*Matéria publicada originalmente em 21 de novembro de 2007 (jornal Zero Hora)
Os palestrantes de ontem do ciclo de altos estudos Fronteiras do Pensamento vieram a Porto Alegre para contrariar noções. O sociólogo francês Michel Maffesoli, um dos grandes nomes do pensamento filosófico pós-moderno, e o artista plástico catalão Antoni Muntadas, embora de áreas bastante diferentes, apresentaram algumas visões coincidentes da cultura contemporânea ao debater o Espaço da Memória.
Muntadas é um nome referencial da arte política dos anos 1970. No último domingo realizou uma intervenção no Torreão, na Capital, que consistiu em tão somente abrir as janelas do espaço de exposição. Ontem, em uma palestra dividida em duas partes, uma delas uma projeção de slides e outra em vídeo, ele enfocou o espaço como dilema de memória, prática e metaforicamente.
- Se fizermos a relação entre espaço, a palavra espaço, e terreno, e sítio, e lugar, a pergunta nas cidades passa a ser: o que fazemos com esse espaço? Destruímos, preservamos, reciclamos, reduzimos? É óbvio que as cidades precisam mudar, mas a dinâmica dessas mudanças é que me interessa, até porque a questão do tempo também é importante nesse processo, o que o tempo muda na relação de uma cidade com seu espaço - antecipou na entrevista coletiva realizada à tarde no Salão de Atos da UFRGS.
Já Maffesoli apresentou uma conferência que começou e terminou com a valorização da palavra como o instrumento de criação do mundo. Primeiro, passeou pelo conceito, para ele superado, de modernidade, que caracteriza-se pela separação dos objetos de análise e por pensar a verdade como algo longínquo, ainda por vir - para Maffesoli a verdadeira modernidade não começa no século 18, mas sim em Santo Agostinho e sua Cidade de Deus. Ao fazer isso, Maffesoli pôs em choque também o que ele considera o maior mito do século 20: o progresso.
- A questão da memória é recente, já que a grande característica da modernidade foi a História, a busca da explicação do mundo. Mas hoje é tudo mais dinâmico, acredito que o importante não é mais a explicação do mundo, o desenraizamento, e sim a "implicação". O importante não é mais o progresso, que implica a noção contrária de "regresso", e sim o "ingresso", mas não no sentido que vocês usam em português, mas de um movimento interno. Não uma linha reta, como o progresso, nem um círculo, no caso de regresso. Eu proponho uma idéia espiral.
Os dois realizaram a penúltima conferência do ciclo Fronteiras do Pensamento, que desde março trouxe a Porto Alegre quase três dezenas de convidados internacionais para falar sobre arte, política, economia, sociedade, jornalismo, filosofia - sem contar os convidados brasileiros e gaúchos. A última palestra do ciclo está marcada para o próximo dia 4, com o iconoclasta romancista francês Michel Houellebecq. A edição 2008 do Fronteiras já está confirmada, e o elenco de convidados será anunciado no início de dezembro.