Antes monopolizados por homens, instrumentos no meio musical, como bateria e violino vêm sendo cada vez mais dominados por mulheres.
Seguindo o caminho de referências como Shana Müller, jovens artistas desmistificam a história de que "bateria" é coisa de homem, para citar apenas um chavão. Neste especial, conheça três artistas gaúchas que vem ganhando destaque no cenário local, mostrando força, talento e sensibilidade.
Honra e agradecimento
Antes tido como um instrumento masculino, a bateria começa, aos poucos, a ganhar as batidas potentes das mulheres. Tendo como referências nomes femininos do instrumento, Andressa Magedanz, 21 anos, natural de Estrela, no Vale do Taquari, teve a paixão despertada ainda na infância e começou a tocar bateria na adolescência. Hoje, a faz parte da banda do cantor sertanejo Sandro Sans, integra a banda Eletro Rádio e é professora de bateria e trabalha com Musicalização Infantil na Companhia AprendiZ, escola referência do Estado.
- Sinto que as coisas mudaram e melhoraram muito para as mulheres. Temos que honrar e agradecer àquelas que sofreram e lutaram para conquistar esse espaço que, hoje, nós usufruímos, com menos sofrimento, menos preconceito e menos exclusão - afirma.
Andressa lembra que, no início da carreira, ouvia comentários machistas, afirmando que, para tocar bateria, era necessário ser homem, "com pegada forte".
- Mal sabem que mulher é sinônimo de muita força. Hoje, as coisas mudaram, tenho o respeito de homens que acompanham meu trabalho, convivem comigo, trabalham comigo. Sinto que estamos ganhando mais espaço, cada dia mais estamos sendo ouvidas e vistas. Sou muito feliz por ter o apoio de muitos homens e mulheres nessa caminhada. A luta ainda não acabou, sabemos disso, porém as coisas estão melhorando cada dia mais.
Inspiração
Andressa gosta de repetir uma espécie de mantra: que está sempre escrevendo sua história, mas também a história da mulher na bateria. A gaúcha conta que, seguidamente, recebe relatos de meninas que se inspiram no seu trabalho.
- O sentido de tudo é esse: tocar o coração das pessoas. Sinto que as próximas gerações vão ter mais facilidade e menos obstáculos do que essa minha geração teve e ainda tem.
Onde se vê daqui cinco ou 10 anos?
Tenho como foco trabalhar com a galera do cenário nacional e até internacional, estar no meio das pessoas que são referência para mim. Quero viajar muito, viver a rotina que essa profissão proporciona, estar no palco. Porém, tenho uma vontade enorme de ter meu próprio estúdio para produzir meus trabalhos, gravar para os artistas, produtores etc. Acredito que daqui a 10 anos vou estar com meu próprio estúdio, viajando para todos os cantos e levando a minha música. Também tenho em mente algum projeto que abrace a galera que queira estudar algum instrumento, mas que por falta de condições não tem a oportunidade.
Dona de sua vida
Dona de seu tempo e de sua carreira, Janna Martins, 31 anos, vocalista em carreira solo, investindo na vaneira, gênero que tem, predominantemente, homens à frente dos vocais, é adepta da modernidade do gênero, um dos mais populares do Rio Grande do Sul. Recentemente, lançou o clipe da canção Coração Calado, sua primeira solo, no qual se inspirou em Anitta para gravar alguns trechos, que mostram uma mulher empoderada. Quando questionada sobre como enxerga o atual momento das mulheres na música, faz uma importante provocação.
- Tu consegues lembrar de alguma música gaúcha que exalte a mulher independente? Ou citar três cantoras da música tradicionalista? Eu não. E olha que cresci em bailão! Em todas as minhas lembranças de infância mais felizes, a música sempre está presente mas, dentro da música gaúcha, tive poucas referências femininas para me inspirar. Parecia algo muito difícil acreditar no meu sonho e conseguir espaço em um mercado tão masculino – afirma Janna.
Ocupação de espaço
Moradora de Butiá, Janna afirma que um de seus propósitos na música é fazer que as mulheres saibam, de fato, que o lugar delas é onde cada uma quiser. Ela comenta, ainda, que lhe incomoda o fato de não ver mais mulheres cantando a nossa história.
– Fico muito feliz em ver que estamos conseguindo, muito aos poucos, ocupar um espaço que também é nosso. O Rio Grande do Sul é um dos Estados mais machistas do Brasil e isso se reflete em todas as áreas. Precisamos combater essa desigualdade, e acredito que a melhor forma de fazer isso acontecer é juntos.
Onde se vê daqui cinco ou 10 anos?
- Daqui a cinco anos me vejo cantando! E espero que em um cenário musical mais diverso e representativo para as mulheres da minha e das próximas gerações.
Violino de respeito
Normalmente associado a músicas sofisticadas, o violino se tornou a grande paixão de Júlia Reis, 20 anos, moradora do bairro Medianeira, na Capital, ainda na infância. Na infância, começou a tocar violino na Orquestra Jovem, liderada pelo maestro Telmo Jaconi e de apaixonou pelo instrumento. Rapidamente, o talento de Júlia começou a chamar atenção em diversos gêneros da música gaúcha. Em 2014, aos 14 anos, fez uma participação especial no DVD do grupo Papas da Língua, projeto que celebrou os 20 anos da banda. Hoje, toca violino e canta ao lado de um dos mais respeitados nomes da música gaúcha: Elton Saldanha.
- Eu me sinto muito feliz em poder ter um fluxo de trabalho e de pequenas construções hoje em dia, fruto de um estudo que começou há 10 anos, que fez com que hoje eu possa viver em plenitude com a música e com novos desafios a cada dia - afirma.
Julia afirma que o cenário pode melhorar, de maneira geral:
- Penso que, quanto mais nós mulheres seguirmos nossas ambições, mais as barreiras serão quebradas.
Onde se vê daqui cinco ou 10 anos?
- Me vejo daqui a cinco anos percorrendo muitos lugares do mundo com a música e desejo que isso seja com pessoas de boa índole, com o mesmo propósito de espalhar arte e emoção para outras pessoas. Quero espalhar essa energia da arte pelo mundo.
Pitaco de quem entende
Shana Müller, nome fundamental quando falamos da força da mulher gaúcha na música, afirma que o aumento da representatividade delas é inegável atualmente.
- Como é em toda a sociedade. Ainda há um caminho largo a percorrer. De união e representatividade. Aquele processo básico: preciso me ver no outro. Ver mulheres no palco e na composição incentiva outras a saberem que aquele lugar também é delas – afirma a cantora e também apresentadora do Galpão Crioulo, da RBS TV.
Lugar de fala
Shana pondera ainda que é importante que as mulheres quebrem barreiras e ocupem os espaços:
- Por isso, é tão importante questionar, falar sobre o assunto, reivindicar. Que possamos sempre estar no palco, e que a arte seja também lugar de fala das mulheres.
Claus, da dupla com Vanessa, afirma que nota um aumento no número de mulheres na música em qualquer posto dentro nos grupos.
- Sou suspeito, pois sempre gostei de ver mulheres em bandas, em qualquer posição. Acredito que o cenário esteja evoluindo nesse sentido, para que a mulher se posicione cada vez mais dentro do meio musical. Existia um preconceito, sem dúvida, mas elas, hoje em dia, estão se posicionando mais - ressalta o músico.
Claus lembra, ainda, que Vanessa foi a primeira vocalista mulher a interpretar o tema de verão da Rádio Atlântida (94.3 FM), em 2007, com o hit Medo de Amar, da dupla:
- Foi um marco, algo muito importante.