O centro de Gramado e Canela ao meio-dia de domingo (17) pouco lembrava que estamos no auge de uma pandemia. Muita gente nas calçadas, restaurantes com várias mesas ocupadas, carros circulando. Só que, diferentemente de outras épocas, a maioria dos turistas era formada por gente que fez bate-volta entre a Região das Hortênsias e a Região Metropolitana de Porto Alegre ou com a Serra. Os hotéis, espinha dorsal do complexo turístico serrano, estão em sua maioria fechados ou com ocupação reduzida. Atrações turísticas também patinam, em meio ao temor coletivo de contaminação provocado pelo coronavírus.
A verdade é que as duas cidades-polo de turismo no Rio Grande do Sul lutam para uma retomada lenta e gradual de atividades. Gramado e Canela estão com bandeira laranja, na escala de risco para coronavírus elaborada pelo governo do Estado. Isso significa que hotéis e restaurantes só podem funcionar com 50% da capacidade de atendimento. Agências de turismo, passeio e excursões - uma das maiores fontes de renda das cidades-gêmeas - só podem trabalhar com 25% dos funcionários. Boates, bares e pubs devem permanecer fechados, para desespero dos comerciantes locais, muito ancorados na vida noturna.
O resultado é que muitos estabelecimentos continuam fechados. Nos arredores do hotel Bella Vista, um dos mais tradicionais e antigos de Gramado, cutias (pequenos roedores) tomaram conta dos gramados e jardins. Animais selvagens, passeiam sem serem importunados. A explicação: o estabelecimento, com 97 apartamentos, está fechado desde março. Dos 55 funcionários, duas dezenas foram dispensados, com perspectiva de reconvocação após a pandemia.
O mesmo acontece com o Galo Vermelho, outro hotel que é um dos cartões-postais de Gramado, com quase uma centena de apartamentos, agora fechados. É compreensível, já que até semanas atrás estava proibida a atividade hoteleira no município - bem como todas que gerassem aglomeração de pessoas.
A rede de hotéis Laghetto, uma das maiores da Região das Hortênsias, reabriu apenas três de seus 10 hotéis. Estavam com 50% da ocupação neste fim de semana, o máximo permitido, o que é promissor, ressalta Rafael Carniel Almeida, secretário de Turismo de Gramado.
- Fizemos uma projeção que apontou 13% de ocupação da rede hoteleira em maio, realmente um desastre para cidades que vivem do turismo. Mas tivemos 50% de lotação neste fim de semana nos maiores hotéis, sinal de que a retomada começa a acontecer. Superou nossa expectativa - comenta Carniel, aliviado.
Os hotéis operam com uma série de restrições. O café da manhã é servido no quarto, não mais em refeitórios coletivos. Áreas de brinquedos, piscinas e salões de jogos estão fechados. É obrigatória a distância de dois metros entre os hóspedes. O elevador só admite hóspedes de um apartamento por vez.
Mesmo com restrições, alguns estabelecimentos estavam cheios de gente. É o caso do Sky, hotel situado próximo ao pórtico, na RS-235. Dos 160 apartamentos, metade estava ocupada no fim de semana - algo não visto desde março.
Nos 350 restaurantes de Gramado vigora a regra do distanciamento entre as mesa e dos 50% de ocupação. Grande parte estava lotada, ao meio-dia de domingo. Contribuem para isso as promoções. Era possível encontrar, tanto em Gramado quanto em Canela, ofertas de almoço com churrasco por até R$ 14,90. Os cafés coloniais e os de fondue, prato tradicional na região, também reduziram em até 50% o preço.
Os turistas têm se mostrado compreensivos e começam a retornar, ressalta Carniel. Ele celebra o fato de que Gramado não registrou mortes pelo coronavírus. Dois procedimentos de segurança podem ter feito a diferença. Um deles é o rastreamento dos clientes no check-in dos hotéis. São feitas cinco perguntas sobre condições de saúde dos possíveis hóspedes. Os que informam sintomas de resfriado ou gripe são encaminhados a atendimento de saúde.
A outra providência é a instalação de barreiras sanitárias móveis nos principais acessos da cidade. Servidores da Secretaria Municipal de Saúde estão no pórtico da RS-235 (quem vem de Nova Petrópolis e Caxias) e na RS-115 (quem vem de Porto Alegre e Vale do Sinos). Eles param veículos de forma aleatória para verificar a temperatura dos ocupantes, com um termômetro eletrônico. E aplicam um questionário - turistas que tiveram sintomas de gripe nos últimos 14 dias são orientados a procurar ajuda médica.
- Examinamos cem veículos desde ontem e nenhum dos ocupantes teve febre registrada pelos nossos termômetros - comemora a enfermeira Vanessa Reinhardt, que atua na barreira sanitária da RS-115.
Um dos carros abordados levava dentro os turistas Genaro Bordini, Maraísa Winter e os filhos deles, Carolina e Theian, que vieram da Capital para passar o dia entre Gramado e Canela. Nenhum deles apresentou febre. Todos estavam de máscara. Bordini elogiou a barreira sanitária.
- Melhor cuidar do que negligenciar. Ontem estive no Mercado Público de Porto Alegre e a aglomeração era grande. Muita gente sem máscara. Me apavorei e subi a Serra - gracejou Bordini.
Os católicos estão contentes. As missas voltaram. A Catedral de Pedra, de Canela, estava com bom número de fieis na manhã deste domingo (17), no primeiro fim de semana com cultos permitidos. Cuidadoso, o padre coletava a hóstia num cálice e a largava na mão dos fieis, sem tocá-los. Antes ele higienizava as mãos com álcool. A água benta está vetada, com cartazes explicando o motivo: risco de coronavírus. Mas as preces coletivas foram retomadas.
A verdade é que a maioria das lojas e hotéis da Região das Hortênsias ainda está fechada ou com poucos clientes. Mas isso é muito melhor do que há dois meses, quando tudo fechou, para reabrir somente semana passada.