Morreu nesta terça-feira (19) o dramaturgo, contista e romancista gaúcho Julio Zanotta, aos 74 anos. Ele foi um autor de peças contundentes e um dos fundadores do grupo teatral Ói Nóis Aqui Traveiz. Também foi livreiro e, entre 1994 e 1997, presidente da Câmara Rio-grandense do Livro. Na década de 1970, foi exilado pela ditadura militar, sendo forçado a deixar o Brasil. Mais tarde, no início dos anos 2000, recebeu a anistia política.
Zanotta foi diagnosticado com um câncer de próstata há cerca de um ano e meio, mas foi curado. Depois, teve um câncer no fígado. Ele faleceu por volta das 21h desta terça-feira, em uma clínica de Porto Alegre.
Filha mais velha do artista, Maíra Bae, 48 anos, diz que o pai tinha consciência que enfrentava os últimos dias de vida, e o fez com tranquilidade.
— Quando ele soube do diagnóstico, não quis fazer quimioterapia, não quis ser sedado. Ele queria sentir a morte. Ele teve êxito em se manter ciente. Ele quis sentir — diz Maíra.
Alguns textos que Zanotta escreveu permanecem inéditos e, segundo a filha, devem ser publicados postumamente. O filho Bernardo Zanotta, 28 anos, que é cineasta, filmou um documentário retratando seus últimos instantes, incluindo idas ao cemitério e a confecção do próprio caixão, outro trabalho que deve ser mostrado ao público.
— Ele vinha escrevendo bastante nos últimos anos e tinha uma série de livros que gostaria de terminar. Ele tinha muitas coisas inéditas — conta Maíra.
Além de Maíra e Bernardo, Julio Zanotta deixa os filhos Gabriel, 31 anos, e Julia, 26, além das netas Antonella, oito anos, e Sophia, 16, e a companheira Elaine, 66 anos.
Haverá uma homenagem para ele no 31º Porto Alegre em Cena, que ocorrerá entre os dias 23 de novembro e 1º de dezembro. No dia 29, uma sexta-feira, às 19h, na Casa Baka (Rua da República, 139), a Companhia Espaço em Branco vai promover oito horas de leitura das obras de Julio Zanotta. O evento é gratuito.
O velório ocorre nesta quarta-feira (20), na capela 9 do Cemitério Ecumênico João XXIII, em Porto Alegre, entre 13h e 18h, e será aberto ao público.
Trajetória
Nascido em Pelotas em 18 de agosto de 1950, Zanotta iniciou a carreira de escritor ainda na adolescência.
Aos 20 anos, foi jornalista do Diário de Notícias. Ele se envolveu no movimento da ditadura militar (1964-1985) por conta do conteúdo de suas peças, como As Cinzas do General, que também foi adaptada para os quadrinhos.
A obra fez críticas diretas ao regime militar. O texto chegou a ser censurado, mas foi liberado posteriormente, com cortes. Com isso, o artista precisou deixar o país em 1973.
Ainda na década de 1970, já de volta ao país, passou a trabalhar com o teatro e foi um dos fundadores do grupo Ói Nóis Aqui Traveiz. Neste período, escreveu as primeiras peças encenadas pelo grupo em 1978: A Divina Propoção e A Felicidade Não Esperneia Patati-Patatá.
Em 1981, Zanotta deixou novamente o país e ficou dois anos viajando pela América Latina, apresentando a peça Marília.
Na década de 1990, tornou-se empresário do ramo livreiro e abriu uma livraria em Porto Alegre, com filiais em Florianópolis e Curitiba.
Entre 1994 e 1997, foi presidente da Câmara Rio-grandense do Livro (CDL). Nesse período, lançou suas primeiras obras de ficção: Louco (1995), Teatro Lixo (1996) e E Nas Coxilhas Não Vai Nada? (1997).
Na pandemia, ele publicou outras duas obras de ficção inéditas: Caralho Voador e Pisa Leve (Giostri), ambas lançadas em novembro de 2021 no Memorial do Theatro São Pedro, em Porto Alegre. Este último, inclusive, chegou a ser indicado ao prêmio Jabuti, em 2022.
No ano seguinte, a editora Giostri publicou 10 novos livros, com obras clássicas como Milkshakespeare, Baudelaire, Nietzsche no Paraguai, além de novas publicações, como A Escola de Escritores e Teatro Cruel.
Em 1998, recebeu o título de Cidadão Honorário de Porto Alegre.