A propósito da coluna da última segunda-feira e da lembrança do espetacular “cheirinho de Carnaval emanado dos lança-perfumes”, o nosso leitor Edilberto Luiz Hammes, de São Lourenço do Sul, “apenas como curiosidade”, nos conta algo que, segundo ele, “lembra sempre com saudade”. Edilberto escreveu:
“Em 11 de fevereiro de 1961, conheci Iára, que se tornaria minha namorada, minha noiva e minha esposa. Eu morava em Pelotas, e ela, em Porto Alegre, ambos estudantes às vésperas de entrar na universidade. E quis o destino que ela viesse passar curtos dias de férias em São Lourenço do Sul, ela na casa de sua madrinha, e eu na da minha, ambas lourencianas e praticamente vizinhas. Naquela manhã, sábado de Carnaval, nos vimos pela primeira vez na praia."
"Seus olhos verdes me cativaram e combinamos de nos encontrar no primeiro baile de Carnaval da cidade no fechado Clube Comercial, do qual ambas as madrinhas eram associadas. E assim foi. No último dia de Carnaval, o de encerramento do curto período de momo, comprei um lança-perfume para atirar seu jato finíssimo e gelado nas costas da menina que seria o amor de minha vida. "
O rodouro de metal inquebrável, fabricado pela Rhodia, era mais caro e optei pelo mais barato, de vidro, o Colombina, que guardo até hoje como lembrança de uma parceria que dura quase 60 anos, nos trouxe seis filhos e tem o nome dela escrito no rótulo, com minha caligrafia, para que nunca mais esquecesse seu nome. Os tempos eram outros... Era o último Carnaval com lança-perfumes. A 18 de agosto de 1961, por coincidência um dia antes de eu completar 19 anos, o símbolo olfativo do Carnaval seria proibido pelo presidente Jânio Quadros. Assim (mantida a grafia do português à época)”:
Decreto nº 51.211, de 18 de agosto de 1961
Proíbe a fabricação, o comércio e o uso do “lança-perfume” no território nacional.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, usando das atribuições que lhe confere o art. 87, item I da Constituição,
CONSIDERANDO que o cloreto de etila, usado na fabricação dos “lança-perfumes”, é substância nociva à saúde;
CONSIDERANDO que se vem generalizando, de maneira alarmante, a prática de aspiração do “lança-perfume” como meio de embriaguez;
CONSIDERANDO, que por êsses motivos as Polícias dos Estados, no sentido da manutenção da ordem pública, vem procurando restringir o uso do “lança-perfume”, baixando instruções proibitivas;
CONSIDERANDO que o Código Penal Brasileiro, no seu artigo 278 proíbe o fabrico e a entrega ao consumo de “coisa ou substância nociva à saúde”;
CONSIDERANDO que ao Estado cumpre zelar pela saúde e bem-estar da população;
CONSIDERANDO, finalmente, que nada justifica a tolerância do Poder Público para com o emprêgo da substância nociva à saúde, como instrumento de folguedo carnavalesco, acessível à generalidade da população,
DECRETA:
Artigo 1º Ficam proibidos a fabricação, o comércio e o uso do “lança-perfume” em todo o território nacional.
Artigo 2º Serão cassadas, pelos órgãos competentes do Poder Público as licenças e patentes anteriormente concedidas para tal indústria.
Artigo 3º As autoridades policiais tomarão providências para que sejam cumpridas as determinações constantes do presente Decreto.
Artigo 4º Êste Decreto entrará em vigor na data da sua publicação, revogadas as disposições em contrário.
Brasília, 18 de agôsto de 1961; 140º da independência e 73º da República.
JÂNIO QUADROS
Oscar Pedroso Horta
Hamilton Prisco Paraíso
Castro Neves
Cattete Pinheiro
Octávio Augusto Dias Carneiro
Diário Oficial da União – Seção 1 – 18/08/1961, página 7.523 (Publicação Original)