O Porto Alegre Em Cena que o público não vê também conta com boas histórias: desde a cantora que perdeu a voz antes de entrar no palco a cenários perdidos na Cordilheira do Andes. Em mais de duas décadas, o festival acumula enredos de bastidores que misturam drama, comédia e aventura.
- Depois que as coisas passam, a gente ri. Mas na hora, às vezes, é desesperador - diz Luciano Alabarse, diretor e idealizador do festival.
Neste ano, pelo menos duas tramas tensas tomaram conta das coxias dos teatros durante o evento. Tanto o belga Attends, Attends, Attends quanto o espetáculo de Meredith Monk tiveram as sessões ameaçadas de cancelamento.
- Foi uma corrida contra o tempo para encontrar soluções. E o público nem fica sabendo - conta Fernando Zugno, diretor de produção do Em Cena.
Para conhecer as histórias de bastidores do festival, conversamos com Alabarse e Zugno e, ainda, com a produtora Vika Schabbach e a jornalista Bebê Baumgarten, que também integram a equipe do evento. Confira a seguir.
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E A VOZ?
Um fato inesperado colocou em risco a apresentação de abertura do Em Cena neste ano. Uma das integrantes do espetáculo de Meredith Monk simplesmente acordou sem voz no dia da estreia. Como a base do show está na potencialidade vocal, Katie Geissinger era essencial para o grupo subir ao palco. Ainda pela manhã, a artista avisou a equipe do Em Cena de que precisava da ajuda de um médico. Foi levada a um hospital na manhã do show. Tomou algumas injeções e, em poucas horas, a voz voltou. As sessões, lotadas, transcorreram de forma impecável.
CARGAS PERDIDAS
Quando o cenário não é montado em Porto Alegre, todos os materiais vêm, geralmente, de caminhão ou navio. Mas a viagem até o festival nem sempre é fácil. Em 1997, um caminhão que vinha do Chile com a carga do espetáculo Manes, do grupo catalão La Fura dels Baus, perdeu-se próximo à Cordilheira dos Andes. Para encontrá-lo, até um helicóptero foi contratado pela equipe do Em Cena - o que revelou-se fundamental para solucionar o problema. Pelo mar, a história se repetiu. Em 2008, o navio que levava cenários e figurinos de Fausto, com direção do lituano Eimuntas Nekrosius, atracou no porto errado - em Buenos Aires, e não em Rio Grande. Até descobrir onde estava a carga, a equipe do Em Cena e o elenco do espetáculo - que já estava em Porto Alegre - viveram momentos de pânico. No fim, tudo chegou, mas com atraso, e as sessões tiveram de ser remarcadas.
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REJEIÇÃO E QUASE PROCESSO
Uma das peças mais rejeitadas pelo público na história do Em Cena quase virou caso judicial fora dos palcos. Em 1999, o grupo Socìetas Raffaello Sanzio apresentou Orestea, com a participação de pessoas com deficiência e animais. Havia bichos como macacos, mulas e cavalos, e também alguns animais mortos na história. A participação deles desagradou a dois advogados ligados a entidades protetoras dos animais, que queriam processar e prender Luciano Alabarse. Ele precisou convencer os acusadores de que os bichos não estavam sendo maltratados.Além disso, houve outro fato inesperado: a mula empacou em cena, determinando que a apresentação fosse interrompida para o elenco tirar o animal do palco antes de dar continuidade à peça.
CORRERIA CENOGRÁFICA
A cenografia deve ser finalizada até o último ensaio antes da estreia, mas, às vezes, acontecem imprevistos. Neste ano, o espetáculo Attends, Attends, Attends
, do diretor belga Jan Fabre, precisava de uma máquina de fumaça. O equipamento solicitado pelo grupo não foi encontrado no Brasil, mas a equipe gaúcha conseguiu uma ferramenta semelhante. No ensaio, um dia antes da primeira sessão, surpresa: quem estava nas primeiras filas da plateia ficou com falta de ar por causa da fumaça. A solução foi construir, durante a madrugada anterior à estreia, uma máquina caseira que eliminasse o problema. E o aparelho de improviso deu certo. Já em 2012, outros objetos cenográficos tiraram o sono da equipe do Em Cena. O espetáculo Mãe Coragem e Seus Filhos, do grupo Berliner Ensemble, usava armamentos antigos em cena. As armas produzidas em Porto Alegre e aprovadas previamente pelos alemães acabaram vetadas de última hora - o que obrigou os produtores locais a fazerem uma maratona em antiquários para substituí-las.
ROLÊ NA CIDADE
Se o cenário não fica pronto a tempo, é preciso improvisar - nem que isso signifique despistar o elenco da peça. Em 2010, os atores do espetáculo lituano O Idiota já estavam na Capital, mas a cenografia ainda não havia sido finalizada: a equipe do Em Cena precisava de uma hora além do tempo combinado. Resultado: o responsável por auxiliar o grupo na estadia em Porto Alegre precisou "enrolar" os atores, transformando um deslocamento que seria rápido em um longo passeio pelas ruas da cidade. "Passa pela orla do Guaíba! Leva na frente dos estádios!", aconselhavam os produtores do Em Cena, por telefone, aos responsáveis pelo transporte. E os lituanos nem desconfiaram.
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