Em meio ao sol incessante e ao calor, com temperatura marcando 28°C, o trecho 1 da Orla do Guaíba foi palco neste domingo (24) de duas sessões de um filme que contém um tema sensível para todos os gaúchos. O documentário 800 Milímetros: Histórias que Resistiram à Chuva foi exibido gratuitamente ao público próximo à Usina do Gasômetro em dois horários, às 17h20min e a às 18h30min.
O longa é uma realização da plataforma de financiamento coletivo Vakinha em coprodução com a Camba Filmes, com direção de Thiago Lazeri. Ao longo de 1h05min, 800 Milímetros traz relatos que ilustram a catástrofe causada pela enchente que atingiu o Rio Grande do Sul em maio.
Além do impacto imediato, especialmente o sentimento devastador de quem viu a vida inteira ser levada pela água, o filme capta também o medo do futuro. Ainda, o documentário mostra a mobilização de resgates e as correntes de solidariedade que surgiram durante a enchente, além de mostrar a devastação de diversas cidades do Estado.
A reportagem de Zero Hora acompanhou a primeira sessão de 800 milímetros, que chegou a reunir mais de 60 pessoas. Pallets de madeira com almofadas foram instaladas para as exibições, mas, por conta do sol forte, uma parte do público se abrigou em qualquer fresta de sombra possível, ou procurava proteger a cabeça como fosse possível.
Em alguns momentos, o áudio do filme dividia espaço com intervenções sonoras da Orla: campainha de patinete na ciclovia, buzina de vendedor de algodão doce, buzina de veículos, carro de som, entre outros, mas nada que prejudicasse a experiência.
Alguns transeuntes paravam para ver o filme por alguns minutos, o assistindo em pé, e depois seguiam o passeio. “Se eu ver isso, vou chorar”, disse uma mãe para uma filha pequena, apertando o passo.
O público assistia ao documentário com muita compenetração. No final do filme, palmas. Ao longo de uma hora, a emoção tomou conta de uma parte da plateia.
Foi o caso de Mari Falcão, 60 anos, de Sapucaia do Sul:
— Para mim, foi muito emocionante, chorei em vários momentos. Temos que registrar a história para não repetir os erros. Precisamos deixar registrado toda essa dor que sofremos, mesmo quem não teve a casa atingida.
Uma das personagens do filme, Lucilene Rios também estava na sessão e se emocionou novamente. Aos 55 anos, a moradora de Muçum relata que já havia chorado em uma sessão de pré-estreia:
— Não tinha notado o que tinha falado no momento que foi gravado. Quando me vi na tela, senti uma emoção muito forte. E agora revendo, aquela sensação volta tudo de novo. A gente é sobrevivente. Sobrevivemos a uma tragédia, mas a qual não gostaríamos de ser protagonistas.
Foco em universo de cada personagem
Luiz Felipe Gheller, CEO da plataforma Vakinha, a equipe começou a documentar tudo que estava sendo feito durante a enchente, até para possível prestação de contas das arrecadações. Nesse processo, perceberam que havia um material diferenciado.
— Achamos que valia a pena fazer o registro para deixar na cabeça das pessoas que não viram de perto ou que vão esquecer disso ao longo do tempo. Fazer uma espécie de homenagem para as pessoas que passaram por isso — explica Gheller.
Conforme Thiago Lazeri, o trabalho de escuta foi super espontâneo. O diretor destaca que o documentário não aborda a tragédia sob o ponto de vista de números ou perdas materiais — o foco é nos personagens, que ele também considera como autores do filme.
— Vamos muito para o particular, para o universo de cada personagem. Saber como a tragédia bateu neles e, no final, temos um documento histórico, que vem a partir do que aconteceu com as pessoas.
800 Milímetros deve ser disponibilizado online na próxima semana, de acordo com Gheller. Mais informações estão disponíveis no site 800mm.com.br.