Não tem jeito: toda adaptação do videogame para o cinema é vista com desconfiança. Na grande maioria das vezes em que Hollywood tentou adaptar algum título para as telonas, o resultado foi corrosivo. É só lembrar dos infames Super Mario Bros. (1993) e Street Fighter (1994). Alguns são sucessos comerciais, casos de Lara Croft: Tomb Raider (2001) e da franquia Resident Evil, mas que não escaparam das críticas negativas. Há poucas exceções, como o despojado Sonic: O Filme (2020) e Mortal Kombat (1995), cultuado pelo valor afetivo.
Uncharted: Fora do Mapa, que chegou aos cinemas na última quinta-feira (17), é mais um filme que tenta quebrar a sina das adaptações de games. Para isso, aposta no carisma da dupla Tom Holland, o Homem-Aranha do Universo Cinematográfico da Marvel (MCU), e Mark Wahlberg – astro de filmes como Boogie Nights (1997), Os Infiltrados (2006), O Vencedor (2011) e até o esquecido Max Payne (2008), que também é uma história saída dos videogames.
Com seu primeiro título lançado em 2007, Uncharted é uma franquia de sucesso das plataformas Playstation. Os jogos são protagonizados por Nathan “Nate” Drake, que, ao lado de seu mentor, Victor “Sully” Sullivan, viaja atrás de tesouros por lugares exóticos e inóspitos ao redor do mundo – sim, é um Indiana Jones millennial. A série de games sempre se caracterizou por dosar ações cinematográficas e enredo cativante (há diálogos engraçados, há reviravoltas no roteiro, há mistério), proporcionando uma experiência spielbergiana.
Aventura
Logo, Uncharted teria muito material para dar um salto dos games para os cinemas. Na adaptação, quem vive o protagonista, Nate, é Tom Holland, enquanto Wahlberg vive o carismático e escorregadio Sully. A trama de Fora do Mapa se passa antes dos acontecimentos dos jogos. No filme, o protagonista é apresentado como um jovem órfão, que não vê mais seu irmão, Sam, desde a pré-adolescência. Sorrateiro, ágil e bom de papo, ele trabalha como garçom e sobrevive com pequenos furtos.
Até que um dia o caçador de tesouros Sully cruza seu caminho. Ele é um sujeito engraçadinho e calculista. Um tiozão boa praça. Sully, que já trabalhou com o desaparecido irmão de Nate, recruta o jovem para buscar uma fortuna espanhola perdida da era das grandes navegações, que pertencia a Fernão de Magalhães e sua tripulação. Para Nate, também é uma oportunidade de tentar descobrir o paradeiro de Sam, que sumiu de vista buscando esse tesouro. Junta-se a eles a desconfiada caçadora de recompensas Chloe Frazer (Sophia Ali), que também quer o ouro.
Eles precisam lidar com Santiago Moncada (Antonio Banderas) – que acredita ser o herdeiro legítimo da fortuna – e sua implacável capanga, Braddock (Tati Gabrielle). O que se segue é uma aventura em diferentes partes do globo em que Nate e Sully tentam decifrar as pistas para encontrar o tesouro perdido. Porém, a jornada é traiçoeira e contém reviravoltas.
Dirigido por Ruben Fleischer (Venom e Zombieland), Fora do Mapa mantém sua trama sempre em movimento. Em seu punhado de cenas de ação, há bons momentos – em especial, a que referencia Uncharted 3: Drake’s Deception, com Nate caindo de um avião e se segurando nas cargas que também estão em queda –, assim como há sequências em que o espectador precisa abraçar a suspensão da realidade, das leis da física e da verossimilhança. Nesse caso, o clímax envolvendo uma perseguição com helicópteros carregando navios do século 16 é o que podemos classificar como “puxado”.
Carisma
Fora do Mapa não chega a fascinar como um filme de sua maior inspiração, Indiana Jones, nem trazer aquela sensação de ansiedade durante as perseguições. É um trabalho dolorosamente genérico. Os cenários contêm tanta computação gráfica que frustram a experiência. Há bastante imaginação em muitas cenas de ação, mas talvez fossem mais emocionantes se tivessem melhores efeitos visuais ou, quem sabe, lúdicos.
Tom Holland tem muito de Peter Parker em seu Nate, com um tanto de ingenuidade e de protagonista jovem descobrindo seus dons, enquanto nos games o personagem se destaca pelo seu cinismo e humor ácido. No quesito personalidades, é como comparar Dr. House com o Pequeno Príncipe. O trabalho de Holland não é dos piores, mas parece que ele leu o roteiro errado e está interpretando o Homem-Aranha novamente. Já Wahlberg é eficiente como Sully.
De qualquer maneira, o carisma da dupla principal segura Fora do Mapa e entrega um filme ok. Nada revolucionário, nada fora da curva, apenas uma diversão fugaz. Não chega a ser uma catástrofe como outras adaptações dos games, mas também não foi desta vez que um longa vindo dos consoles se sobressaiu. Quem sabe na próxima, já que Fora do Mapa é cumpridor o suficiente a ponto de pensarem em uma sequência (assista aos pós-créditos).