Esta é uma história igual às outras, só que diferente. "Eis que eis" o Rudimar Ariel Montezuma, a quem os mais chegados chamam Don Rudy. Quando saltou no mundo, seu pai virava piruetas no trapézio. Rudy começou como equilibrista. Resvalou e o fio cortou sua vocação. Deu um grito tão alto que despertou um leão em vésperas de aposentadoria compulsória. Vendeu maçã do amor e algodão-doce.
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Obeso, tentou ser mágico. As pombas morriam asfixiadas em sua manga. Empresário de espetáculos, dizia seu cartão de visitas. Sua sede, uma mansão sintética no 22º andar da Galeria do Rosário. Tão exíguo o espaço que os candidatos se espremiam pelos corredores. Era uma tórrida tarde de sexta-feira. O milho virava pipoca no papo das galinhas.
Don Rudy já atendera 27 pretendentes ao showbiz dos arrabaldes. Não tomava banco no gosto seletivo do empreiteiro cultural. Averbal e as galinhas cantoras; as irmãs sisters e o chimpanzé aeróbico; comedores de fogo e cães de skate e um gorila que voava pendurado em balões infláveis.
Don Rudy já entrara naquele estado de irritabilidade de dar bofetão nas moscas. É quando adentra tímido e silencioso o último candidato. Era um homem mui magro. Sob o casaco roto deixava ver sua saliente ossatura.
- O que o senhor faz? - inquiriu Don Rudy.
- Imito passarinho, dos cantarolantes aos assobiadores, imito quiriri, suiriri, pitiguari, vira-bosta, sabiá e bem-te-vi - respondeu com voz pausada o tímido candidato.
- Olha aqui, seu bem-te-vi de araque, o senhor acha que alguém vai sair de casa, pegar ônibus, pagar ingresso para ver um homem que vendeu a bicicleta e só ficou com os aros imitar um vira-bosta?
O homenzinho se encolheu mais ainda. Se flaquito era desmilinguido ficou. Com seu casaco folgado, suas calças surradas, foi caminhando bem devagarinho até a janela.
Abriu uma persiana, abriu a outra, subiu no parapeito e saiu voando leve, lívido, trêmulo nos rumos do Parque da Redenção. A tarde desmaiava em suas tonalidades, cinza e salmão. E era possível ver sua silhueta incrustada contra um pôr de sol incandescente, pronto a mergulhar nas águas do Guaíba.
Pampianas
Luiz Coronel: o imitador de passarinhos
O colunista escreve mensalmente no 2º Caderno
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