Produzida pela Netflix, a nova versão cinematográfica da influente peça de Mart Crowley, The Boys in the Band, de 1968, traz a reconstituição das lutas iniciais da comunidade gay e sua linguagem amarga e ofensiva da época. O elenco do filme é o mesmo da recente montagem do espetáculo na Broadway, em 2018.
Embora alguns daqueles insultos gays e raciais fossem difíceis de pronunciar, o ator Jim Parsons e seus parceiros de elenco acreditam que era necessário usar termos a fim de honrar os diálogos de Crowley e fazer com que o público sinta o mal-estar experimentado pela marginalização da comunidade gay naquela época.
A história acompanha um grupo de homens um ano antes dos históricos tumultos de Stonewall, no bairro nova-iorquino de Greenwich Village, que consolidaram o movimento de libertação gay. Parsons, cujo personagem, Michael, utiliza boa parte dos insultos raciais, gays e antissemitas, admite que não se sentiu à vontade:
— É feio. Eu mesmo jamais pronunciei algumas daquelas palavras sem uma profunda preocupação e uma sensação de náusea no estômago que a acompanha.
Embora desconfortável, Parsons se convenceu de que era mais importante adotá-la do que ignorá-la:
— A parte triste, acho, é que por causa do que estamos falando, o objetivo é exatamente este. E a gente precisa chegar lá para compreender como pôde acontecer um momento como aquele e onde, por que este personagem decide falar dessa maneira e perceber o incômodo que provoca.
O diretor Joe Mantello, que também dirigiu a peça, concorda que preservar a linguagem ofensiva ajuda a compreender a história e a condição dos personagens:
— Não acredito que apagar as coisas que nos fizeram sentir mal-estar seja um progresso. A linguagem ofensiva não foi mantida para causar sofrimento.
Responsabilidade
O diretor acredita que existe a responsabilidade de refletir sobre a história original e o tempo em que ocorreu.
— Minha responsabilidade é com a história. E a história mostra: como este é o custo da opressão, ele nos permite agir de uma maneira impiedosa — afirma Mantello.
Matt Bomer, que faz o papel do amigo de Michael, Donald, diz que ficou muito chocado durante os ensaios quando as palavras foram pronunciadas, mas o peso delas foi perfeito quando ele entrou no palco.
— Ouvi um ruído gutural na primeira vez em que um destes insultos foi usado, e então lembrei e me dei conta de como estas palavras são poderosas. Acho que serviu para nos lembrar sempre que o fizermos viver. O público nos lembrou de como estas palavras eram e são poderosas.
No papel de Bernard, único negro integrante do grupo, Michael Benjamin Washington acredita que a linguagem, embora muito forte, é necessária para ser fiel e autêntica.
— Se uma peça é ambientada em 1968 e você é um personagem preto e as pessoas fazem de conta de que não é preto, ela não está dizendo a verdade. Como se eu escrevesse uma peça sobre 2020, e não introduzisse o movimento Vidas Negras Importam — afirma Washington.
O filme de 1970
Antes de se consagrar na linha de frente da Nova Hollywood com os sucessos Operação França (1971) e O Exorcista (1973), William Friedkin dirigiu a adaptação para o cinema de Os Rapazes da Banda, lançada em 1972. Assim como na nova versão, o longa de Friedkin contou como mesmo elenco da montagem teatral original que impactou o circuito off-Broadway em 1968.