Morto nesta segunda-feira (25), aos 86 anos, em Caxias do Sul, o escritor, tradutor e professor gaúcho José Clemente Pozenato deixa como legado uma notória contribuição para as artes no Rio Grande do Sul. É autor do romance que inspirou uma das produções mais prestigiadas do cinema brasileiro, O Quatrilho, livro publicado em 1985 e transformado em filme 10 anos depois pelo cineasta Fábio Barreto. O longa foi para Hollywood, tendo sido indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro em 1996.
Pozenato criou uma saga familiar baseada em dois casais italianos nos primórdios da ocupação dos imigrantes na região da Serra, no início do século 20. Os quatro decidem morar juntos para conseguir sobreviver, proximidade que leva a um cruzamento de afetos. No cinema, os personagens foram interpretados por Patrícia Pillar, Glória Pires, Alexandre Paternost e Bruno Campos.
O Quatrilho não é um livro isolado; é a primeira parte de uma trilogia composta por A Cocanha (2000) e Babilônia (2006). A obra fez com que Pozenato fosse visto como um dos escritores que melhor retrataram a história da imigração italiana no Rio Grande do Sul.
Antes, ele já tinha visto um livro seu ganhar a tela. O Caso do Martelo, também de 1985, é uma novela policial que retrata a investigação de um crime cometido em uma pequena cidade do interior do Rio Grande do Sul, formada por uma comunidade italiana, onde o detetive Pasúbio tenta desvendar o mistério. A história deu origem a um especial exibido na Globo em 1991 e dirigido pelo ator Paulo José. No elenco, nomes como Lima Duarte, Guilherme Fontes e Elias Gleiser.
Além de ter seus livros adaptados para o audiovisual, Pozenato teve o mérito de levar as paisagens do Rio Grande do Sul para as telas: enquanto O Quatrilho foi gravado em Caxias do Sul, Bento Gonçalves, Carlos Barbosa, Antônio Prado e Farroupilha, O Caso do Martelo foi filmado em Caxias do Sul.
Além do cinema, O Quatrilho foi adaptado para a ópera. Em 2018, o compositor Vagner Cunha assinou a composição apresentada no Theatro São Pedro, com árias cantadas em italiano, e os recitativos, falados em português. O libreto foi escrito por Pozenato.
A parceria com Vagner Cunha se repetiu em 2021, quando se completaram 700 anos da morte de Dante Alighieri, um dos maiores nomes da literatura universal e considerado o maior escritor em língua italiana. Enquanto Cunha produziu o espetáculo A Paixão de Dante, no Theatro São Pedro, Pozenato traduziu Inferno, nome dado à primeira parte do poema A Divina Comédia, composto também por Purgatório e Paraíso.
A tradução de Inferno feita por Pozenato foi exibida em legendas no telão durante a apresentação do espetáculo de Vagner Cunha, de forma a ampliar o entendimento do espectador. Mas, principalmente, foi publicada em um livro de edição comemorativa, adotando uma linguagem que aproxima o público brasileiro dessa que é uma das maiores obras da literatura.
— Dante escreveu com a língua do povo. É o que me esforço para fazer nessa tradução também. Não quero obrigar o leitor a buscar o dicionário ou desvendar sintaxes retorcidas — disse Pozenato em entrevista a ZH, em 2021.