Nome fundamental do cinema contemporâneo, Werner Herzog chega nesta segunda-feira (23) a Porto Alegre como um dos astros do Fronteiras do Pensamento 2019. O diretor e roteirista alemão proferirá a antepenúltima conferência da temporada às 19h45min, no Salão de Atos da UFRGS (Avenida Paulo Gama, 110). Antes, às 18h, na Sala Redenção, participará de um encontro com os cinéfilos (em inglês, sem tradução). Os passaportes para a palestra noturna estão esgotados, mas o evento preliminar terá senhas disponibilizadas no local às 17h.
Aos 77 anos, Herzog vive um momento prolífico e profícuo. As possibilidades trazidas pelas plataformas de streaming e, antes, pelo vídeo digital e mesmo pelo 3D abriram horizontes tanto para a realização quanto para a circulação de filmes, o que o cineasta de origem bávara aproveitou com uma energia renovadora comum aos artistas movidos pela pesquisa que desbrava novas fronteiras da linguagem. Sua inquietação é proporcional à capacidade de cavoucar as profundezas da alma humana, o que tem transformado visitas a sítios históricos (Into the Inferno, de 2016, e A Caverna dos Sonhos Esquecidos, 2010), ensaios sobre grandes temas, atuais ou perenes (Ao Abismo, 2011, e Eis os Delírios do Mundo Conectado, 2016), e encontros com grandes personagens, célebres ou não (Nomad, 2018, e Meeting Gorbachev, 2017), em construções estéticas de alta potência e impacto.
No fundo, as premissas desses longas-metragens, assim como as de suas maiores obras (veja abaixo), são apenas pontos de partida para uma mesma jornada de descoberta do que é essencial em nossa humanidade – sonhos e pesadelos, vontades e recalques, desejos de socialização e isolamento.
Seu gosto pelos casos extremos (a loucura, o desafio à natureza, a viagem mais radical) se justifica porque é neles que essa essência se deixa revelar.
É por isso que, mesmo distantes das figuras aparentemente sui generis a desfilar pelos seus filmes, nos sentimos próximos de seus medos e de suas aspirações. Klaus Kinski, ator de Nosferatu (1979) e personagem de Meu Melhor Inimigo (1999), potencializa aquilo que guardamos nos recônditos mais obscuros de nossa intimidade – e que só um grande artista consegue desvelar.
“Por que você faz o que faz?” Essa questão que parece banal mas que muitas vezes se mostra complexa é uma espécie de guia para Herzog nos encontros com essas figuras, sejam elas homens pré-históricos de Chauvet (A Caverna dos Sonhos Esquecidos), nômades do Saara (Pastores do Sol, de 1989) ou exploradores europeus da Amazônia (Fitzcarraldo, 1972). Suas construções podem ser referenciadas no mundo real ou inteiramente inventadas – a medida de sua ficcionalização pode variar; depende, em alguma parte, da resposta à pergunta que abre este parágrafo.
A obra do cineasta alemão não obedece a limites de gênero e representação. Um de seus maiores méritos é justamente a capacidade de moldar o discurso às especificidades de cada protagonista, de cada projeto, de cada contexto retratado. E, fundamentalmente, de se readaptar, conforme o objeto filmado se altera. Mesmo que as relações sociais tenham passado por mudanças, as tecnologias evoluam significativamente e os 80 anos de idade se avizinhem.
Os próximos
Depois de Herzog, o Fronteiras do Pensamento Porto Alegre 2019 receberá Contardo Calligaris (em 21/10) e Luc Ferry (11/11). O seminário é apresentado por Braskem, com patrocínio Unimed Porto Alegre e Hospital Moinhos de Vento, parceria cultural PUCRS e empresas parceiras Unicred e CMPC. Universidade parceira UFRGS e promoção Grupo RBS. Outras informações em fronteiras.com.
10 filmes fundamentais
Fata Morgana (1971)
Um ensaio documental rodado nos desertos africanos cuja narrativa emula as distopias da ficção científica para retratar, com algum pessimismo, a relação homem-natureza ao longo do tempo.
Aguirre, a Cólera dos Deuses (1972)
Neste épico rodado entre o Peru e a Amazônia brasileira, um dos filmes da consagração internacional de Herzog, Klaus Kinski lidera uma expedição espanhola rumo ao Eldorado durante o século 16.
O Enigma de Kaspar Hauser (1974)
Profundo e fascinante estudo de personagem que o cineasta alemão desenvolveu a partir da história real de um garoto que apareceu em Nuremberg em 1828 após anos vivendo em absoluto isolamento.
Nosferatu, o Vampiro da Noite (1979)
Livre adaptação do Drácula de Bram Stoker, traz novamente Kinski em grande atuação, em um filme que associa o vampirismo à chamada Peste Negra, que assolou a Europa no século 14.
Fitzcarraldo (1982)
Premiado em Cannes, indicado ao Globo de Ouro, este novo épico amazônico narra a loucura de um explorador que precisa abrir caminho em meio à selva para realizar o sonho de erguer um teatro.
Lições da Escuridão (1992)
Pelo olhar de Herzog, o inferno após um acidente em campos de petróleo do Kuwait surge em imagens de grande plasticidade e beleza.
Meu Melhor Inimigo (1999)
O cineasta repassa sua conturbada relação pessoal com Klaus Kinski (morto em 1991), com quem realizou cinco longas-metragens.
O Homem Urso (2005)
O mais popular dos documentários de Herzog busca compreender as motivações do ativista Timothy Treadwell, que se isolou no Alasca para viver perto dos ursos – e acabou devorado por eles.
Além do Azul Selvagem (2005)
“Falso documentário de ficção científica” no qual um alienígena narra a triste derrocada de seu planeta – e sua surpreendente relação com a Terra.
A Caverna dos Sonhos Esquecidos (2010)
Um dos melhores, se não o melhor uso do 3D no cinema. Um filme que apresenta as pinturas rupestres mais antigas feitas pelo homem (há 30 mil anos, na caverna de Chauvet, na França) e busca entender essas expressões com um olhar de perspectiva que destaca sua força e humanidade.