Nelson Pereira dos Santos, cineasta que morreu neste sábado, aos 89 anos, tinha como o Rio Grande do Sul uma longeva ligação afetiva.
— Meu primeiro longa-metragem, Rio 40 Graus, teve sua primeira exibição pública em Porto Alegre, por iniciativa do saudoso P.F. Gastal, e ali ganhou vida — disse em entrevista a ZH quando foi homenageado no Festival de Gramado de 2006, lembrando o apoio do jornalista e crítico gaúcho ao clássico de 1955 que viria a influenciar as gerações seguintes de cineastas brasileiros.
O diretor esteve pela primeira vez no Estado aos 15 anos, acompanhado a irmã e o cunhado, militar à época cumprindo serviço em São Luiz Gonzaga.
— Aprendi a gostar de churrasco e chimarrão — lembrou Nelson, que era sempre visto com a cuia na mão durante aquela semana que passou na serra gaúcha.
Foi nas suas visitas ao Sul que Nelson conheceu a obra de Erico Verissimo.
— O Erico fez parte da minha dieta cultural. Livros como Clarissa e Saga me marcaram muito — lembrou. — Também foi muito importante para mim a Editora Globo, com suas traduções de clássicos da literatura européia, Stendhal, Tolstói e Thomas Mann, entre outros de meus preferidos.
Em Gramado, Nelson Pereira dos Santos ergueu o Kikito de melhor filme em 1975, com O Amuleto de Ogum (1975) — longa com o qual disputou também a Palma de Ouro no festival de Cannes. O cineasta, que marcou sua trajetória com destacadas adaptações de obras referencias da literatura brasileira — como Vidas Secas e Memórias do Cárcere, ambos de Graciliano Ramos, A Terceira Margem do Rio, de Guimarães Rosa, e Tenda dos Milagres, de Jorge Amado — havia sido eleito em março daquele ano para a Academia Brasileira de Letras. Foi primeiro cineasta a alcançar tal reconhecimento. E sua primeira contribuição como imortal foi sugerir a criação de um prêmio destinado ao melhor roteiro para o cinema adaptado de um autor nacional.
— Ocupo a cadeira que foi de Castro Alves e que também foi de Euclides da Cunha, autor de Os Sertões, obra que lançou questões que fundaram o Cinema Novo — comentou Nelson na ocasião, referindo ao movimento estético do qual foi pioneiro e que projetou o cinema brasileiro internacionalmente.