Se há um filme brasileiro que fez barulho em 2016, esse filme é Aquarius. Lançado em Cannes sob manifestações da equipe contra o impeachment, o longa de Kleber Mendonça Filho recebeu prêmios internacionais e levou mais de 50 mil espectadores em seu fim de semana de estreia, a segunda maior abertura nacional do ano. A indicação de Pequeno segredo como representante brasileiro na disputa por uma vaga entre os nomeados ao Oscar de melhor filme em língua estrangeira gerou, portanto, uma inevitável polêmica.
Minutos após a divulgação de que o longa de David Schurmann havia desbancado o seu Aquarius, o diretor Kleber Mendonça Filho se pronunciou pelo Facebook. O cineasta disse que "é possível" que a indicação esteja "em total sintonia com a realidade política do Brasil", o que a torna "coerente e já esperada". Sem criticar explicitamente a decisão, Kleber diz que Aquarius "é um filme que já faz parte da cultura e desse tempo, num ano difícil no nosso país", e que o longa é "forte como agente cultural, social e produto da nossa indústria do entretenimento".
Leia mais:
"Sempre acreditei em Pequeno Segredo para dialogar com o Oscar", diz diretor
Como é escolhido o filme que representa o Brasil no Oscar
Aquarius fica fora da disputa ao Oscar de 2017
Anna Muylaert, diretora do filme brasileiro indicado no ano passado, Que horas ela volta?, também se pronunciou sobre a decisão, que ela chamou de "golpe": "É natural imaginar que Kleber Mendonça Filho esteja agora chateado com esse golpe relativo a escolha de um outro filme para comissão do Oscar. Imagino que esteja mesmo", diz a diretora em seu perfil no Facebook, para completar que a escolha "é antes de tudo uma mudança de rumo nos paradigmas de qualidade que viemos construindo todos nós juntos há anos". Ao fim do texto, ela questiona: "O que esperar do futuro? Que os amigos de Michel Temer sejam daqui pra frente os grandes autores do cinema brasileiro – independentemente de sua qualidade ou mesmo de sua representatividade junto ao público? A resposta é triste e é: provavelmente sim", escreveu Anna, que havia retirado da corrida seu próprio filme, Mãe só há uma, em apoio ao longa de Kleber Mendonça Filho.
O diretor gaúcho Jorge Furtado caracteriza como "erro grosseiro" a não indicação de Aquarius. Contundente crítico do impeachment, no entanto, ele diz que relacionar a nomeação de Pequeno segredo a motivações políticas seria "especulação pura".
– Não vi o filme indicado, nem tenho nada contra, até porque ninguém viu, então é impossível ter algo contra, mas me parece óbvio que a não indicação de Aquarius é um absurdo, um erro grosseiro – diz, antes de elencar méritos do filme de Kleber Mendonça Filho: – É um filme que representou o Brasil em Cannes, ganhou vários festivais, levou muita gente para o cinema, tem uma crítica excelente, tem a Sonia Braga, que é famosa internacionalmente, já tem data de distribuição nos Estados Unidos. Foi, obviamente, um erro.
Outro diretor que se manifestou foi Aly Muritiba, que também retirou seu filme, Para minha amada morta, da disputa. "Uma das piadas da qual não participei. Nunca reconheci esta comissão: o golpe estava anunciado há tempos. E o Bruno Barreto ainda ousou dizer que retiramos nossos filmes por medo do Aquarius... Chupa Bruno Barreto! Medo de quê????", escreveu.
A lista final dos concorrentes na categoria de melhor filme estrangeiro será definida pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, com anúncio previsto para 24 de janeiro de 2017. A cerimônia de premiação está marcada para 26 de fevereiro, em Los Angeles.
Produções que estavam na briga pelo título de representante brasileiro no Oscar neste ano
A despedida, de Marcelo Galvão;
Mais forte que o mundo, de Afonso Poyart;
O outro lado do paraíso, de André Ristum;
Pequeno segredo, de David Schurmann;
Chatô – O rei do Brasil, de Guilherme Fontes;
Uma loucura de mulher, de Marcus Ligocki Júnior;
Aquarius, de Kleber Mendonça Filho;
Nise – O coração da loucura, de Roberto Berliner;
Vidas partidas, de Marcos Schetchman;
O começo da vida, de Estela Renner;
Menino 23: Infâncias perdidas no Brasil, de José Belisario Cabo Penna Franca;
Tudo que aprendemos juntos, de Sérgio Machado;
Campo Grande, de Sandra Kogut;
A bruta flor do querer, de Andradina Azevedo e Dida Andrade;
Até que a casa caia, de Mauro Giuntini;
O roubo da taça, de Caito Ortiz
O Brasil na disputa do Oscar de filme estrangeiro *
1963 – O pagador de promessas, de Anselmo Duarte
1996 - O quatrilho, de Fábio Barreto
1998 - O que é isso, companheiro?, de Bruno Barreto
1999 - Central do Brasil, de Walter Salles
* Em 1960, Orfeu do Carnaval, produção filmada no Rio de Janeiro ganhou o Oscar representando a França.
Produções indicadas pelo Brasil no anos 2000 que não foram selecionadas para a disputa do Oscar de filme estrangeiro
2010 – Salve geral, de Sérgio Rezende
2011 – Lula, o filho do Brasil, de Fábio Barreto
2012 – Tropa de elite 2: O inimigo agora é outro, de José Padilha
2013 – O palhaço, de Selton Mello
2014 – O som ao redor, de Kleber Mendonça Filho
2015 – Hoje eu quero voltar sozinho, de Daniel Ribeiro
2016 – Que horas ela volta?, de Anna Muylaert
Conheça alguns dos concorrentes à indicação ao Oscar de melhor filme estrangeiro em 2017
Austrália – Tanna, de Martin Butler e Bentley Dean
Bélgica – D'Ardennen, de Robin Pront
Alemanha – Toni Erdmann, de Maren Ade
Espanha - Julieta, de Pedro Almodóvar
Venezuela – De longe te observo, de Lorenzo Vigas
Japão – Nagasaki: Memories of my son, de Yôji Yamada
Holanda – Tonio, de Paula van der Oest
Áustria – Stefan Zweig: Farewell to Europe, de Maria Schrader
Ucrânia – Ukrainian sheriffs, de Roman Bondarchuk