Como uma espera de 34 anos pode ser compensada? Difícil, mas a banda Bon Jovi fez a sua parte. Começando pelo respeito ao público de 40 mil pessoas que foi ao Beira-Rio, em um semestre em que a lista de shows internacionais pode fazer com que muitos tenham que escolher entre uma ou duas atrações internacionais. Dez minutos antes do previsto, o estádio ficou completamente escuro, pegou de surpresa os que ainda se acomodavam, e o jogo de luzes do telão anunciou: o grupo de New Jersey estava pronto para começar.
Foram quase duas horas e meia de show, com a abertura previsível de This House Is Not for Sale, que também dá nome à turnê. Com um set list semelhante ao dos shows realizados no Chile e na Argentina, com poucas alterações, a alternância entre os hits dos anos 1980 e 1990 com outros mais atuais tinha uma razão clara: agradar na medida ao público com uma média de idade acima de 30 anos. As três primeiras músicas foram um aquecimento para a primeira explosão da plateia, com You Give Love a Bad Name, seguida de outro clássico oitentista: Born To Be My Baby, direto do disco New Jersey, de 1988.
Leia mais:
FOTOS: confira galeria do show em Porto Alegre
Bon Jovi em Porto Alegre: fãs podem esperar hits dos velhos tempos
Veja como foi a primeira noite de Bon Jovi em Porto Alegre
Mais do que uma memória musical, um inspirado Jon Bon Jovi convidava a todo momento as pessoas a voltarem no tempo com uma presença que muitos aprenderam a ver na adolescência em apresentações de DVDs e videoclipes apresentados à exaustão em canais de música. Estava tudo lá: a calça justa, os biquinhos, os golpes no ar como se estivesse lutando boxe, o sorriso aberto e os requebrados. Performático e 100% concentrado no palco, como se fosse o último show da carreira.
Antes de iniciar Runaway, faixa do primeiro disco que leva o nome da banda, do ano de 1984, a introdução do teclado, uma das marcas da música, levantou pista e arquibancada – e teve direito a um rápido solo de guitarra executado pelo vocalista. Citar a palavra guitarra leva a um assunto que não tem como fugir quando se fala de Bon Jovi. Phil X, com a complicada tarefa de substituir Richie Sambora (guitarrista que soube por décadas ser uma marca mesmo em uma banda cujo nome leva o sobrenome do líder), foi muito carismático. Se Sambora deixa saudades, como muitos dizem em lamentos nas redes sociais, no palco, o entrosamento da nova formação contornou a ausência. Os sócios-fundadores David Bryan (teclados) e Tico Torres (bateria) e Hugh McDonald (baixo) completaram a trupe.
Depois de uma versão acústica da dançante Someday I'll Be Saturday Night, um dos momentos de maior resposta do público foi visto. Bed of Roses foi cantada em coro, caracterizando uma das fases românticas que mais marcaram as letras da banda. Do disco Crush, It's My Life foi responsável por um renascimento na carreira do grupo nos anos 2000 (após uma segunda fase da década de 1990) e levou uma nova geração a conhecer o trabalho. E foi esse encontro etário que garantiu um dos melhores momentos do show - e relembrou a razão de uma carreira tão longeva. E a delicadeza da interpretação de Wanted Dead or Alive, após a pergunta "tem algum cowboy aí?" ganhou a adesão de muitos, mesmo que baixinho, ou acompanhando com a lanterna do celular.
Para o final da primeira fase, uma alteração: Keep the Faith, o grande final do show da Argentina, foi apresentada antes, para depois o grupo, mais unido em cena do que em qualquer outro momento, entoar uma versão de Bad Medicine – que ainda levou Jon para perto da plateia na primeira fila, uma recompensa para quem se propôs a uma outra espera: a da fila. No bis, como de costume na América Latina, In These Arms estava lá, com aquela vocação de música para pedido de casamento, legenda de foto de casal em rede social e tudo o que os apaixonados têm direito. E cumpriu seu papel, para depois deixar por conta de Blood on Blood uma expressão saudosista no rosto do vocalista focado no telão, com a ainda intacta pose de galã: I'm just the singer/ In a long haired rock'n'roll band (algo como "sou apenas o cantor/ em uma banda de rock'n'roll de cabeludos").
Living on a Prayer fez a função que lhe cabe: fechou a noite para deixar no público a sensação de que valeu a pena a espera. Faltou Always, a música tão pedida, mas que a banda praticamente deixou de executar. Entre os motivos estaria o desgaste que provoca na voz de Jon (que, inclusive, cantou com bem menos potência no Beira-Rio). Se for para arriscar, talvez seja para a audiência televisiva do Rock in Rio, onde se apresentarão novamente dia 22, no Palco Mundo.