Com o auditório Barbosa Lessa da CCCEV lotado, a psicanalista Maria Rita Kehl falou sobre a relação entre conformismo e violência na sociedade brasileira nesta quinta-feira. A paulista esteve na Capital para um bate-papo na Feira do Livro, promovida em parceria com Associação Psicanalítica de Porto Alegre (APPOA).
Diante de quase 200 pessoas, Maria Rita defendeu que o conformismo, apesar de ligado pelo senso comum ao apaziguamento, pode estar na origem cotidiano violento do Brasil. Ela elencou diferentes momentos da história do país que foram superadas sem conflito, mas que tiveram consequências perversas. O fim da escravidão como modo de produção e a proclamação da República teriam ocorrido "não com um estrondo, mas com um suspiro", disse ela, citando um verso de T. S. Eliot.
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- Como previa Joaquim Nabuco, a escravidão perverteu a sociedade brasileira, que até hoje se acha digna de privilégios que nem ao menos lutou para conquistar - afirmou.
Ela também citou Sérgio Buarque de Holanda, que falava do "homem cordial" como modo de ser do brasileiro:
- O cordial é aquele que cede diante do opressor, do dominador. É o modo de dominação empregado pela elite brasileira para explorar o outro sem gerar revolta.
Como exemplo, falou de um garçom com o qual conversou em um restaurante no carnaval de Salvador. No estabelecimento, os trabalhadores dormiam em um banco, sem voltar para casa, e não ganhavam hora-extra. No entanto, o funcionário considerava seu patrão muito bom, pois lhe dava presentes de Natal e ajudou em momentos como o parto dos filhos.
- Era explorado até o osso, mas se conformava com isso - concluiu ela.
A psicanalista, que participou da Comissão Nacional da Verdade (CNV), afirmou que a falta de punição mais contundente para a violência de Estado deixou marcas na nossa sociedade.
- Foi uma ditadura com uma violência de Estado criminosa. O Brasil ainda tem 145 desaparecidos políticos. Foi algo que terminou sem conflito, mas muitos opressores seguem impunes.