Com 17 anos, Flávio Wild fazia um curso de fotografia do Colégio de Aplicação. Empunhando uma câmera Olympus OM10, ele realizou registros analógicos de Porto Alegre, entre setembro e outubro de 1981. Em seguida, Flávio se formou em arquitetura, porém, mais tarde, percebeu que sua área era o design gráfico – na qual conquistou oito vezes o prêmio Açorianos de Literatura nas categorias capa e projeto gráfico –, além da fotografia.
Ao longo de 35 anos, ele trocou de endereços várias vezes, mas os negativos daqueles registros de POA sobreviveram às mudanças e ao tempo. Após reencontrá-las em uma gaveta, restaurou e digitalizou essas imagens em alta resolução e inscreveu no Concurso de Fotografias da Associação de Amigos do Museu de Arte do Rio Grande do Sul Ado Malagoli. Foi selecionado. Esses fragmentos da capital gaúcha de três décadas atrás estão expostos na mostra POA 81, no Bistrô do Margs, até 30 de junho.
Na coletânea de fotos, é possível observar cenas do cotidiano da Capital – como engraxates trabalhando na Praça da Alfândega e crianças na Redenção – e da cidade em construção – a "rampa" do Centro Administrativo do Estado ainda não havia sido finalizada. Porém, com imagens como a de moradores de rua em frente à Igreja do Rosário e a de um barraco construído no Arroio Dilúvio, a exposição aponta que algumas mazelas da cidade persistem.
– Nos dias de hoje, nos preocupamos com a cidade contemporânea da violência, vemos a injustiça social e os contrastes, mas observando essa coletânea, percebemos que naquela época já tinha. Ali na esquina da Ipiranga com a Santana, no Arroio Dilúvio, registrei um morador de rua com uma barraquinha armada. É o tipo de cena que faz a gente pensar que, durante todo esse tempo, a desigualdade social só piorou. Passamos por governos de inclusão social, depois mudaram, e a gente fica pensando por quanto tempo será necessário para isso ser revertido, se é que é possível – reflete Flávio. – Era uma cidade mais tranquila para a convivência, mas, ao mesmo tempo, tu vês que já tinha essas coisas que durante o tempo se agravaram, como em todas as grandes cidades brasileiras – completa.
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Para o fotógrafo, os registros simbolizam um olhar tentando descobrir uma carreira:
– É como diz aquela frase do Dylan Thomas (poeta galês): "retrato do artista quando jovem cão". Eu estava me descobrindo. Era um olhar de um adolescente que ainda não tinha uma formação acadêmica, mas contava com seu enquadramento e sua busca de elementos fotográficos, que já estavam revelando alguma coisa que fui descobrir mais tarde.
Conforme Flávio, o preto e branco das fotos realçam a nostalgia.
– Não podíamos fotografar em filme colorido porque não havia esse processo de revelação no laboratório da UFRGS que a gente usava. Só podíamos revelar filmes preto e branco. Se esses negativos tivessem sido coloridos talvez não tivessem a mesma força do preto e branco, que tira a imagem um pouco da realidade e remete mais ao artístico. Se as fotos fossem coloridas não seriam tão nostálgicas – destaca.
POA 81
Exposição reúne coletânea de fotografias analógicas de Porto Alegre registradas por Flávio Wild em 1981.
Bistrô do Museu de Arte do Rio Grande do Sul – Margs (Praça da Alfândega, s/nº). De segunda a sexta, das 11h às 21h. Sábados, domingos e feriados, das 11h às 19h. Até 30 de junho.