O que viria depois de Afrociberdelia? Lançado em 1996, o segundo disco de Chico Science & Nação Zumbi ajudou a projetar nacionalmente a cena manguebeat, que já movimentava Recife há alguns anos. Foi também o último trabalho de Chico Science à frente do grupo. Um acidente de trânsito, meses depois do lançamento, interrompeu prematuramente a vida de uma das mais reveladoras surpresas da música brasileira naquela década. Por isso, de certo modo, Afrociberdelia é seu testamento: um disco que se tornou marco ao unira cultura regional à ainda incipiente tecnologia dos computadores e da internet. Para celebrar os 20 anos dessa história, a Nação Zumbi está circulando o Brasil com um show em que toca todas as músicas do disco– e que nesta quinta chega ao Opinião.
Se no álbum de estreia, Da Lama ao Caos (1994), a Nação apresentou a estética do mangue com alfaias e tambores, somada ao funk rock e à psicodelia, foi em seu sucessor, Afrociberdelia, que a banda dedicou-se com mais força a transportar “o peso e a vibração do palco” para o estúdio, como afirma Eduardo BiD, produtor do disco. Um dos percussionistas do grupo naquele momento e vocalista desde a morte de Science,Jorge Du Peixe lembra que o caldo de influências de Afrociberdelia ia do simples ao sofisticado, mas sempre com um denominador comum: a batida.
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– Estávamos ouvindo muito hip hop, drum ’n’ bass,música eletrônica, soul, dub, ska, música jamaicana.Tudo o que remetia a batidas. Aí, pensamos: “Por que não fazer uso das nossas batidas em vez das batidas americanas?”. A ideia não foi distorcer as tradições,mas louvá-las em uma perspectiva nossa – lembra.
O nome do disco, portanto, é significativo: o “afro” remete à diáspora africana e suas influências nas raízes do povo brasileiro, enquanto o “delia” lembra a psicodelia e as guitarras do rock. Fica por conta do“ciber” a remissão à tecnologia vislumbrada naquele 1996. Chico Science estava fascinado pelos computadores grandalhões da década de 1990 e pela ainda engatinhante internet, que abria possibilidades inimagináveis a quem fazia e pesquisava música.
– Nosso empresário tinha comprado um computador.Começamos a navegar e ficamos famintos paraver aonde aquela janela ia nos levar – lembra Du Peixe.
Com a perda de Science, a Nação Zumbi soube se reinventar e seguiu fazendo um dos trabalhos mais relevantes da música nacional. Mas, no show de hoje, Du Peixe e seus companheiros voltarão à época em que os computadores eram maiores, e a velocidade da internet, bem menor.
O que Afrociberdelia representa para a música 20 anos depois?
"É um marco histórico e cultural importantíssimo. É o Brasil gritando, sussurrando e cantando toda a sua originalidade. Tem tudo ali, é o povo brasileiro em sua máxima aparição. Chico Science e sua obra são a segunda abolição da escravatura."
Jorge Mautner, músico e compositor de Maracatu Atômico
"Nossa intenção era levar o peso e a vibração do palco para o estúdio. Ouço o disco e sinto arrepios de corpo inteiro. E, ao mesmo tempo, gratidão. Por que eu? Como eu cruzei o caminho do Chico Science?"
Eduardo BiD, produtor do disco
"Nação Zumbi é uma das coisas mais importantes que já aconteceram com o Brasil. A liberdade e o conceito de ser brasileiro e universal, de olhar para sua própria terra e para o mundo, isso é o mais importante."
Carlos Eduardo Miranda, produtor musical
Nação Zumbi
Quinta-feira, às 22h30min.
Opinião (José do Patrocínio, 834), em Porto Alegre.
Ingressos: R$ 90 (inteira) e R$ 50 (promocional, mediante doação de 1kg de alimento), à venda nas lojas Youcom dos shoppings Bourbon Wallig (sem taxa de conveniência), Praia de Belas, Bourbon Ipiranga, Barra Shopping Sul e Bourbon Novo Hamburgo e lojas Multisom Andradas 1001, Canoas Shopping e Bourbon São Leopoldo e www.minhaentrada.com.br (sujeito a taxa de conveniência).
O show: Nação Zumbi toca na íntegra o álbum Afrociberdelia, lançado em 1996, quando a banda ainda tinha Chico Science nos vocais. O disco tem músicas conhecidas como Maracatu Atômico e Manguetown.