A história do bailarino iraniano Afshin Ghaffarian foi amplamente difundida em 2009, pouco depois da reeleição do presidente daquele país, Mahmoud Ahmadinejad. Integrado aos protestos que reivindicavam a anulação do pleito, dados os indícios de fraude - abordados, entre outros filmes, no recente 118 Dias (2014), com Gael García Bernal -, Ghaffarian foi detido e jurado de morte por agentes da repressão de Ahmadinejad. Ele já havia escolhido o caminho da luz em meio ao obscurantismo: o exercício da dança é proibido no país, que também prende artistas e os impede de se expressar - o caso do cineasta Jafar Panahi, de O Círculo (2000) e O Balão Branco (1995), e que em fevereiro venceu o Festival de Berlim com Taxi (2015), é o exemplo mais conhecido dessa política opressora.
Ghaffarian fugiu do Irã e conseguiu asilo na França, após um episódio que é melhor não antecipar aqui - o ideal é assisti-lo da maneira como é contado em O Dançarino do Deserto, produção britânica dirigida pelo estreante Richard Raymond que estreia nesta quinta-feira no circuito nos cinemas.
É que esse episódio, em si, é o momento culminante do filme, que a rigor se concentra na vida pregressa do bailarino. Lembra a descoberta da poesia por parte do menino Afshin, a montagem de um grupo clandestino de dança junto a seus jovens amigos e a posterior apresentação de um espetáculo para algumas dezenas de privilegiados, no meio do deserto, a 200 quilômetros de distância da capital Teerã. Tudo para que não fossem flagrados em sua subversão.
A construção dessa trajetória se dá de maneira um tanto esquemática e recheada de clichês. É ingênua a forma com a qual Richard Raymond e o roteirista Jon Croker manipulam a linguagem cinematográfica. O que, paradoxalmente, faz bem ao filme: escancara a sua sinceridade, dotando-o de uma pureza comovedora. É difícil não simpatizar com O Dançarino do Deserto - apesar de todos os seus defeitos.
Nada, no entanto, colabora mais para isso do que a atuação de Reece Ritchie. O ator que interpreta Ghaffarian tem excelente entrosamento com Freida Pinto, a atriz indiana revelada por Quem Quer Ser um Milionário? (2008), que aqui põe em prática o talento de dançarina digno das musas de Bollywood. Ela interpreta uma espécie de namoradinha do protagonista, a garota com quem o jovem bailarino dança, em números muito bem coreografados e fotografados. No deserto do Irã ou nos palcos de Paris, onde se dá o momento culminante do longa, o espectador é levado a crer, com nobre e genuína convicção, que a arte é capaz de mudar o mundo.
É ingênuo, sim, mas é bonito demais. E, você vai ver, até pode ser verdade.
O Dançarino do Deserto
(Desert Dancer)
De Richard Raymond.
Drama, Grã-Bretanha, 2014.
Duração: 98 minutos.
Classificação etária: 10 anos.
Em cartaz nos cinemas a partir desta quinta-feira.
Cotação: regular.