Sempre chega o dia de irmos embora deste mundo sem que se saiba nem por que, nem para onde. E, mesmo que isso seja recorrente e corriqueiro, é-nos difícil aceitar que aqueles com quem convivemos, de um momento para outro, transformem-se em ausência. Nos últimos dias, tivemos que dar adeus para alguns expoentes da nossa cultura popular. Figuras cuja contribuição há de percorrer os tempos: Carlos Catuípe, Giba Giba e Nico Nicolaiewsky.
O primeiro, junto com Ivo Ladislau principalmente, recuperou a vitalidade da herança afro-açoriana do litoral gaúcho. Seus maçambiques, quicumbis e cantigas praieiras trouxeram para nossos palcos algo além do gaúcho homem do campo. Catuípe cantou (cantará!) o pescador e sua paisagem, suas crenças, seus amores, a riqueza de um folclore que, sem a generosidade de sua percepção, tenderia ao esquecimento. Suas canções conferiram novos padrões estéticos aos festivais rio-grandenses, principalmente à Moenda de Santo Antônio da Patrulha e à Tafona de Osório.
O Giba, como aquele pintor da lenda japonesa, perdia-se na beleza do quadro que ia pintando. Como orgulhosamente se reconhecia, teceu sua obra cardando as lãs da sua condição: a negritude! Fundou escola de samba, trouxe à cena o sopapo - instrumento de percussão inaugural - e compôs canções que hoje embalam os ventos e os corações: "...uma cidade, um país, um lugarejo..." (com Wanderlei Falkenberg). Venceu o Musicanto Sul-Americano de Nativismo (Santa Rosa) com a canção Beirando o Rio.
Nico Nicolaiewsky, além do enorme sucesso com o Tangos & Tragédias, abriu, com sua música e seu canto, uma senda para sempre iluminada. Sensível e arguto, certa feita disse: "...sou porto-alegrense como a minha música. O fato de minha música ser gaúcha não a exclui do Brasil; pelo contrário, a minha regionalidade é universal." Dessa forma o encontro do Musical Saracura (Nico, Sílvio Marques, Flávio Chaminé e Fernando Pezão) com Mário Barbará produz no início do anos 1980 uma das mais instigantes manifestações da nossa música regional.
Foram-se os três em menos de 40 dias deste sufocante calor do ano recém-começado. E, no rasgo da ausência, por dentro dela é que permanecerão: mestres da cultura de um povo!