No próximo domingo, Barry Jenkins, de 37 anos, pode se tornar o primeiro negro a ganhar um Oscar de direção. Ele é o quarto a concorrer na categoria, por Moonlight – Sob a Luz do Luar, que estreou esta semana no Brasil e concorre a oito Oscar, além de cinco Independent Spirit Awards, cuja premiação será no sábado.
O filme, com roteiro de Jenkins, baseado numa história de Tarell Alvin McCraney, conta a história de Chiron (interpretado por Alex R. Hibbert, Ashton Sanders e Trevante Rhodes) em três fases distintas e se passa na comunidade pobre no subúrbio de Miami onde tanto o cineasta quanto McCraney cresceram nos anos 1980, ambos com mães viciadas em crack. De forma delicada, o filme acompanha Chiron enquanto ele tenta descobrir quem é.
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Abaixo, leia uma entrevista com o diretor.
O que fez com que quisesse contar essa história?
O cinema me deu minha voz verdadeira, me tornou um ser humano completo. Mas nunca tive chance de voltar ao lugar onde nasci e cresci. Quando li Tarell, vi que ele tinha feito o que eu queria. Também havia a personagem de Naomie Harris, Paula, que foi inspirada na mãe de Tarell. Descobri que tínhamos vivido as mesmas coisas com nossas mães.
Sendo tão pessoal, foi mais difícil?
Extremamente. Mas foi terapêutico. Foram 25 dias muito intensos. Nós estávamos no exato lugar onde as coisas aconteceram. Foi muito visceral, catártico e terapêutico. Acho que algumas coisas não teriam acontecido se não fosse visceral e pessoal.
Tentava relaxar todos os dias ou foi só no fim?
Só no fim. Meu corpo não aguentou no final. Se tivéssemos de fazer 25 dias com Naomie Harris como minha mãe, teria sido impossível.
Sua mãe viu o filme?
Ela viu tudo o que envolvia o filme, exceto o filme em si. Ela assistiu às entrevistas que Naomie Harris fez para o longa. Certamente, ela tem orgulho de mim e do filme, mas há uma grande diferença entre ter orgulho porque contei essa história e sentar-se para assistir, de alguma forma, a si mesma.
O que espera que as pessoas tirem do filme?
Supomos saber tudo sobre personagens como Chiron, ou Paula. Julgamos essas pessoas sem conhecê-las. Podemos ver essas pessoas no metrô ou no ônibus e achar que não temos nada em comum com elas. Aquele homem musculoso, de rosto fechado, nunca foi um menininho que amava dançar na frente do espelho. Roubamos dessa pessoa esse aspecto de sua humanidade. Então, espero que, depois de assistir ao filme, da próxima vez que encontrarem alguém assim, pensem quem aquela pessoa poderia ter sido, ou quem foi. Talvez seja apenas uma fachada, erguida para se proteger do mundo exterior.
Como você se protegia?
Nos esportes. E não falava. O fato de Chiron falar tão pouco está mais baseado em mim do que em Tarell. Achava que, se mostrasse qualquer coisa, exibiria fraqueza.
Espera que o público branco tenha uma percepção diferente do público negro?
O filme tem muitos aspectos diferentes. O que você traz ao cinema dita sua recepção a elementos do filme. A linguagem, por exemplo: há coisas que não dá para entender a não ser que se tenha crescido num lugar com linguagem semelhante. Vivemos nesse mundo em que precisamos entender tudo. Tudo precisa ser completamente sobre nós. E isso rouba das pessoas que fazem arte, que criam histórias, a especificidade das próprias vozes. Muitas vezes, quando se fala da experiência negra no cinema, o tom é mais agressivo.
Moonlight é mais suave. Por quê?
Só porque o filme fala de um menino negro, pobre, com uma mãe viciada em crack e que também talvez seja gay, supõem-se certas coisas sobre como essa história deve ser contada. Para mim, trata-se sempre da humanidade e da consciência dos personagens. E não queria que as expectativas do que são esses temas, ou de como essas questões normalmente se manifestam, ditassem como contamos essa história. Em geral, seria um filme mais austero, com câmera na mão, cinza. Mas Miami é bonita. Não vi razão para negar essa beleza.
O filme mostra uma forma diferente de masculinidade porque existe uma imagem de como alguém como Chiron é. Era importante desconstruir esse estereótipo?
Não se vê esse personagem representado com muita frequência no cinema ou na TV. Quando existe, é um retrato estereotipado. Trevante Rhodes, o ator, para mim, desencadeou a desconstrução, só por ser como é. No seu teste para outro papel, eu o julguei, como o público faz. Pensei: "Esse cara é muito masculino, musculoso. Não pode ser sensível, vulnerável". Mas percebi um poço de sensibilidade e vulnerabilidade. E vi que o estava julgando baseado puramente em seu visual. Se fiz isso e mudei de opinião no teste, acho que o público pode fazer o mesmo.