Na mira de criminosos, o juiz Gustavo Ferreira (Gustavo Werneck) vive enclausurado em um tribunal. O magistrado dorme, se alimenta, lê livros e realiza alguns exercícios físicos em seu gabinete, além de tomar banho nos banheiros do fórum. No tribunal, ele exerce seu ofício e conduz audiências. Sob vigilância constante, seja por câmeras ou acompanhado por seguranças armados enquanto trabalha ou dorme, nunca deixa as dependências do prédio.
Foro Íntimo, drama psicológico que entra em cartaz nesta quinta-feira (26), no Cine Bancários (às 19h30min), acompanha 24 horas desse juiz confinado em seu próprio tribunal. Trata-se do primeiro longa-metragem do cineasta Ricardo Mehedff, que também assina o roteiro ao lado de Guilherme Lessa. Antes, realizou curtas como Um Branco Súbito (2002) e Noite Aberta (2004), atuou como montador e editou trailers para o cinema brasileiro e de Hollywood. O filme foi rodado em preto e branco durante os 16 dias de recesso do Fórum Lafayette, de Belo Horizonte (MG).
Como ponto de partida para a trama, Mehedff se inspirou em matérias sobre juízes vivendo sob proteção policial, mantidos confinados em seus gabinetes para evitarem os riscos de serem alvos de atentados durante seus deslocamentos. É justamente essa a situação do juiz Gustavo Ferreira. Com sua família sendo deslocada para a Argentina, ele é obrigado a viver em seu gabinete por causa de ameaças de traficantes e estelionatários sob seu julgamento, o que inclui um ex-senador.
Nas 24 horas em que o filme se passa, o cerco ao juiz se torna ainda mais sufocante – aumentando sua paranoia e angústia. Com os laços afetivos deteriorados, até as atividades mais corriqueiras geram enorme apreensão ao magistrado, como uma ida ao banheiro.
Rodado inteiramente em uma mesma localidade, Foro Íntimo é um filme concentrado na figura do juiz. Com o personagem aprisionado naqueles cenários monótonos de repartição pública – corredores, gabinete e banheiros –, o longa se torna sensorial, especialmente claustrofóbico. É um drama silencioso, com poucos diálogos, mas com uma inquietação crescente à medida que a narrativa avança. Todavia, Mehedff consegue fisgar o espectador por essa tensão, proporcionando um estado de vigilância constante ao longa.
Curiosamente, Foro Íntimo começou a ser desenvolvido antes dos questionamentos à parcialidade do sistema judiciário brasileiro. Gustavo Ferreira é um juiz com predisposição a incriminar o réu que deveria julgar imparcialmente. Trata-se de um protagonista ambíguo, bastante humano e próximo da realidade.