Resenha de Carlos André Moreira sobre Notas sobre Turibio Núñez, Escritor Caído, de Jéferson Assumção
Em uma era de velocidade e encontros desesperados que não duram, certo tipo de literatura, a grande literatura existencial do Pampa, por exemplo, parece fadada a soar como um pastiche e uma série de memórias desconexas. É esse o fio condutor que emerge da leitura do fragmentário Notas sobre Turibio Núñez, Escritor Caído, livro recém-lançado pelo escritor Jéferson Assumção, uma costura de situações cotidianas pelas quais por vezes resvala o fictício Turibio Núñez do título.
Notas sobre Turibio Núñez, Escritor Caído, enfileira 16 episódios ao redor dos quais, às vezes de modo muito indireto, gravita um fictício autor argentino em diferentes etapas de sua vida. Em alguns momentos, ele está presente como um nome mencionado de passagem, em outros, interage brevemente com alguém que não sabe quem ele é. As histórias em si pouco têm a ver com Turibio, os protagonistas são sempre outros, já que é um livro construído para ser observado de fora. O próprio Turibio é menos um fio condutor e mais um fator de desestabilização.
As histórias poderiam ser confundidas desde o título com uma biografia de um homem maior que a vida: viajante, guerrilheiro, artista errante, professor, vagabundo, brasileiro por adoção, eremita no meio da multidão. Mas Núñez não é o que se chamaria, em teoria literária, de um "personagem ausente", alguém cuja falta é tão sentida que se torna onipresente na narrativa. Na verdade, ele funciona mais como um marcador disposto ao longo de um conjunto de contos, suas aparições quase não fazem diferença, e seu papel em cada trecho é, mais do que colateral, tênue. O que o leitor vem a saber dele está em um posfácio de Jéferson e em uma introdução escrita por Tabajara Ruas entrando na brincadeira ou pelo autor fingindo ser Tabajara Ruas, não importa.
Logo, Notas Sobre Turibio Núñez, Escritor Caído, é o tipo de obra que se sustenta na linguagem e na construção do jogo entre as expectativas do leitor, mais do que em episódios da trama (até porque muitos se repetem). O que pode ser uma armadilha, contudo. As primeiras duas histórias, principalmente, são construídas como pastiches a elementos da vida literária, como o escritor macho-alfa e a atual literatura erótica de terceira, e são por isso mesmo as mais frágeis – afinal, até onde o pastiche vai sem se tornar aquilo que emula?
À medida que o livro avança, contudo, ele se torna mais interessante na forma como joga com a literatura e a filosofia. Por fim, o posfácio – que é também, aí sim, uma sucinta biografia do fictício Turibio Núñez – oferece a chave para a leitura do conjunto: como seu não protagonista, o livro busca se disfarçar negando o mundo que representa.
FICHA DE LEITURA
O historiador e palestrante Leandro Karnal acaba de lançar novo livro. Em A Detração: Breve Ensaio sobre o Maldizer (Unisinos, 102 páginas, R$ 25), o escritor gaúcho, professor na Unicamp, analisa o hábito humano de se falar mal do outro.
A 9ª FestiPoa Literária começa na próxima semana, promovendo debates e lançamentos em diferentes pontos da Capital. A abertura será na quarta, dia 18, às 19h30min, no bar Ocidente, com um bate-papo entre Eloar Guazzelli e Laerte Coutinho. A programação, que segue até 22 de maio, pode ser conferida em bit.ly/9fpoa.
Um dos destaques desta FestiPoa é o lançamento de Typographo (Patuá, R$ 38), 10º livro de poemas de Ricardo Silvestrin. No dia 21 de maio, às 20h30min, o autor conversará sobre a obra com o poeta e professor Escobar Nogueira, na Casa de Teatro (Garibaldi, 853).
Começa na próxima sexta-feira, dia 20, Espaço Metamorfose (Getúlio Vargas, 1.691) a oficina "Poesia, letra e música", com o escritor e compositor Ronald Augusto, companheiro de Ricardo Silvestrin e Alexandre Brito na banda poETs. Serão oito encontros semanais com debates e exercícios. Informações em bit.ly/letraemus.