Irá a leilão nesta terça-feira um piano avaliado em R$ 1,5 milhão, adquirido pela prefeitura de Uruguaiana em 2012 e que jamais saiu da caixa. Em reportagem publicada no sábado, no 2º Caderno, o atual prefeito da cidade, Luiz Augusto Schneider, justificou a venda dizendo que o instrumento “está totalmente fora de nossa realidade”. A afirmação causou a reação de ex-prefeito Sanchotene Felice, que ocupava o cargo quando o Steinway & Sons foi importado da Alemanha por cerca de US$ 200 mil, com isenção de taxas:
– Foi ousado, mas absolutamente adequado a um investimento concentrado na cultura, já que Uruguaiana foi um município, no começo do século passado, com grandes concertistas que vinham de Buenos Aires e passavam por ali. Era uma cidade culturalmente avançada – afirma Felice, que sonhava ver o instrumento usado no palco do Teatro Rosalina Pandolfo Lisboa, construído em sua gestão no espaço do antigo Cine Pampa.
Considerado por muitos como o melhor piano do mundo, o modelo Gran Concerto, D-274 é avaliado hoje em R$ 1,5 milhão – e deverá ser leiloado nesta terça-feira por um terço do seu preço de mercado. O ex-prefeito admite que seu plano foi ousado, mas afirma que faz jus ao passado da cidade.Técnico da Steinway & Sons no sul do Brasil, Person Losekan afirma que poucas são as prefeituras com pianos comparáveis ao de Uruguaiana. No interior do Estado, Caxias do Sul é a cidade que mais se destaca no quesito, com um modelo de cauda inteira da brasileira Essenfelder, adquirido nos anos 1980 por cerca de R$ 90 mil, ao lado de Santa Maria, que possui um Stenway mais modesto, de meia cauda. Já na Capital, modelos de qualidade semelhante ao de Uruguaiana podem ser vistos no Theatro São Pedro, no Instituto Cultural Brasileiro Norte-Americano, em universidades como UFRGS e PUCRS e na Ospa. Além disso, dois exemplares idênticos foram inutilizados no alagamento do Teatro do Sesi, em decorrência do rompimento de um dique, em 2013.
– Um instrumento como esse também tem custos de manutenção que somam cerca de R$ 12 mil por ano. Se fossem feitos até dois concertos anuais, valeria mais a pena alugar um piano de 3/4 de cauda – avalia Person.
A atual administração do município pretende levar o polêmico instrumento a leilão nesta terça-feira, às 16h, com lance inicial de R$ 500 mil. O objetivo é disponibilizar recursos ao Hospital Santa Casa de Caridade de Uruguaiana.Uma lei sancionada pelo prefeito Luiz Augusto Schneider, em 15 de setembro passado, considerou “o piano, para todos os fins, como bem inservível ao município, por se tornar inviável a sua efetiva utilização, haja vista a inexistência de ambiente específico, ideal e adequado para sua instalação, conservação e manutenção”.
Sanchotene Felice, que chegou a responder um processo por improbidade administrativa devido à compra do instrumento, discorda:
– O parecer final do meu processo foi a favor do piano. A cidade tem um espaço adequado. O Teatro Rosalina Pandolfo é um dos cinco melhores do sul do país.O leiloeiro Marcos Quadros confirma que o piano está na mesma embalagem que chegou, vindo de Hamburgo:
– Não posso determinar qual a situação interna do instrumento.Para Person, é possível que alguns componentes tenham se danificado enquanto o piano esteve parado, mas haverá interessados em arrematá-lo.
– Acredito que será muito difícil vendê-lo para o Rio Grande do Sul, mas instituições do Rio e de São Paulo poderão se interessar em adquirir um instrumento como esse por um terço de seu preço.