Quando eixou o Rio Grande do Sul, há 15 anos, em direção a voos mais altos no centro do país, o ator porto-alegrense Julio Andrade tinha uma preocupação lhe martelando a mente.
– Minha grande dificuldade era falar “você”. Não saía natural, parecia que não era eu – conta em entrevista a ZH, descrevendo na sequência sua atual neura: – Agora, volto para cá e praticamente não consigo falar “tu”.
O retorno ao Estado ganha ainda mais simbolismo porque a carreira de Julio tem muito a ver com a Casa de Cinema de Porto Alegre. A parceria com a produtora foi renovada com Aos Olhos de Ernesto, filme de Ana Luiza Azevedo que conta com participação do ator no papel do filho do protagonista, vivido pelo uruguai o Jorge Bolani.
A primeira vez que o nome de Julio Andrade apareceu nos créditos de uma produção da Casa de Cinema foi em A Importância do Currículo na Carreira Artística, curta dirigido pela mesma Ana Luiza e transmitido durante os Contos de Inverno da RBS TV em 2001 – o personagem, um ator em busca de emprego (“basicamente o que eu estava vivendo na época”), coincidentemente levava o nome de Ernesto.
Atualmente no ar à frente da série da Globo Sob Pressão e escalado para a quarta temporada de 1 Contra Todos, da Fox, produção nacional mais assistida na TV por assinatura, com retorno previsto para 2019, vem colecionando papéis marcantes e troféus – do Kikito do Festival de Gramado ao Melhores do Ano do Domingão do Faustão, passando por duas indicações ao prêmio de melhor ator no prestigiado Emmy Internacional, por 1 Contra Todos.
Carreira deslanchou com papel de Gonzaguinha
frente das câmeras que Julio se sente mais à vontade. De preferência, em séries ou filmes, produções que permitem que o ator se aprofunde – ou se “emburaque”, em suas palavras – no personagem. No cinema, começou a carreira em produções locais de prestígio, como os longas O Homem que Copiava (2003), Meu Tio Matou um Cara (2004), ambos de Jorge Furtado, Sal de Prata (2005) e 3 Efes (2007), esses dois dirigidos por Carlos Gerbase. Mas foi em Gonzaga – De Pai pra Filho (2012), de Breno Silveira, no qual interpreta o cantor e compositor Gonzaguinha, com direito a transformação física surpreendente, que Julio seu grande salto na carreira.
– Gosto de ter muito cuidado com as coisas. Tentei fazer novela, mas não foi muito legal, porque você trabalha com certa urgência. Acho bacana você fazer um personagem, contar a sua história, levá-lo para outras situações, outras épocas, não saber bem para onde ele está indo, e é isso que me atrai nas séries – conta Julio.
Além da parceria com a Casa de Cinema, Julio tem forte ligação também com o diretor José Luiz Villamarim. Sob a direção do mineiro, fez as minisséries O Rebu (2014) e Justiça (2016), além do longa Redemoinho (2016), estreia de Villamarim no cinema.
– Se o Villamarim me convida, aceito antes de ler o roteiro. É sempre um personagem muito difícil, algo muito desafiador, e gosto disso. O cara é gênio, você trabalha com quem sabe tudo – conta.
De volta a Porto Alegre para filmar as duas cenas em que aparece no filme de Ana Luiza Azevedo, Julio trata o trabalho em Aos Olhos de Ernesto quase como um tributo à sua história e à importância da Casa de Cinema para ela. Apesar da dificuldade em usar o pronome típico dos gaúchos, o ator diz que, mais do que trabalhando, está “celebrando”.
– Quando venho para cá, volto às minhas raízes. Não é só um filme, é um encontro familiar, um gesto de gratidão. Volto para os curtas com o (diretor) Gustavo Spolidoro, para os amigos que fiz, para o lugar em que comecei.