de Dennis Lehane, é uma aula de excelência e concisão. Menos e mais. O autor de Sobre Meninos e Lobos mostra, a cada novo lançamento, talento demolidor.
Livros trazem satisfação garantida. A vida e seus acontecimentos absurdos ganham um pouco mais de sentido. E não tem sentido se privar de tamanho prazer.