Os circos sempre provocam algum tipo de emoção nas pessoas. Seus artistas, figuras envoltas por uma atmosfera de curiosidade e magia, chegaram até a inspirar outras artes.
No clássico Cem Anos de Solidão, de Gabriel García Márquez, a chegada do circo causou uma certa subversão na ordem social da pacata Macondo. Cândido Portinari retratou a arte brasileira pelo viés do picadeiro em obras como O Circo (1934). Talvez porque a arte circense tenha o condão de encantar, entreter e comunicar sem palavras.
Buscando resgatar os sentimentos que os espetáculos despertam e disseminar suas linguagens - sobretudo, a contemporânea -, a cidade coração do Rio Grande sediará o Santa Maria Sesc Circo. Deste domingo até a próxima sexta-feira, artistas do Brasil, Argentina e França compartilharão picadeiros, praças, pátios de escolas e ruas para chegar mais perto de seu público. O objetivo é o de sempre: encantar.
Saiba onde encontrar ingressos para o Santa Maria Sesc Circo
O festival é realizado por meio da parceria entre o Sistema Fecomércio-RS/Sesc e prefeitura, com apoio da Aliança Francesa. Segundo Silvio Alves Bento, gerente de Cultura do Sesc-RS, a escolha de Santa Maria como sede do evento é estratégica:
- Nossa expectativa é fortalecer o circo contemporâneo e tornar Santa Maria uma referência, já que aqui existe um forte movimento circense. Há um curso de Artes Cênicas na UFSM, inclusive, com um núcleo de palhaços, várias companhias de teatro e uma boa estrutura para receber o evento, o que inclui espaços e serviços de hotelaria. Também queremos fortalecer a dramaturgia e a valorização dos atores, mais do que o figurino ou o cenário. A ideia é que a arte circense se torne mais intensa, alcançando o imaginário da plateia.
Evento valoriza companhias
Para isso, uma grande lona será instalada na gare da Viação Férrea, no fim da Avenida Rio Branco. Escolas e ruas da cidade também receberão intervenções artísticas como mostras fotográficas e palestras sobre o tema.
Há duas semanas, totens com a programação do festival foram espalhados por vários pontos da cidade para garantir que o público não deixe de aproveitar os espetáculos. O evento contempla mais de 30 apresentações para a comunidade, todas gratuitas.
Entre as companhias convidadas para o evento está o Circo Girassol, de Porto Alegre. O grupo acumula 15 anos de atividades e conhece as dinâmicas envolvidas na manutenção de circo. Integrante do grupo, e artista circense Débora Rodrigues diz que iniciativas como essas valorizam o esforço feito pelas companhias ao longo do ano.
- Os desafios vão desde a conquista de espaço, qualificação, trabalho em grupo, e colocar seus trabalhos no mercado e manter-se com eles, num país com restritos recursos de incentivos à cultura - valoriza.
Esta reportagem da revista MIX apresenta um pouco das companhias que estão chegando a cidade para o Santa Maria Sesc Circo. Acomodem-se em seus lugares, o espetáculo vai começar!
Pratas da casa
A cidade de Santa Maria não apenas sediará o festival circense, como terá representantes sob a lona e sobre o picadeiro. O Teatro VagaMundo levará para o festival os espetáculos Banana com Canela e Cabaré Lange Ri. Já a Cia Sorriso com Arte apresenta o espetáculo Menorah. As duas companhias também realizarão oficinas ao longo da semana.
O Teatro VagaMundo, que desenvolve pesquisa e criação na arte do palhaço desde sua fundação, em 2008, abrirá o festival com a saudação do Palhaço Rabito, um velho conhecido na cidade, incorporado pelo ator Daniel Lucas, 31 anos. Já o espetáculo Cabaré Lange Ri, é protagonizado pelas atrizes Júlia Zulke, 23 anos e Carolina Reichert, 24. Interpretando Bruaca e Bisca, elas provam que o picadeiro também é lugar de mulher.
- Para o espetáculo, levamos em conta o fato de estarmos desbravando a palhaçaria feminina, que difere da tradicional masculina. Existem registros de palhaços homens desde muito cedo, porém a história oficial esconde a participação de mulheres no meio. Para a criação do Lange Ri, buscamos falar do que há de ridículo em ser mulher, e expor isto a favor da comicidade. Fazer das nossas características, que diferem das dos homens em muitos aspectos, ferramentas a favor do riso - explica Júlia.
A Cia Sorriso com Arte, fundada em 2002, caracteriza-se pelo hibridismo entre o teatro, a dança e a arte circense - dentro da tendência contemporânea que nos presenteou com grupos como Tholl e Cirque de Soleil. Seus 24 integrantes apresentarão no festival o espetáculo Menorah, que aposta na fusão de cores, movimentos, imagens e acrobacias para envolver o espectador.
A professora de dança e diretora coreográfica da companhia, Karine Pissutti, conta que o grupo faz de três a quatro ensaios por semana, com três horas de duração, para estar afiado na apresentação. Para ela, o festivalpoderá ser um divisor de águas para a cultura circense local:
- Viajamos pelo Brasil inteiro e pelo Exterior, e muitas pessoas mal sabem que somos daqui. A descentralização dos espetáculos serve para que possamos abarcar o maior número possível de espectadores. Esse contato múltiplo do público com o circo, nos engrandece e nos valoriza como um conjunto que trabalha em prol da arte circense, dessa linguagem que é viva em Santa Maria.
Tem gringo no picadeiro
Além de grupos nacionais, o Santa Maria Sesc circo receberá duas companhias internacionais. O L'inopinée Cia - que vem de Paris, na França - apresentará o espetáculo Rigoletto. Já aos hermanos do Circo Social del Sur (foto), trazem da capital argentina o espetáculo Dos Plazas.
O L'inopinée nasceu em 2010, quando a gaúcha Roberta Casa Nova e o francês Bertrand Landhauser estudavam na Escola Internacional de Teatro Philippe Gaulier. Eles se encontram pelo viés do prazer do jogo e pela exigência na qualidade da criação. Logo, passaram a desenvolver, além de um relacionamento amoroso, um humor próprio, que oscila entre a ingenuidade do clown e a sutileza do bufão. Em Santa Maria, eles apresentam Rigoletto, que apesar do nome inspirado em uma ópera, um espetáculo de rua.
- A movimentação é importante para nós, artistas e para a população - avalia Roberta, sobre o espetáculo, que, por ser clown, não tem falas.
Os hermanos do Circo Social del Sur trazem o espetáculo Dos Plazas. De Buenos Aires para o mundo, o grupo atua com trabalhos voltados para fins pedagógicos, sociais e artísticos. O grupo utiliza a estratégia circense para transformação e desenvolvimento de crianças e jovens, facilitando igualdade de acesso às oportunidades de formação e produção artística.