O próximo 25 de junho seria inesquecível para a bancária Sílvia Pereira. Ao lado de três amigas, ela comprou muito mais do que uma passagem de avião. Ela adquiriu um sonho: uma viagem para a Grécia. De quebra, a escala em Paris uniria o útil ao agradável, já que o filho dela, Arthur, mora na capital francesa há cerca de seis meses. Silvia não vai mais esquecer mesmo do bilhete aéreo, símbolo de frustração compartilhada por muitos turistas nestes tempos de coronavírus.
As passagens do quarteto, adquiridas com a KLM, foram canceladas há 15 dias. Em contato e acordo com a companhia aérea holandesa, ficou decidido que um tíquete nos mesmos moldes está reservado para o grupo até o final de setembro.
— É um sentimento duplo. Tem uma coisa ruim e uma coisa responsável. Nós seríamos quatro amigas indo visitar amigos que moram na Europa. No primeiro momento, tu fazes todo um planejamento e tu não consegues segui-lo. Quando a gente percebeu que não viajaria, veio o entendimento de que estamos inseridos em um contexto maior — comenta Sílvia. — Todos estamos passando pela mesma coisa. A gente se sente um pouco impotente. E quem sabe não seja um momento de treinar um pouco a nossa tolerância? A viagem vai acontecer quando for o melhor para todo mundo. Vamos acreditar que tudo vai melhorar.
O diálogo com companhias aéreas e agências de viagem é a melhor solução neste momento de crise aeroportuária. De acordo com a advogada Maria Luiza Targa, esta é a solução inicial recomendada para quem tem uma passagem comprada nos próximos meses.
— O primeiro passo é sempre o diálogo. Seja com a companhia, site ou agente de viagem. É preciso ouvir a outra parte e entender que é um momento atípico. Remarcar a viagem é o melhor para as duas partes. O consumidor não perde dinheiro, usufrui a viagem, e a companhia aérea não fica com prejuízo — afirma Maria Luiza.
Em meio à pandemia do coronavírus, foram promulgadas duas medidas provisórias. A MP 925 estabelece que todas as passagens compradas até 31 de dezembro deste ano e canceladas por conta da covid-19 podem ser convertidas em crédito para utilização no prazo de 12 meses a partir da data do voo, sem taxas. Ou seja, a viagem é remarcada entre consumidor e companhia aérea, sem intermediários.
Da mesma forma, a MP 948 diz que o fornecedor de serviços de turismo não está obrigado a reembolsar o consumidor se remarcar a viagem ou se disponibilizar crédito para uso no período de 12 meses a contar da data do encerramento do estado de calamidade pública, ou se realizar outro acordo com o consumidor. Apenas na impossibilidade de tais medidas deverá restituir o valor recebido. Novamente, fica reforçada a necessidade de um diálogo entre as partes para que o interesse de ambos seja considerado.
Impasse e otimismo
Mas e se o comprador não quiser mais viajar? Ou não puder? Ou quiser o dinheiro de volta? Segundo Fernanda Borges, diretora executiva do Procon Municipal de Porto Alegre, é preciso ter uma visão mais ampla de economia antes de solicitar o dinheiro de volta:
— O cliente pode pedir o reembolso, tal qual a medida provisória indica. Neste momento, tudo é novo. É um momento ao qual ninguém tinha vivido. A gente busca a negociação, é uma reação em cadeia. A gente defende o consumidor a longo prazo. As empresas aéreas também não podem quebrar. Temos muitas incertezas com o que pode acontecer. Quem tiver a possibilidade de não pedir o dinheiro de volta e remarcar a passagem, melhor. É muito mais fácil a empresa prestar o serviço em outro momento do que ela devolver o dinheiro. Sempre que possível, é melhor solicitar um crédito.
Rafaela Müller, agente de viagens sócia da Quality Tour, atenta para um saldo positivo: o barateamento das passagens. De acordo com ela, esta é uma boa hora para começar a planejar as próximas férias:
— Esta crise está barateando os preços. Há inúmeras promoções para voar no segundo semestre de 2020. Quem puder fomentar a economia do Brasil, ir para o Nordeste ou até para o Exterior, que vá. A partir de maio ou junho, as coisas vão começar a entrar nos eixos aos poucos. A economia vai girar. O brasileiro adora uma promoção e vai aproveitar muito isso. Alguns destinos estão com descontos de até 50%. A tendência é de que as pessoas viajem muito no segundo semestre.
Orientações
- Procure dialogar com a companhia aérea, hotéis e demais serviços contratados. Todos estão orientados a dar crédito futuro para que a viagem seja realizada.
- Toda tentativa de negociação deve ser registrada no site Consumidor.gov.br. Assim, o turista se protege judicialmente de quaisquer danos futuros.
- Atente à data da remarcação. Se você comprou passagens e hospedagem em baixa temporada, remarque para a mesma época. Senão, as empresas podem — e devem — cobrar pelo preço da temporada correspondente.
- Em caso de pedido de reembolso, preste atenção em taxas e serviços. Por lei, as empresas não são obrigadas a devolver 100% do valor. Além disso, muitos dos pequenos contratantes podem falir com a crise.