Assista a trecho de Pequenas Violências:
Escolhida como a madrinha do 22º Porto Alegre Em Cena, deferência concedida anualmente a uma personalidade que contribui com as artes cênicas na cidade, a atriz e diretora Adriane Mottola descreve, bem-humorada, que receber o título é "assustador":
- Eu disse para o Luciano (Alabarse, coordenador-geral do festival): "Quando essas coisas acontecem, significa que a gente está ficando velha (risos).
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Com mais de 30 anos de carreira, Adriane tem uma trajetória que se confunde com a da Cia. Stravaganza, que ela criou, em 1988, ao lado de Luiz Henrique Palese e Cacá Corrêa (mortos em 2003 e 2010, respectivamente). Cria da efervescência cultural do Bom Fim, ela estreou no teatro profissional em Guernica, de Fernando Arrabal, contracenando com o diretor João Carlos Castanha, que será homenageado no Em Cena no próximo dia 15. Depois, entre outros trabalhos, Adriane participou de espetáculos do grupo Balaio de Gatos, foi dirigida por Alabarse e esteve no Teatro Vivo, com a diretora Irene Brietzke.
- Antes, eu era apenas convidada dos grupos. Eles ficavam pintando cenário de madrugada, e eu não. Mas com a Irene tinha essa coisa do "Vamos fazer juntos". Isso me tocou profundamente - diz ela.
O primeiro espetáculo do núcleo que criaria a Cia. Stravaganza foi Shandar e o Feitiço de Mungo (1988), mas o nome do grupo surgiu apenas dois anos depois. O foco era o teatro infantil, por meio de montagens que subvertiam os estereótipos do gênero, com influência do nonsense do Monty Python.
Por um Punhado de Jujubas (1990) foi um dos espetáculos mais bem-sucedidos e duradouros, como recorda a artista:
- Nasceu da inteligência do Palese e do Cacá, pessoas reunidas falando bobagem. A gente fazia trabalhos com muitas referências. Jujubas era como Shrek.
Produção que marcou época foi Decameron (1993), releitura do clássico de Boccaccio voltada ao público adulto que era falada em italiano. Elogiada pela crítica Barbara Heliodora, a peça teve uma trajetória bem-sucedida no Rio e em São Paulo.
- A gente queria um teatro mais físico, em que as coisas fossem compreendidas pela ação, e não pelo texto. A obra fazia referência à peste bubônica, e na época da estreia da peça havia o susto da aids. O espetáculo era um louvor à vida, e isso tocou muito as pessoas - lembra Adriana.
Hoje, a Stravaganza segue como uma das mais relevantes companhias em atividade na cidade, abrindo-se a outros diretores e dramaturgos em trabalhos elogiados como Estremeço (2012) e Pequenas Violências - Silenciosas e Cotidianas (2013). Será que Adriane consolidou um estilo de direção? Ela acredita que sim, embora não tenha certeza se os espectadores conseguem identificá-lo:
- Procuramos uma comunicação direta com a plateia. Não tem como não olhar para o teu público hoje. Acho que estamos procurando uma linguagem mais contemporânea, uma coisa de falar sobre o mundo de hoje.
Espetáculos inesquecíveis, segundo Adriane
Por um Punhado de Jujubas (1990)
"Escolhi esse pela resposta que teve (do público). Fizemos o que havia de mais sincero em nós, sem qualquer pretensão, só querendo ser original. Éramos apaixonados pelo Monty Python, e a nossa vida era assim, sarcástica. Éramos crítico, corrosivos, gozávamos de tudo."
Decameron (1993)
"O Antunes (Filho) estava fazendo o espetáculo Nova Velha História (de 1991), uma versão de A Chapeuzinho Vermelho em que usava uma língua imaginária. Queríamos fazer uma adaptação de algo conhecido. Certa vez, eu disse ao Palese: Por que não Decameron?. E ele: Em italiano!."
Bebê Bum (1999)
"Gosto muito desse espetáculo pelo tamanho da pesquisa que a gente fez no universo do clown. Foi a soma de todas as nossas pesquisas com máscaras."
Como Vivem os Mortos? (2001)
"Foi o último espetáculo do Palese, em que dirigiu a si mesmo. Era a história de um cara considerado morto que passou 19 anos tentando mostrar que estava vivo. Era a respeito de como o mundo tenta fingir que a gente não existe."
Estremeço (2012)
"Trabalho difícil (risos) e, portanto, muito desafiador para todos nós como grupo. Tivemos uma série de conflitos de pessoas querendo coisas diferentes. Tinha muitos monólogos, muitos atores. Mas o resultado foi surpreendente."
Pequenas Violências - Silenciosas e Cotidianas (2013)
"Foi um sonho. É tudo o que a gente quer: que cada um tenha seu projeto e que, dentro do grupo, possam nascer muitas propostas diferentes. Se eu não estiver mais aqui, eles (os demais integrantes) estarão fazendo."