Doug Stanhope é o humorista menos insinuante.
Enquanto alguns humoristas vão a Utah e fazem piadas sobre o mormonismo, ele vai até lá e ataca a plateia que o deseja ver criticar o mormonismo. "Sai dessa vida", ele disse ao público em Salt Lake City no álbum, de 2012, "Before Turning the Gun on Himself".
Dave Chappelle pode ficar desconcertado por um público ruim, mas Stanhope, cujo novo especial cômico, "Beer Hall Putsch", acabou de ser lançado no Netflix, parece se alimentar da energia hostil. Assim, quando ele subiu no palco em maio no B.B. King Blues Club & Grill, na Times Square, não foi surpresa ele ter insultado a casa, Nova Iorque e o time de beisebol New York Yankees; uma vez, ele disse: "torcer pelos Yankees é como entrar em um cassino e torcer pela casa". Também não foi surpresa ele ter previsto que B.B. King morreria em breve. Ele só estava começando.
Naquela noite no primeiro semestre, Stanhope viu uma mulher sentada na frente, de cara fechada, desviando o olhar dele. Ele a criticou, dizendo que ela não estava em um espetáculo da Broadway e que não fingiria haver uma quarta parede. Ela continuou carrancuda.
A hostilidade se transformou em um estranho ajuste de contas. Ele a mandou embora e a xingou. Nada mudou. Enquanto passavam os minutos, a tensão no salão se transformou em uma ansiedade mais amena. O que ele faria em sua apresentação?
- Vou me concentrar em um minuto - ele grasnou
- Ou talvez não - depois mudou de ideia.
Os fãs gritaram, aprovando. Stanhope os ofendeu, parecendo muito mais interessado em entender a mulher infeliz. Enquanto transformava o show em um monólogo sobre o estoicismo dela, surgiu um quê de admiração em sua voz. Ele mudou a abordagem, elogiando sua resistência e contando piadas diretamente para ela.
- Preciso que você me ame - ele disse em um tom de desespero.
- Também não gosto de mim mesmo, se isso ajuda - Ela não riu e terminou indo embora.
Com um humorismo que é uma mistura ácida de hostilidade irascível, autodepreciação belamente articulada e raiva justa, Stanhope, 46 anos, merece seu status cult. Morando nos arredores da fronteira mexicana no Arizona, ele mal apareceu na televisão. Humorista dos humoristas, ele pode ter encontrado sua vazão televisiva perfeita no Netflix, pois é difícil imaginar que ele ficasse feliz por muito tempo em qualquer rede. (Ele define sua temporada no "Man Show", do canal Comedy Central, como montes de excremento nos "quais eu pisei por descuido".) Contudo, ele mantém uma turnê movimentada, lançando um álbum novo a cada um ou dois anos. Suas arengas eloquentes e em ebulição seguem a tradição cômica frenética de Lenny Bruce e Bill Hicks.
O perigo para Stanhope sempre foi que seu desprezo operístico pudesse se tornar uma espécie de tática. Em seus espetáculos da década de 1990, dá para ouvir a influência de Andrew Dice Clay. E a maioria de suas aparições de maior repercussão - por exemplo, contando uma piada comprida e obscena para um bebê no filme "The Aristocrats" - o fazem parecer um provocador banal, coisa que ele não é.
Os relatos de devassidão de Stanhope são típicos (drogas, pornografia, alcoolismo), mas sua mente humorística é genuína em seus aspectos incomuns, destemidos e analíticos. Seus alvos são grandes e ele volta aos mesmos, o que é bom. Gurus políticos podem ser capazes de fingir que estão com raiva toda semana, mas a maioria das pessoas fica exaltada com somente algumas coisas. Quando a raiva de Stanhope parece ligada à convicção justa forjada ao longo dos anos se criticando no palco, seu humor tem a dinâmica de uma briga de bar estourando depois da primeira cadeira ser jogada.
Ele despreza símbolos da política, piedades liberais e boêmias, a guerra às drogas e, acima de tudo, o culto às crianças. A superpopulação é seu principal inimigo.
-Bebês são como poemas. São lindos para seus criadores - o cômico afirmou anos atrás.
Seu novo especial, batizado em homenagem ao fracassado golpe de Estado de Hitler na década de 1920, revela traços de uma crise da meia-idade. Usando um blazer xadrez e calças brilhantes que parecem um ou dois números maior, Stanhope evita o choque da fala de abertura usual. Minha preferida é a de "From Across the Street", de 2009, "o engraçado sobre a pornografia infantil, tirando a falta de créditos no final..." Em vez disso, ele conta ter desistido do Jägermeister, confissão que pode surpreender alguns fãs, já que o humorista gosta desse licor alemão há muito tempo. Contudo, ele disse ter mudado de opinião depois de ver um vídeo de si mesmo falando a respeito do destilado, descrevendo-o como um "grito desesperado para ser jovem".
Muitos dos humoristas entusiasmados que alegram a plateia com histórias sobre pornografia e drogas têm uma veia romântica lacrimosa. Marc Maron fala de seu passado sem dinheiro com um tom de nostalgia. Stanhope, no entanto, é impassível ao extremo (e muito mais intolerante que Maron sobre programas de 12 passos). O instrumento de suas diatribes é um argumento racional concluído com lógica perversa ou excesso de barroquismo.
Enquanto o novo especial alfineta a política ineficiente das campanhas Ocupar Wall Street, de distribuição de brinquedos para crianças carentes e conscientização do câncer de mama, o destaque é uma história pessoal sobre a época em que Stanhope disse ter ajudando a mãe a partir desta para melhor; aconteceu muitos anos atrás e, sim, existem motivos legais para ele esperar para contar. A vida dela se tornou intolerável por causa de um enfisema, então ela pediu ajuda ao filho para dar um fim nele, como ele conta no espetáculo.
A descrição precisa da escolha de opções, da opção pela morfina e sugerir que o caminho é cruelmente franco e relativamente sem enfeites. De certa forma, é uma história emocionante, mas não existe momento no qual ele tente fazer você chorar.
Sua mãe não era uma flor delicada. Quando Stanhope apresentou "The Man Show", ela apareceu em um segmento resenhando pornografia, revelando que o humor negro era herdado. Então, soa como um ato de amor quando ele zomba dela enquanto esta agoniza no leito de morte:
- Espere, mãe, acharam a cura. -
O notável é que o estilo prosaico e até esperançoso do humorista não atrai nem simpatia nem melancolia. Em sua narrativa, a morte não se mostra nem trágica nem sagrada. A incongruência entre o tom espontâneo e o assunto grave faz parte de uma visão de mundo consistente.
Stanhope, que falou em concorrer à presidência pelo Partido Libertário em 2008, e terminou apoiando Ron Paul, disse que o vício não existe.
- Somente existem coisas que você gosta mais de fazer na vida.-
No especial de 2011, ele descreve o suicídio com praticidade fria.
- A vida é como pornô com animais: não é para qualquer um. - Não é por acaso que Louis C.K. o convocou como o humorista mordaz e suicida a quem não consegue convencer a não se matar no seriado "Louie", do canal FX.
A exemplo de muitos cômicos, Stanhope compreende que a morte pode ser a chave de ouro de uma piada. Porém, quando descreve o suicídio da mãe como "a melhor morte da qual se pode participar", ele não está brincando. Stanhope está falando sério.