Bebeto Alves está de volta. E não apenas porque acabou de lançar um novo disco, Milonga Orientao. Com o álbum, o músico já acumula três recomeços em menos de um ano - todos igualmente importantes.
O primeiro recomeço se deu há um ano, quando voltou a morar no Rio Grande do Sul. Depois de um longo "exílio" no Rio de Janeiro, onde trabalhou como diretor do Centro de Música da Funarte, Bebeto fixou residência em São Leopoldo, numa espaçosa casa que divide com a mulher, Simone, e os dois enteados pequenos.
- Eu quase não saio daqui, amo este lugar - diz Bebeto, sentado em seu estúdio e rodeado por equipamentos musicais, instrumentos, livros e CDs. - Fiquei cinco anos indo e voltando, até decidir o momento de ficar de vez.
Essa decisão teve relação direta com o segundo recomeço de Bebeto. Em abril do ano passado, o músico passou por um delicado transplante de fígado, após anos tratando uma hepatite C que evoluiu para um tumor. Com o novo órgão, veio uma nova postura.
- Tive que parar com tudo, cigarro, bebida, loucurada. Mas também precisei escapar de uma certa autoindulgência, que é muito comum em situações assim. Não posso me colocar como vítima, pelo contrário - comenta Bebeto, completando que a guerra ainda não foi vencida. - A medicação vira um quebra-cabeça, porque o primeiro remédio precisa de um segundo para cortar os efeitos colaterais do primeiro. Sem contar que a hepatite ainda está no meu corpo e, em breve, vou ter que voltar a tratá-la.
Em casa e quase totalmente recuperado, Bebeto começou a empreender seu terceiro recomeço. Juntou sua banda, Blackbagualnegovéio, que o acompanha desde 2004, e entrou em estúdio. Ficou de março a outubro polindo as 12 faixas do novo trabalho, o primeiro de inéditas desde o álbum triplo 3D (2010). Nesse ínterim, arrumou tempo para sua outra paixão, a fotografia.
- Faz uns 10 anos que brinco com fotografia, faço algumas séries, como Eyefood, Postales, Poa Pop e Estruturas. É uma necessidade que tenho de interferir na realidade, e a foto me permite isso - explica o artista, cuja exposição mais recente foi justamente sobre o período em que ficou internado na Santa Casa, em Porto Alegre.
Lançado no começo deste ano, Milonga Orientao dá sequência às experimentações de Bebeto com a milonga, iniciadas em Bebeto Alves y La Milonga Nova (2000). O ritmo recebe tratamentos diferenciados ao longo do disco, às vezes com um toque de flamenco (Milonga Orientao, com participação de Humberto Gessinger), às vezes com pitadas de baião (Meia Verdade), samba (No Canto do Samba), rock (À Luz Dessa Hora) e música árabe (De Luz e Fogo).
No documentário Mais uma Canção, de Rene Goya Filho e Alexandre Derlam, lançado no final do ano passado, Bebeto vai atrás das origens de sua música e declara que não tem uma canção preferida de seu repertório, porque "existe apenas uma música, que eu tenho perseguido desde sempre". Seria na milonga que Bebeto vai encontrar seu porto seguro, depois de tanta reinvenção? Não há uma resposta fácil.
- Acho que minha música segue um curso natural. Tentei fazer algumas coisas diferentes, e o resultado quase sempre foi trágico (risos) - pondera. - O (crítico musical) Juarez Fonseca disse uma vez que eu mudava para me manter fiel a mim mesmo. Hoje, diria que estou me mantendo para continuar fiel a mim mesmo.
Reinvenção
Recuperado de transplante e de volta ao RS, Bebeto Alves lança novo disco
Álbum "Milonga Orientao" é o primeiro de inéditas desde "3D", de 2010
Gustavo Brigatti
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